30.7.06

O GPS e o caos...

«Les gens ne changent pas. Ce sont les choses qui changent.»Boris Vian, L'écume des Jours
(28 de Julho) Em Madrid, o GPS enlouqueceu ao chegar à Avenida de Portugal… O software não estava preparado para responder às alterações criadas pelas obras naquela avenida, na zona Puente del Rey e nas praças vizinhas. Advinham-se, por ali, obras faraónicas. A E90 (NV) morria numa misteriosa encruzilhada, sem que as autoridades dessem qualquer atenção ao trânsito verdadeiramente caótico. Despreocupadamente, ocupavam-se dos múltiplos acidentes que iam ocorrendo. O GPS, por seu lado, ordenava: faz inversão de marcha, vira à esquerda, encosta à esquerda, sai daqui a 200 metros, na próxima rotunda, sai na 5ª saída… Já na auto-estrada da Corunha, continuava a ordenar: encosta à esquerda, vira à esquerda, contrariando as regras elementares do código da estrada… Se fosse a obedecer ao GPS, a esta hora estaria, no mínimo, preso… Para sair daquele labirinto, já que a E90 desaparecera de vez, ainda, consegui a proeza de entrar num terminal rodoviário subterrâneo, sem que ninguém se sentisse incomodado. Acabei por obedecer ao GPS que, mal entrei no subterrâneo, ordenou: faz inversão de marcha. De facto, não havia outra alternativa… Farto da Avenida de Portugal e de Madrid, rumei a Segóvia, onde já tarde, parei, finalmente, no camping o “Acueducto”. Curiosamente, Segóvia fazia parte dos meus planos de Páscoa. E ainda há quem negue que Deus escreve direito por linhas tortas! Segóvia Património da Humanidade desde Dezembro de 1985. Acueducto-Catedral-Alcazár. E em Segóvia não faltam as igrejas: de San Martin, de Nuestra Señora de l’Asunción y de San Frutos (nome curioso para uma catedral, edificada no século XVI), de San Andrés, de San Esteban, de San Quirce, de La Santísima Trinidad, de San Nicolás, de San Miguel, de la Compaňia de Jesus, de San Sebastián, de San Juán de los Caballeros… e também não faltam os mosteiros e os conventos, para além do imponente e turístico Alcázar e da inevitável Plaza Mayor… E para atenuar um pouco este expressivo e fanático catolicismo, podemos visitar a JUDERÍA, confinada, a partir de 1480, a um bairro a sul da cidade, sobre o Vale del Clamores… Entretanto, na católica Espanha, só os conversos puderam permanecer na cidade após o édito de expulsão, em 1492…

24.7.06

Enquanto ardem as cidades libanesas...

«Quando a invasão ardia na Cidade / E as mulheres gritavam, / Dois jogadores de xadrez jogavam / O seu jogo de xadrezFP/RR (1/6/1916)
Lá longe, enquanto ardem as cidades libanesas, os grandes eleitores, cinicamente, adiam as tréguas na expectativa de que Israel conclua a desvastação que lhes permitirá celebrar a vitória sobre as forças do Mal.
A ignomínia judaico-cristã alastra, obrigando milhões de indefesos a abandonar as casas a que jamais poderão voltar e nós, por aqui, indiferentes, continuamos a armar as nossas pequenas ciladas...
Em 14 dias, nos bastidores, desenhou-se uma nova estratégia e o sentido do voto mudou radicalmente. Os eleitores não fizeram qualquer exigência aos eleitos. E estes também não apresentaram qualquer projecto nem fizeram qualquer promessa.
Terminada a nova eleição, sente-se um alívio generalizado. Como se cada um acabasse de se libertar de um terrível fardo.
O que é que, de verdade, nos move? Será que queremos responder a esta pergunta crucial?
A Escola ainda está a tempo de nos ajudar a responder a estas questões se quiser colocar os olhos na sua única razão de ser: o aluno. Ou, então, mais vale fechar a porta porque os jogadores de xadrez há muito que abdicaram da vida...
E por isso, para aqueles que se possam interrogar sobre o que me move, esclareço que não abdico...

23.7.06

A responsabilidade é francesa...

