31.3.14

Peões de brega

 Uma pessoa sensata!  Parece ser um elogio... No intervalo uma linha preenchida por pontos anónimos

Escrever sobre pontos e linhas pode não fazer sentido, mas tem uma vantagem, não desassossega a não ser quem se sente desfasado, forma passiva de uma ação cujo sujeito mais vale ignorar...
A alternativa é colocar os pontos nos is... Para quê?
(...)
Desfazer o enigma? Suspensos os dedos, os pensamentos saltitam: um vulto atrás de um ecrã, imagem estática, quotidiana, medeia interesses; outros vultos, todos atrás de ecrãs, recebem ordens escondidas; ainda outro vulto delira com a vitória programada; há mesmo um vulto diante do ecrã  que finge que os 7% da extrema-direita francesa podem ser anulados por uma baixa de impostos...
(...)
O problema é que todos estes vultos, peões de brega, estão ao serviço da mediocridade de que se valem os Senhores para governarem o mundo a seu belo prazer. 

30.3.14

Do outro lado da linha

Em algumas horas, a linha pode virar ponto e ao pensar-se que finalmente a ânsia foi esbatida, eis quando do outro lado da linha nos dizem que o ponto se transformou em fila (bicha voraz) porque parte da bagagem ficou retida num tapete rolante para lá da distância esbatida... e não ficou sozinha, de tal modo que múltiplos pontos se veem no labirinto burocrático...
No caso, nem as asas de Dédalo nem as esferas de âmbar de Bartolomeu se mostram capazes de trazer de volta as malas, por ora, turcas...
Lá as eleições municipais deram cabo do zelo reparador - os turcos preferem o confronto direto mesmo que isso lhes traga a morte, porque para Erdogan a «questão é de vida ou de morte»...
Cá o faz-de-conta burocrático obriga o viajante a fazer morosa prova dos objetos retidos... Talvez venham no próximo voo e sabe-se lá em que estado! 
Entretanto, o zeloso funcionário, desconfiado, vai exigindo a chave de cada cadeado...

29.3.14

Tenho uma linha!

Se começar a ligar os pontos, tenho uma linha. Uma linha com tantos pontos que os não consigo abranger. Alguém se lembrou de a medir, não em pontos, mas em quilómetros, e para me tranquilizar (ou assustar?), dizem-me que são mais de 4.500 km...
De facto, eu não passo de um ponto (ou de conjunto de pontos) e ninguém se propõe medir-me em quilómetros. No meu caso, a medida é em centímetros! Mais do que uma linha, vejo-me como um novelo debruçado ora para dentro ora para fora. 
Hoje é um daqueles dias em que muda a hora, em que os pontos parecem reduzir-se tornando a linha mais tensa, mas a qual, de verdade, não deixa de ter mais de 4.500 km...
Em rigor, quero acreditar que, à medida que as horas passam, a linha vai encurtando, os pontos vão diminuindo...
Tenho uma linha! Mas como, se não passo de um ponto?

(Entretanto, a linha invisível está a aproximar-se: o espaço diminui à medida que o tempo avança. Quem diria que o tempo pode avançar ou recuar? A noite desalinhada foi dizendo que o tempo é um malfeitor, pois até os telemóveis necessitam de ser reiniciados sempre que a hora muda... e se não o soubermos, a ansiedade cresce mesmo que a extensão diminua...)

