31.8.16

Dilma Rousseff afastada. E pode?

Senado decidiu contra a chefe de Estado brasileira por 61 votos contra 20. Dez de 13 investigados no âmbito da Operação Lava Jato votaram a favor.

Dilma Rousseff afastada da Presidência pelo Senado. E pode?
Acusada do quê? De ter deixado avançar a Operação Lava Jato?
Lembra o tempo em que o voto do povo ainda não existia. O tempo romano!
(...)
E quanto ao novo Presidente Temer, será que o Brasil entrou no tempo em que a traição rende?

30.8.16

A rua da Bombarda

Por razões familiares, nos últimos meses, tive que me deslocar à rua da Bombarda, em Lisboa. Diga-se que antes nunca tinha ouvido falar de tal arruamento... Peculiar, pois é uma daquelas vias em que entrando nela não se pode voltar para trás e onde é quase impossível estacionar.
Quando há obras à entrada ou no interior, corre-se o risco de ficar indeterminadamente bloqueado - e por ali impera a lei do embrulho urbanístico. 
Por aquilo que vou observando, o embrulho urbanístico é lucrativo, pois permite desalojar, arrendar a preços de mercado e, sobretudo, subalugar a jovens estrangeiros perdidos nos subúrbios da Graça e do Castelo...
Enfim, nestes meses calcorreei o Bairro das Colónias, cada vez mais multicultural e enlatado e, a tempos, desemboquei na Graça, atualmente sem graça, tantas são as obras  e, sobretudo, sem que se veja o traço do arquiteto.
Hoje terá sido o último dia em que fui à rua da Bombarda... e até consegui estacionar em frente do nº 62, logo a seguir a uma oficina de automóveis que nunca vi encerrada. Houve sábados, domingos e feriados em que antecipei que poderia estacionar em frente daquele portão. Mas não!

29.8.16

O regabofe das obras

A Câmara Municipal de Lisboa aprovou 292 propostas de trabalhos desde o início de 2015, ano em que adjudicaram 74% das obras. E vão continuar até 2020: estradas e passeios, praças e largos.

Ainda estamos em agosto e  é cada vez mais difícil circular na cidade. Hoje, precisei de percorrer a avenida Infante D. Henrique e fiquei parvo com a quantidade de entraves criados à circulação rodoviária  e pedonal, sem esquecer os velocípedes. 
Recordo que ainda há poucos anos aquela via foi objeto de profunda remodelação que deverá ter custado umas dezenas de milhões de euros... Provavelmente, nem houve tempo de amortizar os empréstimos!
Há nisto tudo algo que me incomoda. Donde é que vem o dinheiro necessário ao pagamento de todas estas empreitadas? Será da Caixa Geral de Depósitos?
E no final, quantos novos-ricos haverá a mais?

28.8.16

O emplastro

Perdi-lhe o nome, mas, sempre que ele invade o ecrã, fico sem saber o que fazer - ouvi-lo pela enésima vez; se mudo de canal, temo que o emplastro tenha decidido abdicar do seu papel de "Velho do Restelo", e eu perca o acontecimento.
O problema é de que nada serve mudar de canal, pois o emplastro vive neles como o Velho nas páginas d' Os Lusíadas. E condena-nos à morte, inevitavelmente. 
O emplastro lembra-me o Presidente do Conselho, Oliveira Salazar, que insistia no argumento de que "a razão" estava do seu lado e que o tempo se encarregaria de o mostrar.
O emplastro parece ser um legitimista que nunca percebeu que quem provocou a mudança foi ele próprio.  

27.8.16

Entre nós...

"O cão não abandona o caixão do dono.
A notícia vem de Itália, mas poderia vir de qualquer outra parte do mundo.

Entre nós, porém, há quem não se importe com o que acontece ao seu semelhante. Passe de lado, mude de passeio, se esconda...
Em último caso, acena-se com uns milhões de euros que vão direitinhos para o bolso dos "empreendedores"... 
Há por aí quem deite os foguetes e apanhe as canas! 

24.8.16

Em silêncio

Vou ficar em silêncio... A lição é dos avós que poupavam nas palavras e, assim, evito o desconforto alheio, de quem já andava farto de tamanha prosápia...
Sob as horas inúteis, de que serve terçar armas por uma ou outra causa ou até, num tom mais intimista, dar conta da tensão a que obedecemos cegamente...
Em idade juvenil, o silêncio era por vezes cenário de uma imaginação colonizada por anátemas demoníacos - no silêncio, o mafarrico destroçava-me o sossego...
Agora, chegou o tempo de ouvir as penas e guardá-las só para mim. A quem poderiam interessar as minhas penas? 

23.8.16

Longe da alegria

Vou esperar um pouco mais, embora a espera nada traga de entusiasmante... A atitude é masoquista, mas resulta de uma paciência inexplicável.
Sensato seria não esperar, porém de pouco serviria. Provavelmente só apressaria o desenlace. E esse é inevitável, mesmo que finjamos ignorá-lo.
E lá voltamos à paciência, isto é, à capacidade de suportar a rotina, o inesperado, a dor e até a ambição de uns tantos que persistem em acreditar na imortalidade...
Dentro de dias, estarei de regresso à alegria, postiça...

22.8.16

'Geringonça' , apontamento político-linguístico

Desde que Paulo Portas batizou o governo como 'geringonça' que procuro a origem do termo. Pela sua sonoridade, encontro-lhe um laivo onomatopaico que me faz pensar na sua antiguidade e, sobretudo, na sua expressividade de raiz popular... Afinal, o aristocrata 'Paulinho das feiras', era sensível à quinquilharia e ao palavrão... 
Por outro lado, pondo a questão de forma cerimoniosa, o termo 'geringonça" pode ser uma adulteração do castelhano 'jerigonza' que, certamente, refletirá o modo como os senhores de Castilha olhavam para as nossas proezas... Sem esquecer, o antepassado provençal 'gergon' que serviria para designar a impossibilidade de compreender o linguajar da época avesso a qualquer norma, senhorial ou conventual...
Andava eu nestas cogitações, quando o olhar me caiu sobre a exemplificação de palavras africanas (Caderno de Atividades / Novo Plural 10): lá estava a 'geringonça' no meio de outros termos mais ou menos suspeitos: «búzio, cachimbo, canga, Congo, cubata, dengoso, embalar, fulo, geringonça, lengalenga, macaco, manha, missanga, pipoca, tanga, tango»
Rogando pragas à erudição, estou pronto a aceitar a última explicação. Foi em África, provavelmente no Roque Santeiro, que o Paulinho descobriu a 'geringonça' e decidiu que era do seu interesse (e do PP e do Estado Português) apostar no governo do José Eduardo dos Santos, mesmo que isso o obrigue a afirmar que a geringonça portuguesa está para durar, ao contrário do 'amigo' Passos... 