"Nullum recusare periculum"
O legado romano deixou-nos uma noção de responsabilidade associada ao exercício da autoridade (auctoritas). Se, um dia, o homem peninsular quis(?) limar o seu comportamento teve que pedir auxílio aos franceses ou, melhor, suportar a presença dos franceses que o ensinaram a responder pela terra (a mulher, quase sempre) que ficava a seu cuidado. O vassalo aprende a responsabilidade com o (a) senhor. As cantigas de amor testemunham essa aprendizagem, tal como as cantigas de escárnio e maldizer mostram a dificuldade do homem peninsular assumir a responsabilidade - a dificuldade em responder pelos seus actos. O homem da cantiga de amigo (o amigo peninsular) parte, sem consciência dos seus actos. Sem dar notícia, deixa a saudade nas ondas, no vento que irrompe pelos pinhais e pelas ermidas...
A assunção da responsabilidade exige que a comunidade não se alheie dos problemas e que não ceda ao capricho da manada...

19.7.06

Cabeças desafinadas...

Neste pequeno mundo harmonioso, em que se cruzam vaidades flamejantes e se disfarçam inépcias, uma pergunta salta violenta:
- Mas então os Coordenadores não têm o direito de votar segundo a sua própria cabeça?
Esta pergunta foi dada como resposta a uma outra pergunta ( a melhor defesa é o ataque!):
- Como que é que os membros de cada Departamento irão reagir perante a decisão dos seus Coordenadores de concentrar numa única cabeça os poderes executivo e pedagógico?
( A sereia começa a embalar-nos com o mote: Governar em dita...dura... dita...dura...)
Esta pergunta, para mim, não é uma questão de retórica. A aceitação passiva desta decisão significa que rejeitamos efectivamente qualquer projecto que ouse apelar à participação da comunidade educativa.
"Quando uma pessoa que organiza e orienta um projecto ou actividade de grupo" - o Coordenador - delega essa competência numa cadeira vazia, essa pessoa, se pensasse pela sua cabeça, deixava, também, vazia, a sua cadeira...

17.7.06

Um corrector esdrúxulo...

Uns preferem o discurso esdrúxulo, outros o discurso descarnado.
Quando a um examinando de poucas palavras sai um corrector esdrúxulo, podemos dizer que está tramado. E se à concisão juntar uma letra miudinha, seca, tímida - reveladora de uma personalidade introvertida - então, não tem qualquer hipótese. O corrector esdrúxulo prefere a letra garrafal, alongada, pronta a derramar-se num infinito oceano lírico...
Hoje, tive a oportunidade de observar como trabalha o corrector esdrúxulo: rejeita a letra miniatural, embora sublinhe zelosamente os grafemas maiúsculos que histericamente se elevam sobre a imaginária pauta; rejeita a brevidade da resposta sem cuidar de lhe interpretar o sentido (o conteúdo?); rejeita a fria e simples enumeração dos traços da personagem; rejeita a resposta crítica do examinando que, seguindo o autor, entende que D. João V teria feito melhor em investir o ouro do Brasil na construção da passarola do que na construção do convento de Mafra; rejeita a competência argumentativa e o espírito de síntese porque o examinando ao expor a tese (no 1º parágrafo) não explicitou que a exploração espacial possa ter resultado da incapacidade dos políticos resolverem os problemas da sua terra. No entanto, o examinando desenvolveu a tese, argumentando que o egoísmo, o desejo de protagonismo, nos levam frequentemente a cortar com os nossos semelhantes, em nome de uma singularidade e de uma superioridade discutíveis.
Esta fobia do corrector esdrúxulo valeu ao examinando uma surpreendente classificação final de 7,5 valores, perdendo, pelo menos, 4 valores.
Uma parte do problema reside precisamente na falta de qualidade das provas de avaliação e na forma arbitrária como são classificadas...
Ora, esta questão só pode ser resolvida no âmbito da formação inicial e contínua dos professores...

