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27.12.11

Os dias e os motejos

O filme Os Dias de José Saramago e Pilar del Rio, de Miguel Gonçalves Mendes, que acabo de visionar, apesar do voluntarismo e da devoção dos protagonistas, não esconde a violência que o negócio da literatura impôs ao escritor, ao obrigá-lo a viajar permanentemente para promover as suas obras.

Ironicamente, o Saramago, que ainda sonhava ir à Índia, acaba por desejar ser árvore bem enraizada numa (im)possível reencarnação, para, à semelhança do Velho Restelo, combater a vã cobiça, provavelmente de cepa bem castelhana…

O escritor, amorosamente subjugado pela feminista Pilar, prefere convencer-nos que renasceu aos 60 anos para a literatura e, sobretudo, para o mercado do livro e das plateias mais ou menos histéricas que raramente mostram ter lido a obra do ídolo.

Dos dias, ficam-me alguns motejos: a) Como é que se pode escrever um prefácio sobre uma instalação se não se vê a instalação? b) Sem homem, não há Deus! c) Eu não nasci para ser escritor! d) Ver, ouvir e não calar! e) Os entrevistadores não acrescentam nada ao conhecimento! f) Os néscios são os outros…

Em síntese, apesar da vida encenada, o filme não consegue esconder a dor que minava o rebelde que, no íntimo, muito gostaria de ser tomado como santo!

6.10.10

Só hoje…

Andava há dias na expectativa de chegar à ‘República’ revisitada pelo José Rodrigues Miguéis, n’A Escola do Paraíso. Cheguei atrasado por culpa da Portugal Telecom que, entretanto, me tem obrigado a desdobrar-me em diligências por causa de uma, aparente, simples migração da Sapo adsl para a Sapo fibra. Nada é, de facto, simples neste moribundo Portugal republicano, onde tudo é feito para emular a 1ª República.

Ontem, desconcertado quanto às celebrações do centenário, ainda visitei o Museu Bordalo Pinheiro, onde descobri um caricaturista digno de ser louvado: SILVA MONTEIRO. Este mostra-nos que, afinal, os ideais foram substituídos pelos interesses de grupos mais ou menos ávidos de se banquetearem à mesa do orçamento. Aqueles republicanos, à excepção de alguns ilustres suicidas, não enganavam ninguém! Ora, ontem, o que eu ouvi foi, sobretudo, a legitimação de actos que custaram a vida a muitos milhares de portugueses que se viram envolvidos em causas perdidas.

(E continuamos a correr atrás de desígnios que nem sequer conseguimos enunciar enquanto outros mamam à tripa forra. Coitados!)

Entretanto, dando a palavra a José Rodrigues Miguéis, um dos escritores que melhor conheceu e retratou a acção republicana, transcrevo um excerto da obra já mencionada:  

«O prédio embandeirou, mas só do lado esquerdo, numa espécie de hemiplegia republicana. Havia sempre um resto de serpentinas do Carnaval passado, e foi uma festa. Começavam-se a vender nas ruas bandeiras, alfinetes, postais e globos de vidro colorido com cenas  e retratos dos homens do regime. Era uma Vida Nova que raiava. Dir-se-ia que estava tudo preparado para a celebração! Passavam bandos aos vivas, caminho da Baixa, da Rotunda, do Tejo, cantando a Portuguesa. Afluíam de todos os lados os heróis da última hora: as barricadas, até ali quase vazias, transbordavam agora de combatentes, eriçadas de armas que não tinham chegado a dar fogo. Tiravam-se grupos memoráveis, para depois se dizer “Eu também Lá estive!” A República estava de antemão solidamente implantada nas almas e nas ruas. Lisboa transfigurada!»