21.8.16

Maria Rueff em entrevista ao Diário de Notícias

"As pessoas não são as políticas dos países." DN, 21 de agosto de 2016

Se puder, compre o DN deste domingo, e leia, pois irá ver que não se arrepende. Está lá tudo sobre algumas das pessoas mais genuínas deste país dos últimos 50 anos, a começar pela Maria Rueff...
A entrevista, conduzida por Ana Sousa Dias, deveria ser de leitura obrigatória nas escolas deste país, que persiste em valorizar valores efémeros e fátuos.
Este é um daqueles testemunhos que, até hoje, melhor me explicaram que a 'glória política' pouco tem a ver com o sentir e o viver das pessoas, que, de forma espontânea, choram e riem sempre que alguém lhes fala ao coração...

20.8.16

O IMI não pode ser um privilégio

O IMI deve ser um imposto universal.
Como tal, sou contra qualquer tipo de isenção a quem quer que seja - Fundações, Igrejas, Associações, Estado, Banca, Municípios, Embaixadas, Emigrantes, Estrangeiros...
A exceção abre sempre a porta ao privilégio...

19.8.16

Vão estudar, malandros!

Desta vez, tenho que estar de acordo com o BCE.
Um Governo socialista, apoiado por partidos à sua esquerda, esqueceu-se de colocar 30% de mulheres no topo da CGD. Lembra o atual executivo brasileiro...
Um Governo socialista quer que a CGD seja "governada" por 19 administradores, contrariando a norma europeia.
Um Governo socialista promove a acumulação de interesses privados no banco de que o Estado é o único acionista.
Um Governo socialista nomeia para cargos executivos "rapazes" sem formação adequada e ainda se prepara para lhes pagar as propinas numa instituição sediada em Fontainebleau. Por seu turno, os três rapazes (João Tudela Martins, Paulo Rodrigues da Silva e Pedro Leitão) não se queixam  por serem obrigados a frequentar, em regime post-laboral,  o curso de Gestão Bancária Estratégica do Insead.

Enfim, perante a argumentação de rejeição das decisões do BCE, ainda fico à espera que o senhor Mário Draghi imponha que o secretário de Estado do Tesouro, Ricardo Mourinho Félix, vá frequentar um curso de Administração da Fazenda Pública...

18.8.16

Uma história elementar

Caim, o primogénito, era senhor dos campos que a sua vista conseguia enxergar e neles não havia lugar para os rebanhos do seu irmão, Abel. Este, inicialmente, resignou-se e levou o seu gado para o outro lado do alcance de Caim.
Só que, certo dia, os montes começaram a secar, e Abel viu-se obrigado a procurar novo pasto no fecundo horto de Caim. Os rebanhos de Abel, famintos, devoravam as primícias que iam encontrando pelo caminho...
Um caminho sem regresso, pois Caim, irado, acabou por degolar o infeliz Abel.

Esta é uma história em que o Senhor não pôs nem dispôs. A causa tem que ser procurada nos pais, Adão e Eva, que não souberam educar os filhos. E assim continuamos. De nada serve pensar que Caim, mais tarde, se terá arrependido, e que isso bastaria para que o mundo se tornasse mais solidário. 

17.8.16

O direito à autodeterminação

A colonização é apresentada como "globalmente positiva". Nesse balanço, o destaque é dado às infraestruturas herdadas da colonização, sem esquecer o contributo para a fundação dos novos estados modernos - versão corrigida do que outrora era designado por "missão civilizadora". Por outro lado, a tendência é para desvalorizar a ação repressiva, voltando as costas à ação dos exércitos coloniais e à "selvajaria" dos insurretos.
Na obra Massacres Coloniaux - 1944-1950: la IVè Republique et la mise au pas des colonies françaises, ed. La Découverte, YVES BENOT explica que, entre 1944-1950, " ces répressions ont lieu dans un temps où s'achève une guerre mondiale dont deux des principaux protagonistes, l'Angleterre et les États-Unis, ont défini les termes de la Charte de l'Atlantique (août 1941) qui proclame notamment le principe du droit des peuples à disposé d'eux-mêmes, autrement dit, l'autodétermination". Principe repris dans la Charte des Nations unies dont la France est cofondatrice en 1945. 
Basta olhar para o historial dos massacres perpetrados pelos franceses para perceber que o princípio consagrado na Carta das Nações Unidas foi totalmente desrespeitado:
  • O massacre de Sétif teve início no dia 8 de maio de 1945, fazendo dezenas de milhares de vítimas argelinas ( e apenas 102 vítimas europeias).
  • Os massacres de Rabat-Salé e de Fez, em Marrocos, janeiro-fevereiro de 1944.
  • O massacre de Haiphong, no Vietname, em novembro de 1946.
  • O massacre de Madagascar, em 1947-1948.
  • O massacre de Casablanca, em abril de 1947.
  • O massacre da Costa do Marfim, em janeiro de 1950.

O direito à autodeterminação radica numa linha de pensamento inaugurada por Diderot e pelo abade Rayal, consagrada ainda durante a Segunda Grande Guerra, mas isso não impediu os vencedores de o ignorar. Basta ver como Salazar constrói uma doutrina colonialista que lhe permitiu avançar para a guerra, à margem dos processos de descolonização em curso desde os anos 40...
E hoje, países como a Turquia ou a Rússia continuam a fazer tábua rasa desse princípio, eliminando e anexando...
( Referência inicial: Augusta Conchiglia, Massacres Coloniaux, Nouvel Afrique-Asie, nº 63, Déc. 1994)

16.8.16

Teta Lando, taxeiro

Desvario linguístico:

Identificado como simpatizante da FNLA, Teta Lando foi forçado a procurar refúgio na vizinha República do Zaire. " Logo que cheguei fui convidado para cantar com aquele que é, quanto a mim, o maior artista que África já produziu, Franco Luambo Makiadi*. Só não o fiz porque o salário que me ofereciam era muito pequeno. E como a única coisa que tinha levado comigo era o carro, tornei-me tacheiro." Motorista de táxi na desvairada cidade de Kinshasa. A sua situação espantava e incomodava os angolanos. "Às vezes apareciam clientes angolanos. Teta Lando? Você por aqui, e ainda por cima taxeiro?!" Público Magazine, 8 de janeiro de 1995.