28.3.14

A batata, a erva daninha e os bastardos

A diferença entre esta batata e o governo é que ela faz pela vida. Deem-lhe um pouco de água e de sol, e enraíza, ganha folha e flor. Torna-se produtiva e bela. E não precisa de muito tempo para assegurar a mudança…
Também se pode pensar que o governo enraíza, mas trata-se de um erro. O governo é a erva daninha que há muito dizima o batatal. O governo é improdutivo, gasta o tempo a cortar. Não precisa nem de água nem de sol, basta-lhe uma foice ou uma gadanha para limpar a seara…
E zelosamente, vamos sendo ceifados pelo governo e pela parte bastarda de nós…

27.3.14

As redes sociais

http://www.dailymotion.com/video/x1ip4e5_turquie-erdogan-execute-ses-menaces-et-bloque-twitter_news

As redes sociais incomodam o poder instalado. E como tal transformaram-se  no alvo incontornável dos poderosos... A médio prazo, qualquer rede social acaba controlada ou silenciada pelos inimigos da transparência...
O exemplo mais recente, provavelmente mais grave, é turco. Portugal, por seu turno, já encontrou o pretexto para exercitar uma velha competência - indexar, censurar. O nosso ministro da educação consegue ir mais longe do que ERDOGAN: começou por limitar o acesso ao facebook... A Turquia  só o fará com a mudança de hora...

26.3.14

Vida que passa


(...) Insisto que, n' Os Maias, o discurso vale mais do que a história, que a leitura pausada e repetida de uma página pode criar uma relação de cumplicidade inesquecível com o autor, pode ensinar a equacionar a realidade de ângulos surpreendentes, pode abrir as portas para um inevitável e retrógrado choque de culturas, para a expressão da incapacidade de resolução de um problema vivido interiormente, sobrando apenas o riso amargo e vencido da ironia pessoal e coletiva... Para atrás vão ficando os adjetivos, os advérbios, os polissíndetos, os assíndetos, as metonímias preguiçosas, as hipálages audaciosas, os paradoxos e os oxímoros, a lógica e a retórica, os tropos e as figuras, os retratos e as caricaturas, as descrições,  as cores, rosadas, rubras e cerúleas, ... e, por força, as personagens, o tempo que que avança e recua e o espaço que se contrai e se expande em avenidas, corpos e fantasias... as nódoas de sangue... 
( E a espaços uma voz se levanta: - É necessário ler o romance? E qual é a Gramática?)

Sem resposta, desço pela Conde Redondo, as ruas esventradas, não sei se o gás se a eletricidade? Procuro uma loja de acessórios, fechada? Definitivamente. Mais abaixo, uma informação: - Procure rua António Pedro (o ator)... Agora subo, entro na dita rua, também ela esventrada - desapareceram uns tantos números. Desço e volto a subir, estou quase no Chile - uma Churrascaria pegou fogo! Os mirones do costume, um cerco de bombeiros e polícias, o trânsito desviado e deixado à sorte do fluxo... e eu entro, finalmente, na loja de acessórios que não tem terminal de multibanco e passa recibo em euros e escudos. Saio satisfeito porque o stock não estava esgotado como na farmácia. Regresso à Pascoal de Melo, caminho sem pensar na traição da classe aristocrática, quando, de súbito, uma placa chama a minha atenção: Fernando Pessoa morou ali no 3º direito durante uns meses em 1914. Uns meses! Quais? Que importa? Sigo caminho, passo ao lado do Neptuno sem lhe prestar atenção, já com a mira no novo edifício Pessoa. E claro, Pessoa também morou ali na Almirante Barroso, 12, por cima da Leitaria Alentejana. Dormia de empréstimo e favor do venerável e iletrado Sr. Sengo... e quem quiser saber mais e ficar desorientado faço favor de revisitar o Sr. João Gaspar Simões, sobretudo o capítulo VIDA QUE PASSA, título de uma Crónica que Fernando Pessoa foi escrevendo até um que a associação de classe dos chauffeurs da capital lhe acabou com a carreira de jornalista... 

E há só um caminho para a vida, que é a vida... Álvaro de Campos

25.3.14

Pessoa parou no Espírito...

Perante o problema da opção sexual de Fernando Pessoa, custa-me que haja um problema por resolver, sobretudo, nos dias que correm... Nem creio que essa opção pudesse ser feita. Primeiro: faltou-lhe a amizade de Mário Sá-Carneiro. Segundo:  Pessoa parou no Espírito.