16.7.06

Problema II

I - "Há que evitar que aqueles alunos que leram os autores indicados pelo Programa de Português possam ter melhores resultados do que aqueles que se limitaram a preencher formulários, a fazer relatórios, a digitar mensagens electrónicas, a desrespeitar os colegas e os professores, a faltar às aulas, a anular a matrícula. E porquê? Porque os primeiros podem ter memorizado os conteúdos sem nada terem compreendido." (Pensamento cavo do presidente da Associação de Professores de Português)
Na perspectiva deste singular teórico do ensino da língua portuguesa, os autores da lusofonia (poetas, romancistas, dramaturgos, ensaístas) são uma maçada que tolhe a inteligência da nossa juventude.
Tal como as nossas escolas merecem um novo modelo de gestão, a APP merece uma direcção orientada para o ensino e para a aprendizagem da língua (sem escamotear a cultura e a literatura lusófonas!), mais preocupada com a formação dos professores...
Não podemos ignorar que o futuro de Portugal passa pelo território da lusofonia. E só conhecendo a alteridade lusófona, poderemos ser aceites como parceiros na construção do futuro.
II - Retomando o Problema I
Quem é que, desde 1974, recusa que as escolas sejam dirigidas por gestores profissionais, enquadrados por um conselho escolar (pedagógico, técnico e administrativo) que trabalhe para que os alunos tenham efectivo sucesso escolar?
Quem é que, em vez de avaliar e corrigir as causas do insucesso educativo, forçou uma revisão curricular posta em causa desde o início? A quem é que serve a actual revisão curricular?
Quem é que dá a mão a Associações espúrias que, em nome de uma globalização paroquial, aposta num conjunto de competências mínimas que impedem que o aluno tenha sucesso escolar e, sobretudo, sucesso na vida?
Quem é que, nos últimos 30 anos, entregou a formação de professores dos ensinos básico e secundário a instituições incapazes de formarem os seus próprios docentes? A formação de professores foi entregue às Escolas Superiores de Educação que rapidamente ocuparam terenos que não eram da sua competência. Foi entregue a departamentos que germinaram nas Universidades, mas que nunca foram avaliados. A formação, nos dois casos, está entregue a professores que desconhecem o terreno que os formandos terão que pisar. Universidades e Institutos privados 'formaram' milhares de professores, sem qualquer enquadramento legal. Muitos dos formadores não eram sequer profissionalizados. Tal como acontece com os mestrados e os doutoramentos em curso, os candidatos a professores eram admitidos desde que pagassem as propinas - o famigerado auto-financiamento do ensino superior tem vindo a gerar prejuízos incalculáveis para as futuras gerações.
III - Algumas soluções
  • Acabar com a separação entre os ministérios da educação e do ensino superior...
  • Criar gabinetes de estudos no interior do ministério da educação.
  • Mudar o modelo de gestão das escolas, reduzindo as estruturas directivas.
  • Alterar o modelo de formação de professores, criando três ciclos de formação: pré-escolar, 1º ciclo e 2ºciclo; 3º ciclo e secundário; ciclo superior.
  • Apetrechar as escolas com os equipamentos necessários ao funcionamento de cada curso.
  • Não abrir cursos em escolas onde faltem recursos humanos e materiais.
  • Acabar com a promiscuidade entre o ministério da educação, as associações de professores, os sindicatos, as editoras de manuais escolares...
  • Acabar com qualquer tipo de acumulação, remunerada ou não.
  • Diferenciar remuneratoriamente em função dos cargos desempenhados.
  • Criar um modelo de avaliação do docente que tenha em conta o seu estado físico e mental, a sua eficácia pedagógica e não a idade.
  • Evitar todas as medidas avulsas...