15.8.16

Estórias inverosímeis

Um pouco à deriva, sem compreender por que motivo um país de costas voltadas para a espiritualidade, usufrui de mais um dia santo cuja imagética é, em si, suficientemente fantasista, ataco as páginas de jornais que persistem em assombrar-me, e lá vou encontrando “estórias inverosímeis”, mas perturbadoramente atuais…
Os meninos da rua
«Os meninos de rua, fenómeno recente em Angola, contam-se já aos milhares. Na sua maior parte, ocupam o dia vendendo todo o tipo de utensílios, que por sua vez adquirem a preços ligeiramente inferiores no grande paralelo de Luanda, o Roque Santeiro: vendem cigarros, canivetes, relógios, pentes, máquinas de calcular, espelhos, rádios, secadores de cabelo, e até aparelhos de ar condicionado. Outros lavam carros, transportam volumes, pedem esmola. À noite estendem-se nos passeios ou constroem pequenas barracas nas areias da Ilha, onde outrora os luandenses iam namorar.»
Palavra de honra
«Dirigiram os dois a casa do presumível ladrão. O homem convidou-os a entrar, ofereceu-lhes de beber e finalmente quis saber o motivo da visita. Quando Carlos disse ao que vinham, o ladrão sobressaltou-se: “Palavra de honra que não fui eu”, garantiu, “aliás, se tivesse sido, vendia-lhe já o carro!»
Homem nu
«Pouca gente repara neste homem, que há vários meses se passeia nu em ferente ao parlamento. O fotógrafo do Público repara. Levanta a máquina, e depois volta a baixá-la horrorizado: “Não posso fotografar isto!” O homem tem uma ferida aberta no ventre e os intestinos expostos à luz.»
Dias Kanombo, investigador kimbanguista*
“O Grilo”, sempre vestido de verde, muda de nome consoante o interlocutor, saltando do português para o francês, o inglês ou até o sueco, com a mesma facilidade com que falava umbundu, kikongo ou otchivambo, o luminoso idioma do seu próprio povo – os quanhamas…
(Nascido no Cuvelai, no Cunene, Kanombo é neto por linha materna do régulo local. O pai, alfaiate e pastor, era também catequista numa missão luterana finlandesa. Kanombo chegou a frequentar o seminário, mas rapidamente concluiu que não tinha vocação para padre, vindo a completar o ensino secundário no Liceu do Lubango. Mais tarde, frequentou a Universidade Kopta, no Egito, licenciando-se em Egiptologia…)
Nos anos 80 foi um dos mais ativos elementos da juventude da UNITA em Portugal. Em 1992, reapareceu em Luanda, durante a campanha eleitoral, despertando dúvidas antigas: “Afinal, para quem trabalha este homem?” Kanombo responde com uma gargalhada: “Trabalho para o Ciciba, Centro de Investigação da Civilização Bantu, e estou agora baseado em Durban, na África do Sul, onde estudo a relação entre o antigo idioma egípcio e algumas línguas bantu, em particular o zulu
*Tudo terá começado na pequena aldeia de Nkamba, então Congo Belga, a 8 de março  de 1921. Nessa noite, Simão Kimbangu, catequista, antigo aluno de uma missão batista inglesa sonhou que um anjo o visitava. Soube no mesmo instante que era reencarnação do Espírito Santo e que tinha vindo ao mundo cumprir uma missão: “Os povos negros foram os primeiros a cortar relações com Deus”, explica Dias Konambo “em consequência disso são os principais responsáveis pela decadência do mundo”. A missão do Espírito Santo, encarnado no pobre catequista de Nkamba, seria a de recuperar para Deus os negros de África, salvando assim toda a humanidade (…). Hoje (Público, 8 de janeiro de1995) o kimbanguismo é a religião mais popular do Zaire. Na África do Sul, milhões de negros, os sionistas, seguem os seus ensinamentos, enquanto no Egipto encontrou o apoio irrestrito da Igreja Kopta.

Nota: O Kimbanguismo é um Cristianismo resultante dos ensinamentos e obras de Papá Simon Kimbangu baseados no Amor, Obediência as leis de Deus e o empenho no trabalho. É uma nova civilização que pretende implementar as bases do humanismo pelo temor de Deus e o respeito do ser humano sem discriminação de raça, tribo e línguas. O kimbanguismo é a filosofia do renascimento do povo de Deus sustentando a visão do respeito dos valores Divinos e humanos. Em suma, o kimbanguismo é uma visão teo-antropocêntrica.
(Mais uma organização tentacular!)

14.8.16

Diz o roto sobre o nu

"Diz o roto ao nu", neste caso "sobre o nu", pois a vontade de encontrar cumplicidade é mais forte...
Lá na terra, nem pastor era, ajudava na condução e recolha do rebanho comunitário, quando um forasteiro lhe contou que em Lisboa é que a vida era boa... Sem perder tempo, abalou para a capital.
Ainda se pensou que estivesse destinado a ajudante de pedreiro, mas não, em Lisboa, os ajudantes de pedreiro são todos engenheiros... Sem saber como, um conterrâneo arranjou-lhe trabalho numa pastelaria. 
E o roto, em vez de aviar o freguês, lá vai dizendo que o colega nem o almoço merece...   