De qualquer modo, questionado, decidi consultar "Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação" e a páginas 27 e 28 encontro a reposta: 
a) «Não encontro dificuldade em definir-me: sou um temperamento feminino com uma inteligência masculina
b) «A minha sensibilidade e os movimentos que dela procedem (...) são de mulher. As minhas faculdades de relação - a inteligência, e a vontade, que é a inteligência do impulso - são de homem
c) « Reconheço sem ilusão a natureza do fenómeno. É uma inversão sexual frustre. Pára no espírito.»
d) « Sempre me inquietou (...) que essa disposição de temperamento não pudesse um dia descer-me ao corpo.»
e) « Não digo que praticasse a sexualidade correspondente a esse impulso; mas bastava o desejo para me humilhar.» 

Quando o saldo negativo é positivo

A execução Orçamental de fevereiro apresenta um saldo negativo de 30 milhões de euros, de acordo com os critérios da troika. O ministério das Finanças destaca que é uma melhoria de 150 milhões de euros, em comparação com o mesmo período do ano passado.


Os portugueses estão mais pobres! O saldo da execução orçamental de fevereiro é negativo! O governo vê algum problema? Não.  Menos + menos = mais


Até 25 de maio, vai ser sempre assim: o sol brilha, a areia regressa, o mar recolhe, a troika vai a banhos para a Ucrânia, a merckl fia audis para que um ou dois portugueses possam ficar mais endividados, as palavras de apoio abundarão...
                            

24.3.14

Imaginar, hoje

«Imaginar é ausentar-se, é lançar-se numa nova vida.» Gaston Bachelard, O Ar e os Sonhos

Muitos dos meus alunos entendem que "imaginar" é sair de si, evadir-se da prisão em que se encontram: casa, sala de aula, trabalho... Enamorados de si ou siderados por um outro passam instantes fantásticos, longe dos problemas. No sonho, no cinema, na praia, nos mares do sul ou, simplesmente, navegam na net ao encontro de imagens de vitórias e de ecos. Fumam a vida!
Outros compreendem que "imaginar" não pressupõe que se abandone o corpo, o lar, a sala de aula, o trabalho... apenas sentem que imaginar é  equacionar o problema e não descansar até que os sonhos, as tentativas, os erros se materializem em novas ferramentas...
A diferença está em que os primeiros se ausentam de si, se tornam improdutivos, ociosos, enquanto que os segundos se esquecem de si para gerarem vida...



23.3.14

A chave de Saramago

Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!
(Alberto Caeiro, Há metafísica bastante em não pensar em nada...)                   http://arquivopessoa.net/


O diálogo com Deus é questão antiga. Não vou reacendê-la, porque não estou em condições para o ver entrar pela janela, pelo menos enquanto ela não for de alumínio lacado...
E bem sei que Saramago nunca deixou de acertar contas com esse Deus tirano que permitiu que por muito tempo ele crescesse longe da abundância e da igualdade.
Compreendo, assim, que Saramago preferisse a simplicidade de Caeiro para quem a vírgula era sinal suficiente para apreender a realidade, desfazendo toda a metafísica de quem não sabe caminhar por si, de quem não sabe sentir por si...

E de repente tudo começa a fazer sentido quando a M.N.L. resolve enviar-me um mail a explicar-me que, tendo colaborado e estado presente no lançamento do livro "A Sala de Aula", de Maria Filomena Mónica, sentia necessidade de agradecer-me por desafiar os alunos a pensarem por si e não a reproduzirem saberes inócuos...
Esta simpática aluna tem toda a razão! Durante 40 anos foi esse o meu desafio. E também era o de Pessoa / Caeiro e de Saramago... e já agora de Camões!
Não por limite de idade, mas porque o Ministério da Educação reduziu o pensamento a um sistema binário no qual não há lugar para a dúvida... nem para a surpresa da vírgula, informo que brevemente abandonarei o ensino.