14.7.06

O problema

No conjunto, os resultados dos exames do secundário não são "nem excepcionais nem muito preocupantes". Glória Ramalho, Presidente do Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE)
Um novo problema deu à costa: uma boa parte dos alunos não consegue concluir o ensino secundário na 1ª fase e muitos daqueles que o conseguiram não obtiveram os 9,5 necessários para aceder ao ensino superior. No entanto, se para a bem-aventurada Glória Ramalho esta situação não é 'muito preocupante", qual é a origem do problema?
Uma das respostas encontra-se no Ministério do Ensino Superior: O que é que as Universidades públicas e privadas, os Politécnicos, as Escolas Superiores de Educação, os Institutos vão fazer no próximo ano? Fecham as portas, engrossando as prateleiras dos supranumerários?
Inaceitável. A coragem escasseia.
Por isso, já abriu a caça às respostas (bruxas). A óbvia seria o professor. Mas teme-se, no contexto actual, que esse argumento esteja fragilizado. Por conseguinte, ensaiam-se novas respostas: a novidade e a extensão dos programas, os erros científicos e pedagógicos dos manuais, as incorrecções das provas de exame, a arbitrariedade (indisposição?) dos correctores, a falta de aplicação dos alunos...
Em muito pouco tempo, criou-se, na comunicação social, um cenário que potencia a ocultação da incompetência dos ministros, dos secretários de estado, dos assessores, dos directores gerais, dos autores dos programas, dos auditores científicos e pedagógicos, do GAVE, de uma horda de avençados... Perante o problema, o que pensaram todas estas luminárias?
A título excepcional (ou talvez não!), os alunos poderão repetir os exames na 2ª fase e candidatar-se ao ensino superior na primeira época. Como aqueles pretensos atletas que se infiltram na corrida, enganando os juízes de prova...
E porquê? Para não perturbar minimamente os maiores responsáveis pelo fracasso do país e que imperturbavelmente circulam dos corredores das academias para os corredores dos ministérios. Bípedes inteligentes, frequentemente, nem precisam de circular. Jazem, um membro na academia, outro no ministério.

13.7.06

Numa nuvem de poalha...

Desde 1998 que me habituei a observar, logo de manhã cedo, um casal de melros, que saltitavam, indiferentes a quem entrava no vetusto edifício desenhado pelo arquitecto Ventura Terra. Não creio que o casal fosse sempre o mesmo, mas estou certo que a atitude, essa, era (e é) a mesma.
Surpreendentemente, surgiu uma outra ave, de bico forte e curvo, nem sempre negra, mas predadora, que começou a reproduzir-se, de forma intensiva, gerando um bando omnívoro que emite estrategicamente sinais de inteligência, planeamento e comunicação...
Já esta semana, uma dessas experimentadas criaturas sofistas, num golpe de mestre, teve a audácia de se assenhorear do labor de alguns pequenos invertebrados que por ali restam.
( Relembro que o cada vez mais desacreditado S. Freud já explicou que 'um golpe' não é mais do que a repetição do 'golpe original'. Por isso, talvez, ainda valha a pena criar uma «área projecto« cuja única meta estratégica será descobrir o primeiro golpista.)
Mas o mais grave é que esta endémica holopatia alastra das galerias, ladeia os pátios norte e sul, na expectativa de destronar, em 2008 , o arquitecto Ventura Terra.
A entronização decorrerá nas caves e, nesse dia, numa nuvem de poalha, estarão presentes todos os ilustríssimos avoengos de bico forte e curvo, já quase todos negros...
Resta-me, porém, a esperança ( historicamente infundada!) de que não havendo mais presas, o bando levante voo, de vez...

11.7.06

O que é ser experiente?

«O incêndio deflagrara à hora do almoço. Eram cerca de 13h30 e os bombeiros tratavam de apagar mato, caruma, giestas. De repente, a direcção do vento alterou-se e a ordem ecoou:"Para trás!"(...) e os chilenos avançaram no sentido inverso, à frente do fogo."Ouve-se dizer que estes sapadores têm muita experiência", por isso o Sérgio foi com elesPúblico, 11.07.2006
Há séculos que alimentamos a ideia de que o que é estrangeiro é bom, é experimentado. Ou, pelo contrário, ressabiados e xenófobos, condenamos liminarmente tudo o que vem de fora ou vive lá fora. Talvez não valha a pena dar exemplos, mas basta pensar na carga de ambiguidade da palavra estrangeirado para perceber como somos capazes de idolatria ou de persecução de tudo o que não é genuinamente português. Agora, estamos numa fase de alguma idolatração do que é estrangeiro, de quem vive e trabalha lá fora. Veja-se o caso do Scolari, dos jogadores da selecção ou mesmo dos emigrantes - que não dos imigrantes! Defendemos modelos estrangeiros: da Irlanda à Finlândia, resignando-nos, mesmo, à cada vez maior presença espanhola em solo lusitano.
E os sapadores chilenos não escapam a esta presunção de experiência. Há vários anos que a comunicação social dá testemunho da sua presença sem a questionar. Sempre em nome da competência que essa, sim, faltará aos nossos bombeiros voluntários, amadores... No entanto, não é a primeira vez que experimentados (?) bombeiros chilenos morrem nas nossas matas porque não obedecem à ordem de arrepiar caminho.
Quando ignorarmos as coordenadas do terreno que pisamos, não há experiência que nos valha! O chefe dos bombeiros locais que deu a ordem "Para trás!" é bem mais experimentado que qualquer encartado (diplomado) noutras longínquas paragens.
E este fascínio pelo desajustamento, pelo esquartejar do saber acumulado ao longo de muitas gerações, alastra pelo país como o incêndio de Famalicão da Serra.