13.8.16

Organizações tentaculares

Há coisas que eu não compreendo:
  1. " A rede internacional Feithullah Gülen conta com uma cadeia de rádios, televisões, jornais, centros educativos, empresas, associações e fundações em mais de 140 países."
  2. "Vivem na Alemanha perto de 100 mil «güllenistas», além de 150 associações, 25 escolas, 15 «centros de diálogo» e um jornal, o diário «Zaman», com um cordão umbilical ao grupo religioso(...) sem se saber o que realmente são: «uma comunidade de crentes islâmicos conservadores, uma rede profissional de caracter missionário ou um movimento político islamita radical»". Expresso, 13 de agosto de 2016
     A verdade é que eu não compreendo que se deixem constituir organizações tentaculares no interior de estados de direito que deviam zelar pelo interesse coletivo.

12.8.16

António Gonçalves Ribeiro tem biografia a menos

Ainda a propósito daqueles que têm biografia a mais, hoje, ao reler documentação vária sobre o regresso dos portugueses de África em 1974 e, sobretudo, em 1975, verifico que há quem tenha biografia a menos.  Pelo menos, é o que constato ao pesquisar o nome de António Gonçalves Ribeiro, responsável pelo retorno de uma boa parte dos 700 mil que vieram acrescentar 6% à população metropolitana.
O milagre do regresso e da integração dos portugueses de África muito deve ao voluntarismo e à abnegação desse português que tomou para si a responsabilidade  que era do MFA, do Presidente da República, do Governo e das Forças Armadas... que bem se esforçaram por sacudir a água do capote. Lá no fundo, os Governantes da época não eram muito diferentes dos do Estado Novo... Só a ideologia mudara, o que não era pouco, pois isso significou que as colónias ( províncias ultramarinas) tivessem ficado nas mãos das potências estrangeiras... e que os laços afetivos fossem definitivamente destruídos... 
O que explica muita coisa! Não fosse essa irresponsabilidade (da cegueira doutrinária de Salazar ao excessos dos primeiros anos da Revolução), não estaríamos hoje tão mal governados e sob a batuta do eurocentrismo.

11.8.16

Sempre o passado

Uma travessa? Uma chávena?
Sempre o passado. A herança.
As pessoas só interessam depois de mortas. E nem todas!
Vivem nas porcelanas, nas fotografias, em certas palavras...
(...)
Quanto aos vivos, se longe, assombram a cada esquina de distância...
Se perto, falta a paciência, já é tempo de zarpar...

E depois pego no Livro da Vida, falta lá imensa gente. Olho à volta, e é tudo tão inflacionado...

10.8.16

Ponte aérea durante o Verão Quente de 1975

«Havia quem defendesse (no Conselho dos 20, um dos órgãos do MFA) que os não devíamos ajudar, porque eram fascistas. Lembro-me do tempo que se perdeu com esta discussão e que a reunião foi inconclusiva a este respeito.» Vieira de Almeida, ministro da Economia nomeado por Portugal para o Governo de transição saído do Acordo de Alvor, assinado a 15 de Janeiro de 1975.

O tenente-coronel Gonçalves Ribeiro acabou por ser o responsável pela ponte aérea. É provável que os mais de 200.000 portugueses saído no âmbito da ponte aérea devam a Gonçalves Ribeiro o facto de lhes terem sido postos à disposição os meios de fuga.
Gonçalves Ribeiro chegara a Angola em 1972 para uma comissão de serviço de dois anos. A mulher e os filhos regressaram a Portugal em agosto de 1974, mas ele optou por prolongar a sua permanência na ainda colónia portuguesa. Integrou o Governo provisório que administrou o território até ao Acordo de Alvor. Em 1975, transitou para o gabinete do Alto-Comissário Silva Cardoso, que substituíra o almirante Rosa Coutinho no cargo…
Em junho de 1975, «Portugal relegou a descolonização para plano subalterno. E, no entanto, faltavam ainda cinco meses para a data da independência de Angola estabelecida em Alvor.»
A 11 de Junho de 1975, o tenente-coronel Gonçalves Ribeiro desloca-se de Luanda a Lisboa, reunindo com a Comissão Nacional de Descolonização, onde defendeu que a TAP «estava muito longe de poder fornecer os meios necessários à saída da população branca. Um problema que não tem merecido o mínimo de atenção por parte do Governo», queixava-se. Naquela reunião, informou que, em Luanda, já havia 50.000 desalojados, vindos de outras áreas de Angola. E os pedidos de reserva de transporte para a metrópole ascendiam a 140.000.
Em maio de 1975, havia três exércitos em Luanda e cada um se considerava dono e senhor da cidade. A segunda batalha de Luanda seria desencadeada no início de julho. O MPLA acaba por dominar a maior parte da capital. Para a comunidade portuguesa, acentuava-se a urgência da partida.
Em Lisboa, acreditava-se que uma nova cimeira poria termo à guerra entre os três movimentos de libertação. MPLA, FNLA e UNITA reuniram-se entre 16 e 21 de junho, em Nakuru, no Quénia, sem que Portugal estivesse representado – o que violava uma das cláusulas do Acordo de Alvor. No texto de Nakuru, não foi feita qualquer referência a Portugal.
Entretanto, o MPLA estava a receber armamento pesado vindo da União Soviética e de outros países do Leste europeu. E a FNLA alimentava os cofres com dólares vindos dos Estados Unidos.  Era a lógica do conflito Leste-Oeste.
Para Gonçalves Ribeiro, havia que “aguentar” com um mínimo de dignidade: « E se queriam partir (os militares) tínhamos de os  trazer (os portugueses). Os militares não podiam partir, deixando lá abandonados aqueles que queriam vir embora
(a continuar)

Donald Trump a brincar com o fogo...

O candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos, Donald Trump, está novamente no olho do furacão, depois de ter proferido declarações polémicas. O magnata "sugere" aos seus eleitores o assassinato da sua rival, a democrata Hillary Clinton, que defende mudanças na legislação de compra de armas de fogo.
“Hillary quer, essencialmente, abolir a segunda emenda. Se ela conseguir escolher os juízes, não há nada que possam fazer. Talvez os defensores da segunda emenda possam, não sei”, disse o candidato republicano num comício na Carolina do Norte.  Económico

«Talvez os defensores da segunda emenda possam, não sei.» Isto é, Donald Trump convida os defensores da utilização pessoal de armas de fogo, a impedi-la de alterar a segunda emenda. E como?
O tom dubitativo não só não apaga a exortação, como reforça a pressuposição: «Não o posso fazer, mas delego em ti.»
Uma vergonha! Uma avaliação psiquiátrica vinha a calhar...