22.3.14

O passado de pouco nos serve

O passado de pouco nos serve, apesar de haver quem nos queira infernizar os dias com histórias mal ordenadas. Também há aqueles que tudo fazem para colocar uma pedra sobre atos que condicionam as nossas vidas. 
Por omissão ou por saturação tudo se torna passado e deste modo o presente desfaz-se em euforia para os que servem o poder e em disforia para os que não conseguem fugir ao seu raio de ação.
A transição entre passado e presente deixou de ser objetivo da educação e como tal os sistemas educativos já não fazem sentido...
Ainda há quem viva dessa mediação, mas será por pouco tempo. E quem o não compreender, não sobreviverá.

O passado não é exemplo, porque deixámos de ter rumo. À deriva, nos desencontramos...



21.3.14

Falta-nos a cólera do filho de Peleu

Canta-nos, deusa, a cólera de Aquiles,
o filho de Peleu;
a cólera fatal que tantos males
provocou aos Aqueus;
a cólera que tantas nobres almas
nos infernos prendeu
e que de tantos corpos fez pasto
para as aves do céu.
Pois deste modo é que se ia cumprindo
o desígnio de Zeus.
Homero, Ilíada, Canto I (trad. David Mourão-Ferreira)

Falta-nos a cólera
Falta-nos a cólera que desfaça a desfaçatez dos tiranos
Falta-nos a cólera que dilua a untuosidade dos interesses
Falta-nos a cólera que combata a indiferença dos amorosos
Falta-nos a cólera de Aquiles

Tudo porque Zeus deixou de ter qualquer desígnio...
Nem no dia da Poesia a Deusa pode cantar o filho de Peleu...
E as aves do céu bem podem esperar!

Se a poesia queremos celebrar
Que a cólera não nos falte
A cólera...

20.3.14

A Primavera que o não é

A Primavera nem é prima nem é vera!
Não é vera porque tudo soa a embuste e não é prima porque já vem gasta...
Até parece que os sinais de vida só agora começam a piscar... um pouco como se no resto do ano estivéssemos de luto.

Pássaros tontos, andamos por aqui às voltas, à espreita da semente podre até que o passarinheiro nos capture.

19.3.14

Com a idade aprendemos...

Com a idade aprendemos que há comportamentos que não mudam mesmo que as certezas diminuam. Isso acontece geralmente com os falsos rebeldes que, na verdade, tudo fazem para esconder as fraquezas que os atormentam...
Num país de gente fraca, quem comanda é a fanfarra e a fanfarronice torna-se genuína. Irresistível!

No entanto, no mesmo país, ainda há gente aprumada, que merece a nossa consideração, sobretudo quando, pelo trabalho e pela inteligência, se supera e nos surpreende...

Com a idade aprendemos a tolerar os primeiros e a incentivar os segundos. Convém é que o façamos com elegância!

18.3.14

Três notas sombrias

I - Sempre  gostei da convicção e do sentido de humor de Medeiros Ferreira (1942-2014). 
Homem sólido na argumentação, profundo conhecedor do passado que lhe servia de trave-mestra para projectar o futuro, habituei-me a escutá-lo com atenção...
Incómodo para muitos, sem voltar a cara à luta, viu-se preterido por jovens turcos sedentos de poder. E por isso o país perdeu ao não aproveitar plenamente o seu conhecimento, a sua inteligência, a sua visão...

II - E a propósito de outros jovens, não posso deixar de anotar quão desagradável é lidar com juvenis certos de que já são adultos, que a toda a hora gritam a sua mediocridade, apesar de convencidos que já encontraram a chave do mundo...
          um mundo pequenino, todo feito de grunhidos, empandeirado, tolo.

III - À porta fechada, Passos e Seguro negociaram, convencidos da «insanável divergência». Em política, não pode haver lugar para discordâncias irremediáveis. E se tal acontece é porque a classe política não passa de um bando de jovens turcos, de juvenis convencidos!