9.7.06

Tudo isto cheira a naftalina...

Felizmente, chegou ao fim um daqueles torneios em que os artistas estavam proibidos de actuar.
Mais importante do que atacar era defender, já que a sorte parece favorecer, não os audazes, mas os medíocres. Os treinadores e os árbitros, condicionados pelos jogos de bastidores, tudo fizeram corresponder aos superiores interesses do marketing: num ápice valorizaram e desvalorizaram jogadores, selecções, países... Valeria a pena saber quantos jogadores ficaram com a carreira amordaçada!? Não o iremos saber, a não ser que, um dia, um Zidane, um Figo, um Raúl decidam contar tudo o que sabem.
Quanto a Portugal, seria interessante que aqueles técnicos que melhor conhecem os jovens jogadores portugueses, pudessem formar uma nova selecção, liberta do espírito patrioteiro, corporativo e beato que ultimamente nos invadiu. Um país que se diz membro da União Europeia não pode comportar-se como se ainda vivesse em pleno Estado Novo, com colónias e tudo... O tempo dos sargentos, sem desprimor para os verdadeiros, chegou ao fim. Caso contrário, ainda voltaremos ao tempo dos famigerados condottieri ou, numa versão mais provinciana, ao tempo dos «padrinhos».
(Tristes vão os dias, de Timor ao Jamor!)
Tudo isto cheira a naftalina, desde o D. Afonso Henriques retido no túmulo às praias da Caparica cerceadas por paredões inúteis, passando pelo estádio do Jamor - panteão de vaidades oficiais, oficiosas e gratuitas.
E já agora, quem é que acredita que a ministra da cultura não soubesse que estava a ser preparada a abertura do túmulo do rei-fundador? Desculpa esfarrapada, que, caso fosse verdade, merecia, pelo menos, o despedimento de meia dúzia de assessores.
( Tanto riqueza esbanjada, num país tão pobre, dói... Quantos portugueses ficaram mais pobres neste último mês? Quantas famílias ficaram sem poder honrar os seus compromissos? E ainda vamos de férias!?)

7.7.06

Entre a pura actividade e a passividade pura...

«Esse est percipere et percipi.» Tese de Berkeley - Ser é perceber e ser percebido.
Separado de um pequeno grupo de caminheiros, entrara nos acessos às arribas da Praia Grande (Sintra), quando dei de caras com dois automóveis parados no meio de uma vereda. Ao de leve, coloquei a mão na bagageira do velho Renault 5 vermelho que, de imediato, galopou vertiginosamente sobre as fragas até se despenhar, na vertical, sobre o areal, junto à orla marítima. Surpreso e petrificado no ponto de partida daquele galope esfuziante e horrível, fixei a vista naquele ponte bem distante da praia e, num ápice, um corpo, semi-nu, masculino, elevou-se à altura do penhasco que separa as águas da terra, para voltar a cair, redondo, sobre o areal. Outros corpos, semi-nús, cercam-no e eu desperto, aturdido.
Agora, que pareço acordado, continuo sem saber o que fazia naquela hora indistinta na Praia Grande, quem eram aqueles andarilhos que me acompanhavam e de que perdi o rasto, qual era a marca e a cor do veículo que continuou imobilizado, que força accionou o velho Renault 5 vermelho e, sobretudo, se houve uma vítima e quem ela era, de facto.