9.8.16

Soa a sirene

São 21h20, soa a sirene...
O apelo de reunião dos bombeiros prolonga-se...
Não sei se o fogo anda por perto ou longe... a verdade é que as televisões passam as horas a dar conta da falta de meios de combate aos incêndios. As imagens não mentem: os meios humanos e os equipamentos são escassos...
E sobretudo as populações não estão educadas para reduzir os riscos, evitando despejar o lixo no mato, limpando caminhos e bosques. As autoridades, por sua vez, fazem vista grossa... E até os pirómanos vivem à solta...
Quanto aos governantes, estão de férias!

PORTUGAL SEM FOGOS DEPENDE DE TODOS!

Entretanto, na Madeira, ouvem-se cada vez mais explosões de botijas de gás.

Qual é a notícia?

É a primeira vez que reformados e trabalhadores ativos da Função Pública trocam de posição. O número de beneficiários da Caixa Geral de Aposentações (CGA) ultrapassou o de subscritores – aqueles que fazem descontos para a reforma. Num relatório, o Tribunal de Contas (TdC) nota que “2015 é o ano de viragem, em que o número de subscritores é inferior ao número de aposentados/reformados”.
Os dados constam do Relatório de Acompanhamento da Execução Orçamental da Segurança Social. No documento, divulgado ontem, o TdC revela que, no final do ano passado, o número de aposentados da Função Pública era de 486.269 pessoas. Só por si, esse dado deixava clara a evolução face a 2006: o número de beneficiários cresceu 23,5%, quando comparado com o cenário de dez anos antes. Jornal i

Se diminuiu o número de contratados e os novos deixaram de descontar para a Caixa Geral de Aposentações, qual é a surpresa? Qual é a notícia?
Agora, só a canícula é que pode tapar o buraco! 

8.8.16

Resposta de Salazar a George Ball

Lisboa, 29.02.1964
  1. A ordem nova (americana), ao defender «o movimento nacionalista dos povos do continente africano», visando  a independência, «tem de negar o direito preexistente». Esta mudança de posição dos Estados Unidos torna o diálogo impossível.
  2. A Carta das Nações Unidas « prevendo prudentemente várias soluções, desde a integração à independência, entendeu confiar a definição do destino desses territórios à autodeterminação dos povos interessados por intermédio da soberania responsável e, naturalmente, quando pudessem responder por ato tão transcendente de vontade política.»
  3. Três graves queixas de Salazar: a) «os territórios ultramarinos portugueses não são, não eram territórios dependentes mas politicamente integrados num Estado que nessa forma constitucional foi admitido sem discrepância nas Nações Unidas; b) nas moções votadas referentes a Portugal a autodeterminação não tem sido a escolha de opções diversas, conforme prescreve a Carta, mas a imposição de uma só - a independência; c) no tocante aos territórios portugueses (pelo menos em relação a estes) a independência imediata que se tem exigido recusa a natural evolução dos povos e a existência de uma formação política esclarecida. (...) E podíamos queixar-nos ainda de que a chamada autodeterminação está sendo procurada através de todos os meios de pressão externa, como se a vontade dos povos possa substituir-se à única válida das populações interessadas.» 
  4. Salazar sabe bem que o objetivo da autodeterminação defendido pelas Nações Unidas ( e pelos Estados Unidos) é apenas um disfarce da exigência de independência imediata, indo ao ponto de referir a posição do Secretário-Geral da ONU, U Thant, pois as Nações Unidas terão chegado ao ponto de votar não ser precisa qualquer preparação para a independência.
  5. Salazar contrapõe à proposta americana: «V. Exª contrapõe aos resultados desastrosos obtidos naqueles casos em que a independência se operou contra a potência soberana, o êxito alcançado quando a mesma se processou com o auxílio desta. Ora a experiência tem demonstrado (...) que a estabilidade política dos novos Estados ou assenta numa base tribal ou depende do auxílio exterior. No primeiro caso assistimos a um recuo traduzido no renascimento da primitiva organização dos territórios; no segundo estamos perante o que poderia designar-se pseudoindependência ou soberania disfarçada dos mesmos territórios.»
  6. Salazar antevê que no caso de uma independência em que sejam quebrados os laços políticos, a consequência será «a de a posição de Portugal ser tomada por um terceiro país - e não será isso que se pretende?»
  7. Em 1964, Salazar caracteriza o mapa político africano, à exceção da África do Sul,  com «um tom exclusivamente neutralista, senão já alinhado em alguns casos contra o Ocidente, o que quer dizer que os novos Estados africanos se recusam a tomar posição no conflito ideológico que contrapõe o Ocidente ao mundo comunista ou tomam-na em favor deste.»
  8. Sobre a estratégia comunista, Salazar defende que o comunismo «pode desistir de formar partidos políticos africanos identificados como comunistas; nem procurará ostensivamente instalar repúblicas populares. Os objetivos comunistas em África contentar-se-ão, ao que nos parece, com captar África para a nacionalização da riqueza formada, meio caminho andado para lhe cortar o progresso económico, e depois em neutralizá-la, ideológica e estrategicamente. (...) Por isso, e na medida em que fomentarmos, o neutralismo africano, creio que estaremos a criar posições que servem, essencialmente, os interesses do inimigo.
  9. Sobre o terrorismo, Salazar não tem dúvidas de «que, se cessasse o auxílio externo aos terroristas, estes não tardariam também a fazer cessar a sua maléfica e inútil atividade...»