17.3.14

A descrição


De fora ou de dentro, recanto. Outrora, portão de acesso ao Jardim botânico. Fechado a cadeado ferrugento, ninguém ali atravessa…
De fora ou de dentro, recanto envelhecido, abandonado, por vezes latrina. Descrevê-lo é percorrer o tempo, mas quem quer fazê-lo?
Hoje, procurei explicar que a descrição não é apenas criação de espaço; a descrição dá conta do tempo, narra um tempo de que as personagens se afastaram. Na pena de escritores como Eça ou Saramago, a descrição é personagem que, se incompreendida, vira recanto…
O sonho do escritor só se afirma pela descrição criativa, mesmo que sob a forma da analogia. E por isso também procurei explicar a analogia, pois navegar no espaço (ou na net) pressupõe a derrota das naus…
E quando o objeto da descrição parece tristonho, frio e severo, o escritor lança mão da ironia…
Como o esforço de nada serve,  a personagem sai,  fica somente a cena…

16.3.14

Pensei acampar ali



As árvores continuam de pé. O borboletário só abre a 21 de março.

Os periquitos-de-colar ausentaram-se sem aviso prévio. No entanto, depois de olhar a copa das árvores, percebi o motivo da ausência: faltam as sementes e as bagas…

Há neste jardim uma particularidade intrigante. À exceção de três ou quatro espécies comuns, as aves não abundam. Parece que os jardins universitários perderam o pio!

Ainda assim, sempre é possível observar uma escultura vegetal em fim de ciclo e uma instalação cubista sem qualquer explicação. Cansado como ando, pensei em acampar ali…

Claro que outros olhos, mais deslumbrados, terão dado conta das hierofanias, terão ligado terra e céu, terão mergulhado no sagrado! Só que esse deslumbramento vai morrendo na velha árvore que, na melhor das hipóteses, alimenta os vermes da terra…

/MCG

15.3.14

O rei coelho descontextualizado

«... os coelhos são sempre os mais espertos, nas histórias. O coelho leva sempre a melhor ao leão, ao javali, ao elefante, ao leopardo e a todos os animais da selva. E porque é o mais forte, é ele o rei.» Teolinda Gersão, A Árvore das Palavras, 1997.

Embora não conheça pessoalmente Teolinda Gersão, prometi-lhe que iria ler o seu romance "A Árvore das Palavras". Como detesto incumprimentos, comecei hoje a leitura desta obra cuja ação decorre em Moçambique.
O desenho da narração, apesar do tom lírico, não foge por enquanto à tradicional dicotomia branco vs negro e o ponto de vista do narrador favorece a alma negra...
Só que repentinamente a leitura suspende-se, descontextualiza-se e lembra-me um outro coelho, que outrora viveu em Angola... 
E não posso deixar de cismar quão perniciosas podem ser as histórias de animais contadas a certas crianças!

14.3.14

Procuro a palavra...

Procuro a palavra que melhor dê conta do meu estado.
Gero uma lista em que não faltam cansaço, frustração, desilusão, humilhação, roubo, engano... mas nenhuma delas exprime a totalidade do meu estado... Basta-me dar dois passos e, de imediato, sinto o peso do corpo. Um peso insuportável, asfixiante! 
Se paro, logo uma nuvem negra rompe sobre o lado esquerdo e fica a pairar, ameaçadora... Poder-se-ia pensar que o repouso seria capaz de afastar o agouro, mas não. De todas as palavras enunciadas, há as que são externas - frustraçãodesilusãohumilhaçãorouboengano. Todos conhecemos os agentes e a impunidade em que vivem. Todos sabemos os nomes dos que nos oprimem!
Há, todavia, uma palavra que é visceral - o cansaço - e que, no meu caso, se manifesta em peso, nuvem fechada...

(Por um instante, penso que, também, eu parti no avião malaio e que o meu peso foi suficiente para o abismar.) 