4.7.06

Os predadores...

« Quando se fizer a lei da responsabilidade ministerial, para as calendas gregas...» Almeida Garrett, Viagens na minha Terra, 1843
Depois dos ministros Ferreira do Amaral e João Cravinho terem coberto o país de auto-estradas, passou a ser tão fácil percorrer o país de lés a lés que alguém, inefável, concluiu que não era mais necessário fazer a lei da responsabilidade ministerial.
E não fosse algum pateta das luminárias levar as cépticas palavras de Garrett a rigor, determinou-se que jamais se enfadasse a nossa juventude com algum capítulo daquele folhetim que dá por nome Viagens na minha Terra.
(Apesar de tudo, estou convencido que mais dia menos dia, a TVI acabará por instalar os estúdios lá para os lados da Ribeira de Santarém, bem pertinho da esquecida Santa Iria, presenteando-nos como uma bucólica Joaninha da Real Companhia das Lezírias! É apenas uma questão de tempo: o tempo necessário a que a Joaninha Moura Guedes aprenda a montar.)
Quando o Estado é laxista, a questão da responsabilidade ministerial é fulcral. Como é que se pode alterar este estado de coisas, se os ministros não são solidários com os ministros anteriores? Qualquer novo ministro alija a sua responsabilidade para cima do ministro anterior, revogando-lhe as leis que, na maioria dos casos, não chegaram a ser regulamentadas; e mais recentemente, criou-se o hábito de montar nos mass media um circo, onde os trabalhadores, em geral, e os funcionários do estado, em particular, não passam duns velhacos doentes e preguiçosos que só aspiram a opíparas reformas, exaurindo a burra do estado.
Já que a solidariedade ministerial não existe, poderia, pelo menos, fazer-se justiça: Por exemplo, julgar e prender todos aqueles ministros, secretários de estado, chefes de gabinete, assessores... que deixaram os sindicatos impor-lhes um estatuto (de igualdade remuneratória) da carreira docente, que deixaram os directores dos centros de formação distribuir verbas incalculáveis por formadores gananciosos que foram acreditando milhares de professores sem, de facto, os avaliar, que aceitaram (e defenderam hipocritamente) o modelo de gestão democrática. Este laxismo ministerial é que gerou os predadores que continuam à solta...
E é para não incomodar os predadores, que já começaram a recolocar-se à mesa do orçamento, que todos os dias o circo ministerial faz cair em descrédito os palhaços de 2006...

3.7.06

Casos na primeira pessoa...