7.8.16

Salazar pensava que tinha tempo

António Spínola discordava, como vimos, de Salazar porque este pensava que era preciso "saber esperar".
Também George Ball, enviado de Kennedy, em carta de 21.10.1963, refuta a tese de Salazar:

«V. Exª acredita acredita que o tempo trabalha a seu favor, nós não. Conforme tive oportunidade de referir, as nossas estimativas indicam que nas melhores circunstância, não será possível dispor de mais de 10 anos para preparar os territórios para o ato político da autodeterminação. Se forem aproveitadas todas as oportunidades durante esse intervalo de tempo, nós estamos seguros de que a presença efetiva de Portugal poderá persistir. Se, ao contrário, essas oportunidades forem desperdiçadas nós concordaremos então com a previsão desoladora de V. Exª de que Portugal será incapaz de "manter a sua influência e os seus interesses atuais nos territórios contra todas as influências ideológicas e económicas impulsionadas do exterior.»
E como sugestão programática, George Ball acrescenta:
« Nós estamos perfeitamente cientes de que este apoio (dos líderes africanos mais moderados) só será possível se Portugal der uma indicação afirmativa, primeiro, de que a autodeterminação é o objetivo em direção ao qual se orienta a sua política e, segundo, que o Governo português está a promover numa base de urgência a realização de uma série de medidas - sociais, económicas, educativas e políticas - para preparar os povos para a autodeterminação dentro de um período de tempo razoável ainda que não necessariamente explícito.
(...) Em menos de uma década V. Exª poderia criar as bases para um programa educativo de grande amplitude. A preparação de africanos que carecem de especialização administrativa e técnica deveria também ser objeto de esforços imediatos, uma vez que nos parece essencial desenvolver e alargar o núcleo indígena de juristas, médicos, professores, engenheiros e operários especializados e semi- especializados capazes de suplementar os brancos que agora ocupam os postos administrativos fundamentais. E finalmente V. Exª poderia no espaço de tempo que lhe resta treinar um quadro de professores para conduzirem um sistema de escolas, a desenvolver tanto nas áreas rurais como urbanas...»

6.8.16

O que António de Spínola disse


Entrevistado por José Pedro Castanheira (Expresso, 1994)

1.      O acompanhamento de perto da Guerra Civil de Espanha e da ofensiva Alemã na União Soviética, durante a Segunda Guerra (…) «no plano político, permitiram-me reflectir sobre o papel das grandes potências na condução dos negócios do mundo e sobre o papel reservado aos pequenos países quando queiram manter uma soberania visível.»

2.      Em 1961, foi como voluntário para Angola. «O Ultramar, qualquer que fosse o seu futuro, era um desígnio nacional, reiterado por todas as forças políticas, quer situacionistas quer da oposição.

3.      «A minha experiência militar, o meu conhecimento da História e a minha experiência no Ultramar (13 anos) ensinaram-me que não havia solução militar para a guerra. (…) Um Estado federado ou uma federação de Estados eram soluções possíveis.»

4.       Conheceu bem Humberto Delgado, mas em 1958, votou no almirante Américo Tomás.

5.      Em maio de 68, foi convidado por Salazar para Governador da Guiné, tendo na audiência que Salazar lhe concedeu, contrariado a tese de «saber esperar» … «Ante a tese de Salazar de “defesa do Ultramar” e de “defesa da Guiné” face à ameaça soviética, tive ocasião de lhe expor a tese da “revolução social”, com aceleração máxima do desenvolvimento económico, em paralelo com a promoção social e cultural dos africanos. Só assim a defesa militar tinha sentido útil. No final, sem contrariar a minha tese, Salazar só me disse: “É urgente que embarque para a Guiné.”»

6.      A nomeação de Marcelo Caetano para presidente do Conselho foi um momento de esperança, «dando-lhe sempre o meu apoio para soluções de abertura.»

7.      Nos dois primeiros anos da sua estadia na Guiné, compromete-se num esforço militar no sentido de recuperar posições. A partir de 1970, é a componente social e política que ganha relevo… «O PAIGC, em 1970, estava enfraquecido, dividido e mais longe das populações, então ainda muito ligadas à Mãe-Pátria. Era altura negociar… 1972 era o ano ideal para medidas concretas.»

8.      «O objetivo principal da operação Conacri era justamente libertar Amílcar Cabral das pressões sobre ele exercidas pela União Soviética, de que o PAIGC dependia totalmente do ponto de vista financeiro e de material logístico e militar.»

9.      «Mário Soares foi um homem corajoso no seu combate à ditadura, aprendeu muito com os desvios da revolução e soube corrigir o seu posicionamento; governou o país sempre em situações difíceis e veio a ser um grande Presidente da República. (…) A morte de Francisco Sá Carneiro foi uma perde nacional.»

10.   Em 1972, «nunca me assumi como candidato à Presidência da República. Naturalmente que não temia um confronto eleitoral com o almirante Américo Thomaz em eleições diretas e livres. (…) A escolha feita por Marcello Caetano foi sem dúvida um passo decisivo para o suicídio político.»

11.  O encontro secreto com Senghor realizou-se a 18 de maio de 1972, tendo o Presidente «expresso uma grande simpatia pelo nosso país e louvado a nossa política social na Guiné. Ofereceu-se para intermediário, como defensor duma “autonomia interna” de tipo federativo com Portugal. Informou-me mesmo de que Amílcar Cabral era recetivo a essa ideia. Ele próprio me sugeriu um encontro com o prof. Marcello Caetano em Bissau. (…) Em Lisboa, tudo foi rejeitado por Silva Cunha e Marcello Caetano com argumentos jurídico-legais.

12.   Estabeleceu vários contactos com Amílcar Cabral, embora Luís Cabral e Aristides Pereira afirmem que nunca tiveram conhecimento de tal. Em Outro de 1972, Amílcar Cabral ter-lhe-á proposto um encontro em «território português», através do inspetor da DGS Fragoso Alas.

13.   Reagiu intempestivamente à morte de Amílcar Cabral, em janeiro de 1973, “Lá me mataram o homem”: «Essa reação está correta. E a insinuação foi, na verdade, para PIDE/DGS de Lisboa, que, a proceder assim, agia às ordens do Governo Central, sem qualquer ligação com o Governo da Guiné. Penso, no entanto, que as dissidências internas do PAIGC, habilmente exploradas por Sékou Touré, é que conduziram à morte de Amílcar Cabral. (…) Não havia no PAIGC substituto com igual inteligência e portuguesismo.»

14.   Na remodelação de novembro de 1973 não aceitou ser ministro do Ultramar, porque isso exigia «o compromisso de eu aderir à política ultramarina oficial.»

