30.6.22

A humildade por estes dias

O estranho é que a humildade parece ser filha da prepotência, mas não, é filha da conveniència. Andam todos a fingir ser o que não são.
Todos procuram a boca de cena, todos procuram o poder, porém não o sabem exercer. Falam em nome do interesse nacional que, no essencial, se reduz ao capital.
A história é antiga, e o que não tem remédio, remediado está. Não se fala mais disso.

Deixem os corvos trabalhar!

29.6.22

UBI SUNT?


UBI SUNT?

Na Idade Média, os 'ubi sunt?' veiculavam o desprezo do mundo - o que em Latim se chama contemptus mundi.Cristalizados em torno do imaginário da morte, sentiam-na como decomposição, volta ao pó de que fora feita a fragilidade humana. Negativizando o corpo do homem - e por arrastamento tudo o que o homem tivesse construído de material -, os 'Ubi sunt?' identificavam o humano como indigno, conspurcado e conspurcante. Maria Lúcia Lepecki, DN 8-11-1987

Em princípio, ninguém aspira regressar à Idade Média. No entanto, pelo que observamos, parece que vamos recuando a tempos que, ainda há poucos anos, ninguém queria reviver: a guerra, a corrida aos armamentos, a repressão das mulheres, a abdicação da defesa dos direitos humanos, a desvalorização do trabalho...
Por um lado, o princípio da morte que aniquila cegamente em nome de visões do mundo arcaicas; por outro lado, o princípio do prazer que transforma a 'presa' em objeto de superação narcísica.
Como facilmente se percebe, o fim da humanidade está próximo, mas quem quer saber? E vai sobrar muito carvão...

25.6.22

O que não mudou nem muda

Excertos da resposta dada por Luís de Sttau Monteiro à Capital / Vinte anos, publicada no dia 23 de fevereiro de 1988.

«Nem sequer a aparência das coisas se modificou radicalmente com a conquista do poder pela classe média. Esta, para quem a 'abertura' do 25 de abril consistiu apenas na abertura das portas dos conselhos de administraçao, dos conselhos de gerência, dos conselhos de gestão e, sabe-se lá, de quantas comissões existem para aí, não teve, não tem e nunca poderá ter outro modelo que não seja o que herdou dos seus antecessores. Daí, o tentar assemelhar-se a eles  em tudo: no discurso político, nos locais que frequenta, no vestuário, nos automóveis em que anda, no que come e bebe e na educação que dá aos filhos...»

«Criticávamos as antigas despesas supérfluas, mas nunca imaginámos que as novas atingissem os seus actuais montantes; ríamo-nos das viagens dos políticos do passado, as nunca imaginávamos que tanta gente andasse por esse mundo de Cristo à nossa custa como a que anda agora; os 'tachos' eram motivo para anedotas mas se quisessemos inventar anedotas acerca dos tachos de hoje, as vinte e quatro horas do dia não chegariam para o fazermos... Se nos lembrarmos do que nos custam os nossos 'representantes' nas organizações europeias, teremos de reconhecer que tenho razão ao dizer que, no nosso quotidiano, nem sequer as aparências mudaram, porque vivemos, como sempre, em dois países: um, riquíssimo, com um tesouro inesgotável, em que vivem os nossos governantes, e outro, pobre e triste, em que vivemos nós.»

«Sempre que se fala, à minha frente, de uma 'política cultural, calo-me, porque não sei de que animal se trata.»

De 1988 para cá, o que é que mudou? Aumentaram os subsídios - a subsidiodependência é um cancro alimentado pelos sucessivos governos... Uma ínfima parte da classe média enriqueceu desmesuradamente, mas grande parte da classe média empobrece todos os dias... Culturalmente, a política é errática... até porque a base, que é o sistema educativo, vive cativa da néscia vaidade.