(Casos na primeira pessoa)
Senhor Provedor da Portugal Telecom A minha filha que se encontra na Hungria, em 22 de Junho deixou de poder aceder à sua caixa de correio. Este impedimento criou-lhe uma situação muito desagradável, pois perdeu vários contactos universitários, importantes para a prossecução dos seus estudos na Europa Central.Tal como reservas de avião e de hotel... Entretanto, apesar da minha reclamação diária por telefone 707 22 72 76 e por e-mail (suporte@acesso.sapo.pt), sou simpaticamente convidado a ter paciência porque «estamos a efectuar todos os esforços para que a situação reportada com a identificação 2006-260468 seja resolvida o mais breve possível.» Por outro lado, na página do cliente, obtenho a seguinte inamovível informação: Nº SGS Tema Estado Data de Registo 2006-260468 Problemas técnicos Caixas de Correio Aberto 2006/06/22 Não sei se devo continuar a ter paciência, pois já em Dezembro de 2005 tive idêntico problema com a Netcabo, que nunca foi capaz ou quis resolvê-lo. Foram meses de respostas evasivas até que mandei desligar a netcabo. E nunca a Netcabo assumiu oficialmente qualquer responsabilidade. Como pode deduzir, troquei a Netcabo pela Sapo e, afinal, tudo parece funcionar do mesmo modo. A estrutura técnica parece não estar à altura de resolver as anomalias e, sobretudo, jamais esclarece o cliente sobre a sua incapacidade, para que este possa seguir o seu caminho... O que mais lastimo é a falta de transparência na relação com o cliente. Caso o entenda, gostaria que avaliasse esta espécie de disfuncionamento, pois, imagino que muitos outros clientes serão vítimas deste tipo de arbitrariedade que, penso, inaceitável numa sociedade que aposta cada vez mais nas novas tecnologias de informação.
Pelo menos é esse o desafio do engenheiro Sócrates, a quem peço, daqui, desculpa por o ter tratado, há uns dias, por "mestre", qualificativo desprezível nos tempos que correm... Embora, nesta questão, me sinta um pouco confuso, pois tenho visto engenheiros que o não são, e outros que, apesar do engenho lhes falta a arte. Porém, para me acalmar, o demónio de Sócrates ( o da cicuta!), murmura-me ao ouvido: - Impossível. Abandona esses teus lampejos.
Senhor Provedor do Instituto de Seguros de Portugal,
Senhor Ministro da Administração Interna,
Senhor Ministro da Justiça,
Se a lei me permite pagar o seguro de um veículo automóvel até 30 de Junho e o faço nessa data, através do multibanco, por que motivo a autoridade policial me pode autuar logo no dia 1 de Julho, pois me falta a correspondente carta verde?
E por que motivo, a Império Bonança (e as restantes companhias...) não envia previamente a carta verde a cada um dos seus clientes? Se não confia em mim, não me deveria aceitar como cliente!
Para que a voracidade da autoridade não desabe sobre mim, desloco-me à sede da Companhia a pedir a desditosa carta verde e por lá fico sessenta gloriosos minutos à espera...felizmente, na companhia de outros clientes mal-humorados. Vá lá saber-se porquê? (Durante todo aquele tempo pude contemplar uma senha branca que apenas registava: C63; o meu vizinho do lado, esse por lá ficou com uma senha verde em riste...)

Como, entretanto, me lembrei que o actual Ministro da Administração Interna e que já foi Ministro da Justiça, em tempos remotos - logo a seguir ao 25 de Abril - terá sido meu aluno ( ou será imaginação minha ou, talvez, do Passos Manuel?) dei comigo a pensar que eu sou o único responsável por esta forma de tratar os constituintes, os eleitores, os utentes, os clientes, os pacientes, os fregueses...

E por isso quero crer que a solução para o déficit está em colocar a CARUMA no quadro dos supranumerários. Um quadro virtual, já se vê, um pouco como o purgatório, essa instituição medieval, criada para que uns tantos virtuosos pudessem acumular capitais sem se verem condenados às penas infernais.

(A estas horas, a culpa judaico-cristã costuma atacar-me de forma violenta e por isso me sinto responsável por toda a impunidade que cresce sob as minhas agulhas nocturnas...)

EE E por isso, quero crer que se a CARUMA fosse colocada no quadro dos supranumerários o problema do déficit ficaria resolvido

1.7.06

Quem não embandeira não petisca...

Ultimamente, as aparas vêm-se avolumando: as boas classificações seja dos exames de Português seja da selecção nacional de futebol escondem os habilidosos que manipulam o sucesso e o nacionalismo serôdio. Bebe-se e grita-se numa linguagem reles contra adversários que deveriam merecer o nosso respeito.
Num tempo em que os habilidosos da política ameaçam correr à pedrada quem lhes contrarie os interesses, e em que outros mecenas autárquicos compram o silêncio dos subsidiados, a encenação da saída do ministro dos negócios estrangeiros, precisamente no momento em que o chauvinismo dos portugueses vive do futebol, é aplaudida como uma jogada de mestre Sócrates.
Cada vez mais a esperteza dos ardilosos, também chamada dos guerreiros, se afirma impunemente como um traço fundamental da cultura portuguesa.
Na escola, no futebol, na política, o truque compensa.
E o que mais arrepia é ver como a juventude tumultuosa está a ser educada no ardil e na baixeza.
( Este comentário agreste não visa retirar mérito a todos aqueles que na respectiva actividade dão sempre o seu melhor sem necessitar de embandeirar. Hoje, mais do nunca, quem não embandeira não petisca!)