15.   O livro “Portugal e o Futuro” foi apresentado pelas «vias hierárquicas competentes. Portugal e o Futuro exprimia ideias que eram do perfeito conhecimento do presidente do Conselho. A proibição do livro, de acordo com a Lei, era da competência do ministro da Defesa. Ninguém pode acreditar que o livro não tivesse sido lido pelo ministro da Defesa e pelo presidente do Conselho.»

16.   Não aceitou a proposta de Marcello Caetano de reclamar, junto do presidente Thomaz, a entrega do poder às Forças Armadas. (Golpe palaciano) Tinha o apoio do ministro Veiga Simão, do almirante Pereira Crespo, do Dr. Rui Martins dos Santos, secretário de Estado do Ultramar…

17.   O 16 de março de 1974 «foi uma reação de combatentes do Ultramar à minha destituição e à do general Costa Gomes da chefia das Forças Armadas Portuguesas. O sentimento que os motivou foi de profunda revolta, designadamente no seio dos oficiais que serviram comigo (…) Mas o 16 de março foi uma reação espontânea e construtiva de oficiais que fizeram muita falta ao País no período entre 16 de março e 25 de abril. Resultou de uma reação espontânea do Comando de Operações Especiais de Lamego, que teve o seu núcleo no regimento das Caldas da Rainha.»

18.   «O plano operacional do 25 de Abril foi da autoria dos majores Casanova Ferreira, Manuel Monge e Otelo Saraiva de Carvalho, membros duma comissão militar de que faziam também parte outros oficiais como o tenente-coronel Garcia dos Santos e o major Moreira de Azevedo, coadjuvados pelos capitães Luís Macedo e Morais Silva e pelo alferes Geraldo. Com o 16 de março, Casanova Ferreira e Monge foram presos, aparecendo no 25 de abril o major Otelo como o principal estratego do movimento.»

19.   «Sou de opinião que a iniciativa decisiva de Salgueiro Maia de se deslocar de Santarém para o Quartel do Carmo o tornou merecedor de ser distinguido pelos altos serviços prestados à democracia e ao País.»

20.   «Não é verdade que o brigadeiro Jaime Silvério Marques estivesse envolvido no golpe liderado pelo general Kaúlza de Arriaga.»

21.   Tomou posse como presidente da República a 15 de maio de 1974. E empossou Adelino da Palma Carlos como primeiro-ministro no dia seguinte. Spínola demitiu-se a 30 de setembro de 1974, «face à anarquia que invadia as Forças Armadas», pois não podia aplicar medidas de exceção: terminar «com as atividades políticas do MFA» e impedir «as atividades conspiratórias do PC no seio das Forças Armadas, obrigando-o, igualmente, a abandonar a ditadura do proletariado no seu programa e a não impedir a institucionalização da democracia.»

22.   «O meu pensamento num governo militar de breves meses destinava-se a promover eleições democráticas rapidamente e a referendar uma nova política ultramarina. Não me bati por esta solução. O Programa do MFA manteve a Junta de Salvação Nacional, de carácter militar, e um governo provisório civil. Foi o programa que eu li aos portugueses e no qual acreditei. Esta solução acabou por se revelar desastrosa com a nomeação de Vasco Gonçalves para primeiro-ministro e a existência da Comissão Coordenadora do MFA.»

23.   O Partido Comunista não cumpriu as suas promessas, ao persistir no modelo soviético. « O PC sempre atuou na sombra…

24.   Apesar de na Junta, Rosa Coutinho concordar quase sempre com as decisões de Spínola, este acaba por reconhecer que ao ser nomeado para presidir à Junta Governativa de Angola, a atuação de Rosa Coutinho sofreu uma evolução completa, apoiando deliberadamente as forças marxistas e tomando decisões contra os portugueses residentes em Angola, que considerava inimigos. Spínola defende que «a sua atuação em Angola, junto das Forças Armadas Portuguesas, fomentando a sua rendição, enquadra-se, sem dúvida, no que eu considero um crime de alta traição à Pátria.»

25.   «Nunca pensei que o Vasco Gonçalves estivesse ligado ao PC e que tivesse tanta falta de senso (…) Quase louco.»

26.   A traição de Costa Gomes: «o comportamento de Costa Gomes no 28 de setembro tirou-me todas as ilusões (…) Até setembro, acreditei na lealdade de Costa Gomes (…) Mais tarde, ao refletir sobre os factos relacionados com a sua permanente conivência com a Comissão Coordenadora do MFA, sobre a sua identidade com os elementos esquerdistas, sobre a destruição dos apoios militares firmes, não posso deixar de lhe atribuir uma ação preparada e premeditada. (…) O seu desejo era que eu abandonasse Portugal logo após o 28 de setembro, revelando-me, assim, que pretendia atuar sem um peso de consciência a viver no país. (…) Posso apenas dizer que a sua convergência com os comunistas foi total no que concerne ao problema ultramarino.»

27.   «O 11 de Março inicial não foi um golpe planeado por amadores, mas antes um movimento patriótico a que tinham aderido inúmeros oficiais. (…) O Partido Comunista infiltrou-se habilmente no seio dos militares e conduziu o 11 de Março (…) Os objetivos do 11 de Março que estava programado – e que teria evitado a loucura coletivista que se seguiu – não foram, infelizmente, atingidos.»

28.   Maior sucesso político da vida: «Ter colaborado abertamente nos objetivos previstos no 25 de Abril que, em última análise, se resumiram à restituição da liberdade e da democracia ao povo português».

29.   Maior sucesso militar: «Ter participado como voluntário na Guerra do Ultramar, onde tive o privilégio de correr riscos ao lado dos nossos extraordinários soldados, lídimos representantes do ancestral patriotismo do povo português.»

5.8.16

O que os move...

Em 2005, o JL (6-19 julho) perguntava a Manuel Alegre: - Consideras-te um narciso ou não? Estás ou não no centro da tua obra? Ao que Alegre respondeu: «Eu acho que, de uma maneira ou de outra, todos os artistas estão no centro da sua obra.»

E se lermos um pouco mais da entrevista, ficamos a compreender que o escritor tem ideias claras sobre o assunto: « Toda a gente está sempre no centro. O que há é pessoas que não gostam de si próprias. Eu não desgosto de mim, mas não me considero um narciso. Agora quem passou por certas experiências, esteve isolado numa cela, esteve numa guerra onde se morria, viveu dez anos no exílio, numa grande solidão - é evidente que tem de falar de si próprio.»