24.6.22

Provavelmente

... nunca chegarei a perceber por que motivo o ser humano não resiste à tentação de ignorar o vizinho para, quando a situação se proporciona, o invectivar ou mesmo o agredir.
... nunca chegarei a perceber por que motivo as televisões desrespeitam permanentemente as vítimas da maldade humana, ampliando bestialmente comportamentos indignos, dando-lhes um estatuto de exemplaridade monstruosa.
... nunca chegarei a perceber o papel das autoridades de justiça e de polícia, que andam sempre atrasadas, apesar de se confessarem tristes e revoltadas...
... nunca chegarei a perceber por que motivo o filho de um antifascista, perseguido durante o Estado Novo, vem agora defender que em Portugal o fascismo era provinciano. Ter-lhe-á faltado, certamente, o cosmopolitismo de Mussolini ou de Hitler!
... nunca chegarei a compreender por que motivo o Supremo Tribunal dos Estados Unidos reverteu esta sexta-feira uma decisão sobre o direito ao aborto, que dita uma mudança na lei e deixará de proteger constitucionalmente uma mulher que faça um aborto.
... e nunca chegarei a perceber por que motivo as repetidas declarações de amizade viajam tão sós, deixando os ucranianos à mercê do novo Czar...

20.6.22

O beijoqueiro

Não podendo reivindicar o estatuto de self-made man, vê na selfie a expressão entercenadora da sua afirmação.
Saudoso da Pátria, elege o Povo de antanho como lema...
Mimado desde as palhinhas, decidiu recriar a Mátria no ventre úbero que cruzou no arraial... 
Tudo nele é impulsivo, apesar dos detratores o retratarem como calculista.

Entretanto, já falta pouco para o São João... vamos ver se veste a pele do cordeirinho...

16.6.22

O fogo assassino

Se Ele se perde na Cruz,
vejo cinza.
O madeiro sucumbe à ânsia esfarelada
das notas desafinadas
num país ocupado.
Desafiado, a Cruz carrega-o,
os crentes escavam 
a cinza sob o fogo assassino.

(4 reis magos estão de visita a Kiev.)

ERRO

O utilizador escolheu deixar de utilizar a plataforma: A acção tentada não é permitida, uma vez que o utilizador escolheu deixar de utilizar a plataforma do Facebook.

Na verdade, não escolhi nada... De repente, deixei de poder reencaminhar para o Facebook...
Provavelmente, será melhor assim - aceitemos o que a natureza nos oferece, mesma que esta seja humana ou algoritmica... O problema é que há sempre alguém nos bastidores.

15.6.22

Fora do tempo e do espaço

FORA DO TEMPO, NÃO HÁ VIDA. NÃO HÁ VIDA, FORA DO ESPAÇO. 

Já estou a ver o clamor da massa: Mentira!
Infelizmente, as massas só podem expandir-se no tempo e no espaço até se desintegrarem ou verem o território, que foram conquistando, arrasado.

O medo do crescimento da massa é frequentemente um factor poderoso para que alguém a queira estourar de fora. Alguém a quem falta tempo para a ver estourar por dentro.
Sim, porque, apesar da direção da massa lhe apontar o infinito, o tempo encarrega-se de lhe abrir brechas irremediáveis...
E neste caso, as balizas não são o nascimento e a morte...
Mentira, dirão! Passem bem enquanto podem... de preferência, acordados.

13.6.22

No dia de Santo António

No dia de Santo António

No dia de Santo António

Todos riem sem razão.

Em São João e São Pedro

Como é que todos rirão?

 Fernando Pessoa

No dia do Santo e do Poeta, relembro a 'visão' de Karl Kraus, Os últimos dias da Humanidade:

«Um campo de batalha. Crateras e covas. caminhos através do arame farpado que ainda se mantém. Chegam automóveis de luxo. Os turistas dividem-se em grupos, tiram fotografias uns aos outros em posições heróicas, imitam salvas de tiros, riem e lançam gritos. Um deles encontrou um crànio, espeta-o na ponta da bengala e passeia-o com uma expressão de triunfo. Um homem enlutado intervém, apossa-se do achado e enterra o crânio.» (Gemidos dos adormecidos. A visão desaparece.)

10.6.22

Peço desculpa a Sua Excelência

Tomando sempre novas qualidades

Não sei se, neste 10 de Junho, a pena camoniana foi exaltada mas, pelo que vi na televisão, não faltaram nem as armas nem os barões... tudo justificado pela nossa participação nos campos de Marte. 
O Presidente Marcelo reiterou o contributo do povo  desde os montes hermínios aos dias do futuro apocalipse. 
Para Sua Excelência o povo é o mesmo de sempre, o que me surpreende. 
Quando olho à minha volta, vejo cada vez mais indianos, chineses, paquistaneses, bengalis, nepaleses, brasileiros, caboverdeanos, guineenses, angolanos, moçambicanos, magrebinos, ingleses, franceses, ucranianos, moldavos...
 