13.3.14

O Presidente veta, o Governo ignora o veto

O Governo manteve a taxa de descontos dos funcionários públicos, pensionistas, militares e polícias nos 3,5%, apesar do veto de Cavaco Silva. Perante as dúvidas do Presidente da República, o Executivo decidiu enviar o diploma para o Parlamento. Económico, 13.03.2014

O Presidente despede os consultores e torna-se o bobo da festa. No dia seguinte, para salvar a face, o Presidente veta o aumento de 1% para a ADSE. Entretanto, o Governo ignora-o.

Uma história de proveito e exemplo: Mau exemplo e muito proveito! Uma história de compromisso e de chantagem!
Se assim não fosse, o Governo não se atreveria a desrespeitar o Presidente... 

12.3.14

O melro na sala de professores

Ainda pensei que fosse um corvo! Mas não, era um melro que, percorrida a galeria, entrou inconscientemente na sala à procura de migalhas.

Convencido de que ninguém o iria perturbar, percorreu o espaço e voltou a sair… e eu fui ficando a pensar em todos os que, conscientemente, transgridem os limites…

11.3.14

No limite

Se não se quer chegar ao limite há que ser rigoroso nas opções, mas nem sempre é fácil, pois os sinais podem ser mal interpretados ou mesmos descartados. E tal acontece quando o perito se limita a analisar o seu território, deixando à sorte a determinação de considerar o que fica de fora do campo de atuação do especialista.
Perante um motor afinado, o perito declarará que se aquele não funcionar bem, a responsabilidade será das válvulas ou da qualidade do combustível e, entretanto, segue o seu caminho...

Hoje, ao subir a Duque de Loulé, compreendi que o melhor é desconfiar dos peritos, pois a lentidão do motor mostrou-me que as palavras sábias que acabara de ouvir não tinham qualquer pertinência. A subida revelava-se necessária e dolorosa e só eu sabia porquê, só eu sei que opções terei que fazer...até porque a lentidão também se faz sentir em plano inclinado...

Indiferentes às minhas sensações e às minhas cogitações, centenas de convidados e de mirones esperavam pela inauguração das novas instalações da Polícia Judiciária que, oficialmente, custaram 87 milhões de euros!
Num esforço derradeiro, acelerei e, mais uma vez, entrei no velhinho e esquecido Liceu Camões...

10.3.14

Uma geração que se vai perdendo…


(Ontem, no Museu do Teatro e no Jardim do Museu do Traje; hoje, na Biblioteca da ES Camões.)
No âmbito da Semana das Profissões, um dos oradores (investigador no IST) esclarece que, na cidade de Lisboa, a água utilizada tem, na quase totalidade, origem na Barragem de Castelo de Bode, ignorando as águas subterrâneas, à exceção de dois ou três lugares, em que elas são aproveitadas para regar o parque florestal como acontece nos jardins dos Museus do Traje e do Teatro.
A  cidade de Lisboa, tal como outros lugares, desperdiça as águas subterrâneas e onera os munícipes que são obrigados a pagar muito mais caro pela água à EPAL.
O problema está na atitude dos decisores, mas esta forma-se na família e na escola. Basta ver o comportamento de muitos dos jovens que, hoje, na Biblioteca,  passaram o tempo a brincar uns com os outros ou a dormitar ou fazendo tábua rasa da experiência dos oradores pois que, no seu juvenil entendimento, o que era dito não passava de história acabada, o mundo mudara, e o que eles queriam saber era quais são os cursos que dão emprego e dinheiro… e já agora quais são os países que concedem bolsas…
Quanto ao esforço, quanto ao trabalho… Uma geração que se vai perdendo antes de tempo!