Nesta defesa, Manuel Alegre parece querer dizer que não é narcisista, pois tem biografia a mais. Centrando-se no seu caso, cita mesmo Semprun: «Porque hei de estar a inventar personagens, quando eu próprio, com a vida que vivi, sou uma personagem muito mais rica do que qualquer outra que inventasse?»
Gosto do conceito biografia a mais, porque pressupõe que o narcisista é o que tem biografia a menos.

De facto, por estes dias (e por outros já passados), andam por aí certos rapazes ( e certas raparigas) que, talvez por terem biografia a menos, não resistem ao canto da sereia ou de certos mecenas... E valerá a pena recordar que a figura do mecenato, tão aplaudida socialmente, foi desenhada pelos mesmos rapazes que agora se empanturram e desfilam pelos estádios e outras arenas... 

Talvez Manuel Alegre tenha razão. Eu nunca o considerei um desses rapazes narcisistas, porque, ao entrar na Assembleia da República, já ia carregado de biografia...

4.8.16

Na vida

Na vida, uns divertem-se e outros amocham... não é que eu pense ter adquirido o hábito de me dobrar para que outros me saltem para cima, mas a verdade é que, em termos de retrospetiva, verifico que tal já me aconteceu demasiadas vezes... E hoje é um desses dias, com a particularidade de ser o meu primeiro dia de férias...
Aqui estou eu, ansioso, à espera, das 14 às 20 horas, que me venham trazer um utensílio doméstico, quando me comprometera, entre as 18:30 e as 20 horas, a fazer o transporte de um animal doméstico no casco da capital...
As horas não foram por mim determinadas e quem o fez não quer saber de coincidências. Limita-se a estabelecer que «no período selecionado não se deve ausentar do local de entrega. Se houver necessidade de se ausentar deverá comunicar a sua indisponibilidade com 24h de antecedência. Caso não seja feita a referida comunicação, deverá ser paga uma retribuição de 15 euros.» WORTEN
Este é o exemplo do dia de hoje depurado de outros factos que não mencionarei, mas que só o agravam.
De qualquer modo, se conseguir ultrapassar estas dificuldades, talvez amanhã amoche um pouco menos... Só que para que tal aconteça, necessito que o telefone toque rapidamente. Sim, porque os transportadores prometem avisar com 30 minutos de antecedência...
(...)
Às 18h23, recebi uma mensagem da Worten que informava «que a sua entrega / recolha esta prevista ser realizada dentro de 30 minutos.» (sic) O que veio a acontecer... e o resto seguiu a ordem prevista, com a compreensão dos intervenientes...

3.8.16

Há quem não perca o "andanças"...

Há quem não perca o "andanças"...  Desta vez, um parque de estacionamento virou braseiro. Felizmente, não há perdas humanas... centenas de carros arderam..
Neste "andanças", volto a estar presente, embora indiretamente, e estou sem saber se o carro* das amigas da Susana terá ardido...
O dia de hoje faz-me lembrar o tempo em que o "andanças" decorria no concelho de S. Pedro do Sul. Sempre que lá me deslocava, temia que uma coisas destas pudesse acontecer...
Bem sei das minhas "andanças" que em viagem, no campo ou na praia, o importante é estacionar e que raramente pensamos na segurança de pessoas e de veículos...

* Não ardeu! Il n'était pas écrit lá-haut dans le grand rouleau! (Diderot)

2.8.16

Entre o fio mental e o fio dental

Apesar de haver quem diga "que nunca é tarde", a verdade é que eu já não tenho idade para certas coisas, como, por exemplo, correr a maratona ou escrever versos...
E porquê? Porque, numa certa óptica, teria de carregar com toda a tradição daquela famosa corrida ou do ofício de poetar.
Vem isto a propósito de uma crítica literária de Paula Morão "Ana Luísa Amaral - Manto mais brando do pensar", publicada no JL de 19 de Julho de 2005, em que, a linhas tantas, afirma:

Assim, a literatura «fala» numa des-coincidência entre a tradição e o eu que agora diz, e a quem, por ser outro o tempo, «Não interessa onde / estou», como o poema vai repetindo em eco, enquanto busca o «pequeno dicionário/que soubesse de paisagens/ de dentro», um mapa de palavras que emanasse da tradição para traçar o fio mental com que nova Ariadne, o eu se orienta neste tempo poético conforme ao que foi «inventado/há mais de três mil anos», mas em que «nada é já como soía», como escreveu Sá de Miranda. Resta, pois, ao poeta de hoje o recomeço a partir desse húmus de versos e de vozes ecoando no sopro do «vento», a que Zéfiro de Boticelli dá tão bela expressão desde a capa do volume. (A Génese do Amor)

Só a transcrição deixa-me exausto. Agora imaginem que, disciplinado na escola de Mário Moniz Pereira, me atirava a uma destas disciplinas, e, em vez da pista ou do piano, me decidia, qual Orpheu, a recuar três mil anos e a embebedar-me do «húmus de versos e de vozes ecoando no sopro do vento...
Este fio mental que a crítica procura a cada momento restabelecer, e que valoriza como cânone, mata qualquer vontade de iniciar a corrida, mesmo que os louros se afigurem longínquos ou até inúteis...
Por uma questão de exercício, vou interromper este registo e continuar a leitura, pois não quero desistir da caminhada para que fui convidado pela Paula Morão...

1.8.16

Mário Moniz Pereira acreditava nas capacidades do indivíduo

Faleceu ontem Mário Moniz Pereira. Tinha 95 anos. 
Para mim, Moniz Pereira era um daqueles homens cuja existência me encoraja a vencer os obstáculos.
Ele acreditava nas capacidades do indivíduo e sabia que, através do trabalho, era possível rendibilizá-las ao máximo. Por isso, os atletas que orientou e treinou atingiram o topo e retiraram Portugal do anonimato.
Através da persistência e do trabalho, é possível ir muito longe. É esse espírito que falta a muitos de nós, mais velhos ou mais novos. Acomodamo-nos demasiado cedo.
Moniz Pereira soube merecer os 95 anos que viveu.
Moniz Pereira sempre foi, para mim, uma fonte de emoções... positivas!