Parece-me que Sua Excelência tem uma visão redutora e estática do seu tão amado povo. E é pena!

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
       Camões

Parafraseando Pessoa no dia Camões, Sua Excelência quis dizer que 'a sua pátria é o povo português' de Outrora... Quanto ao da agora, o tempo o dirá.

8.6.22

As pessoas podem ser...

 

Quinta pedagógica dos Olivais
As pessoas podem ser amorosas, antipáticas, palavrosas, taciturnas, inocentes, nocivas, cruéis... Se dissessemos que as pessoas são, isso seria uma aberração, pois não teriam capacidade de adaptação, melhor dito, não teriam capacidade de distanciamento, de avaliação...

Mas, infelizmente, há pessoas que são uma aberração, e não assim tão poucas como nos agrada pensar... Não nasceram monstros, mas aos poucos foram perdendo o sentido da humanidade. 

Isto é o que me é dado pensar quando oiço as afirmações do senhor Lavrov, pessoa nascida em 1950, e ministro das Relações Exteriores da Rússia, desde 2004.

Tudo aconteceu quando um jornalista da televisão pública da Ucrânia questionou Sergei Lavrov sobre as alegadas acusações de "roubo de cereais" por parte da Rússia."Daquilo que foi roubado à Ucrânia, além dos cereais, o que é que a Rússia já conseguiu vender", perguntou o jornalista ucraniano ao ministro russo, que não hesitou em responder ao devolver a acusação. "Vocês, ucranianos, estão sempre tão preocupados com aquilo que podem roubar que pensam que fazem todos o mesmo."

4.6.22

Está tudo bem!


Lá longe, os mísseis destroem tudo o que tocam e como recordação deixam crateras, onde os mortos podem ser definitivamente esquecidos...
Aqui perto, há pão com sardinhas e vinho a rodos a pretexto dos santos populares. Coitados dos santos, que nada fizeram para alimentar tal regabofe! 
Viva a festa! O que é necessário é desbastar a floresta humana, com ou sem covid. 
Por dentro, o enigma mantém-se imprescrutável, não deixando advinhar se a paz é mesma necessária... Assim, está tudo bem!
Cada vez mais distante, à espera do intangível...

3.6.22

A doença de Putin

 Ainda não tinha pensado nisso, mas a Rússia de Putin talvez não seja muito diferente do Portugal de D. Sebastião: pestes várias, oligarquias predadoras, dissolutas e despóticas, miséria dos povos e, sobretudo, alienação da juventude, objeto  do fascínio pelo decadentismo ocidental ou, em alternativa, vítima de catequização patriótica... 
Incapaz de resolver a questão interna, Putin prefere, tal como D. Sebastião ao  intervir militarmente em Marrocos, a intervenção nos territórios vizinhos, de modo a que o História o consagre como um homem providencial...
Um destas manhãs de nevoeiro, Putim desaprece, deixando atrás de si uma auréola de audácia à custa da destruição de milhares de vidas e do empobrecimento de milhões de indivíduos...
De qualquer modo, o/a esferovite já garantiu um lugar na (re)construção.
( O ESFEROVITE, poliestireno expandido, airpop ou EPS é um plástico celular e rígido que se pode apresentar numa multitude de formas e aplicações. O Esferovite é uma espuma de poliestireno moldada, constituída por um aglomerado de grânulos, e é o material utilizado para placas para isolamento na construção civil, para embalagens e para muito mais aplicações. Os grânulos podem também utilizar-se soltos. )

1.6.22

O dia 32 de maio

 

Portela, Loures, 1-6-2022

Apesar do mal absoluto, há sempre um Palhaço que procura divertir as crianças, mesmo que isso signifique convencê-las que hoje é o dia 32 de maio...
Felizmente que não lhe passou pela cabeça apelar a qualquer tipo de patriotismo que as tornasse diferentes umas das outras...
Um Palhaço, que se preze, procura eliminar fronteiras e não impô-las, como certamente aconteceu hoje, em muitos outros lugares, onde falsos palhaços se apresentaram como 'senhores' de corpos e almas...