9.3.14

O Museu do Teatro e o escolástico protótipo conversacional…

Ainda pensei em fotografar o cadeirão em que Garrett se sentava no Conservatório Real, mas mudei de ideias ao encontrar os bonifrates de António José da Silva… (8.05.1705 – 19.10.1739)
«Havia multidão em S. Domingos, archotes, fumo negro, fogueiras. Abriu caminho, chegou-se às filas da frente, Quem são, perguntou a uma mulher que levava uma criança ao colo, De três sei eu, aquele além e aquela são pai e filha que vieram por culpas de judaísmo, e o outro, o da ponta, é um que fazia comédias de bonifrates e se chamava António José da Silva…» José Saramago, Memorial do Convento

D. João V reinou de 9.12.1706 a 31.07de 1750

Comentário: O aluno do 12º ano tem de dar prova do seu conhecimento dos diversos protótipos textuais. Quanto à história da injustiça, que  importa? O melhor seria passar pelo Museu do Teatro e deixar-se de formalismos... Pode fazê-lo, sem custos, ao domingo, das 10 às 14 horas.

8.3.14

Ir jantar fora

Há quem vá jantar fora
e quem não tenha dinheiro para jantar!
Eu, dizem-me, fui convidado para ir jantar fora,
mas estou proibido de jantar fora e dentro!
Só uma sopinha e, talvez, um chá de ervas...

Na verdade, preferia não ir jantar fora
que fosse quem não tem dinheiro para jantar...

Assim como está, é uma maçada jantar fora!

O ideal era ir mas sem jantar...
(Poderia  até sentar-me à mesa!)

7.3.14

O bâton e o verniz valem mais do que um poema

À maneira proençal, inventaram um dia mundial da poesia e passou a ser moda, em certos lugares, declamar ou ler em silêncio o poema eleito... Ninguém sabe bem como escolhê-lo e, sobretudo, todos esperam que alguém aponte a dedo o demiurgo que o terá gerado...
O problema é que a leitura dos poetas é coisa rara num país que até tem parques de poetas, ruas de poetas, cais de poetas, mas que deles faz poetas de rua...
À maneira proençal, vivemos num tempo em que o bâton e o verniz valem mais do que um poema, porque ignoramos que o poeta também tem lábios e unhas e procura o sol nas manhãs de inverno...

Nemésio disse um dia: « O meu cavalo é todo memória: / Um fio de vento contra as estrelas, /A lanterna que sai da cocheira, como elas / Do pó da noite para as nuvens altas.»  Memória e Queda (1963)

Também eu tive uma lanterna que entrava no palheiro 
Lá não havia cavalo apesar das estrelas
Primeiro uma mula velha
Depois uma burra fogosa que me atirava ao pó da rua...  
Nos poemas (e nas terras dos ricos) encontrei cavaleiros e amazonas
(...) 
Hoje, nem cavalo nem burro
Desfolho o poeta
e sinto que «O anoitecer situa as coisas na minha alma / como as cadeiras arrumadas / Quando os amigos partiram.» Eu, comovido a Oeste (1940) 

Não compreendo por que motivo, à maneira proençal, se lembraram de inventar o dia mundial da poesia se nunca entenderam a fosforescência da lanterna... ao contrário de D. Dinis, Políbio Gomes dos Santos, Vitorino Nemésio, Vasco Graça Moura e de todos aqueles que nos versos conseguem tecer os fios que os prendem ao universo.

  

6.3.14

Polícia empata polícia

Uns vão construindo o muro, os outros tentam derrubá-lo.
Já lá vão duas horas!
O jogo policial continua empatado e assim continuará. Enganaram-se na definição do alvo, pois seguem uma estratégia errada...
Bastava uma força de segurança unida, de braços caídos, para fazer cair um regime que, desde a entrada na união europeia, vem destruindo o país...

Há muito que a democracia foi feita refém pelos filhos e netos do Estado Novo. O que hoje decorre em São Bento envergonha Abril!

5.3.14

De todas as palavras

No geral, as palavras são desnecessárias e, frequentemente, causam desaguisados. Em nome do quê? Em nome de causas menores, causas mesquinhas! 
Há, no entanto, dias em que as palavras fazem faltam! Só elas podem conter a ansiedade. Só elas podem evitar que as armas desfaçam a racionalidade, pondo em causa a humanidade...
No meu caso, não preciso mais do que uma palavra: ouvi-la ou vê-la escrita basta!

Temo, porém, que, de todas as palavras, só não receba aquela que me poderia sossegar... 

4.3.14

Sob a intempérie

L’homme n’est qu’un roseau, le plus faible de la nature; mais c’est un roseau pensant. Il ne faut pas que l’univers entier s’arme pour l’écraser : une vapeur, une goutte d’eau suffit pour le tuer. Mais quand l’univers l’écraserait, l’homme serait encore plus noble que ce qui le tue, parce qu’il sait qu’il meurt, et l’avantage que l’univers a sur lui, l’univers n’en sait rien.” Blaise Pascal

É no mínimo discutível que o homem pascaliano seja mais nobre do que aquilo que o mata, pois a morte é cada vez mais uma invenção do homem. Os sinais de que certos homens preparam minuciosamente a morte dos outros homens proliferam em Portugal, na Grécia, na Síria, na Ucrânia, na Venezuela, no Quénia, na Nigéria…

Sob a intempérie, a cegonha mantém-se firme…

3.3.14

Formas atípicas

Não se sabe quando irão morrer, embora se possa saber quando foram edificadas, estas formas já não cumprem qualquer função. A primeira, gaiola de pássaros por aprisionar, nasceu da opulência; a segunda abrigou ganhões de sequeiro a quem faltou o cimento e o ferro… por perto, ainda crescem flores quaresmais… (as fotos foram eliminadas, porquê, não sei.)
Imagine, se ainda pode...

2.3.14

O céu desigual



Em S. Marcos de Ataboaço, por detrás da bela fachada da igreja, o bairro degradado…


Do alto da ermida de Aracelis, o latifúndio…

Tudo isto me faz pensar que algum latifundiário latinista se terá lembrado de erguer a ermida «ara caelis» – o altar do céu – para que os servos pudessem uma vez por ano aproximar-se do céu, já que a terra diária seria um pesadelo.

Também eu procurei esse altar divino,  mas só ouvi a fúria do vento que ramalhava os eucaliptos…

/MCG

1.3.14

Os lugares e a identidade

A propósito de mitos fundadores desta pátria tão maltratada, aqui registo o lugar identitário, físico e duplamente simbólico…

Como a identidade não é apenas de natureza nacional, assinalo, também, para os que vão passando pela Escola Secundária de Camões, o nome de SEVERO PORTELA, cuja obra merece ser visitada no Museu Municipal de Almodôvar.

Nota 1: Severo Portela terá frequentava o Camões em 1918, à data da pneumónica.
Nota 2: «Grassando em Espanha desde Maio de 1918, a gripe pneumónica detecta-se já em Portugal em finais desse mês. Em Leiria, o primeiro caso de morte registado, devido à gripe, data de 4 de Junho de 1918. Da fronteira terá irradiado para o litoral a partir de dois pólos distintos: um, situado mais ao Centro, envolvendo concelhos raianos dos distritos da Guarda e Castelo Branco e o outro, mais a Sul, englobando concelhos dos distritos de Beja e Évora. Progredindo rumo ao litoral, a gripe, na sua primeira onda epidémica, entre finais de Maio e meados de Julho, rapidamente atingiria os grandes centros urbanos de Lisboa e Porto. A partir destas áreas metropolitanas, na segunda e última vaga epidémica, de início de Agosto a finais de Novembro de 1918, estender-se-ia a todo o território continental, provocando uma autêntica razia demográfica, com graves repercussões sociais e económicas.»
Nota 3: - «Nunca vi uma coisa destas, Tibúrcio! Em Lisboa no Convento das Trinas e no Liceu Camões tiveram de improvisar hospitais de campanha, e está em curso a criação de uma comissão de socorro cá para Sintra. Até médicos retirados tiveram de ser chamados, imagine!»

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