António Jacinto

 (Luanda, 28/9/1924 – Lisboa, 23 /6/1991)

 Por vezes utilizou o pseudónimo Orlando Távora como contista.

Por razões políticas esteve preso entre 1960 e 1972. Militante do MPLA, foi co-fundador da União de Escritores Angolanos, membro do Movimento de Novos Intelectuais de Angola e participou ativamente na vida política e cultural angolana. Foi empregado de escritório e técnico de contabilidade, Ministro da Educação de Angola e Secretário de Estado da Cultura.

Colaborou com produções suas em diversas publicações nomeadamente Jornal de Angola, Notícias do Bloqueio, Itinerário, Império e Brado Africano e foi membro da revista Mensagem.

Publicou em 1961 uma recolha de poemas, em edição da Casa de Estudantes do Império, estando alguns dos seus trabalhos incluídos na antologia Poesia Angolana de Revolta, publicada em Lisboa, em 1975. Em Janeiro de 1985, obteve o Prémio Nacional de Literatura de Angola, com o livro Sobreviver em Tarrafal de Santiago.

Monangamba

A.J.: Monangamba foi construído na serração de madeiras onde eu trabalhava. Em frente da serração passava a linha de caminho-de-ferro. O pessoal estava a descarregar madeira. Eu aí fiz um recuo para o mato, e lembrei-me das lendas dos kifumbes, da convicção de que quem tem barriga grande tem muito dinheiro, que o dinheiro é feito pelos pretos, etc. Lembrei-me do estribilho muito grande do Monangambééé e não sei se o escrevi lá mesmo no escritório, ou se o construí e, quando cheguei a casa, o escrevi… mas foi nessas circunstâncias, foi no trabalho mesmo…

Michel Laban, in Encontros com Escritores, vol. I

Naquela roça grande não tem chuva

é o suor do meu rosto que rega as plantações:

naquela roça grande tem café maduro

e aquele vermelho-cereja

são gotas do meu sangue feitas seiva.

O café vai ser torrado

pisado, torturado

vai ficar negro, da cor do contratado.

Negro da cor do contratado.

Perguntem às aves que cantam

aos regatos de alegre serpentear

e ao vento forte do sertão:

Quem se levanta cedo? Quem vai à tonga?

Quem traz pela estrada longa

a tipoia ou o cacho de desdém’

Quem capina e em paga recebe desdém

            fuba podre, peixe podre

            panos ruins, cinquenta angolares

            “porrada se refilares”?

Quem?

 Quem faz o milho crescer

e os laranjais florescer

- Quem?

Quem dá dinheiro para o patrão comprar

máquinas, carros, senhoras

               E cabeças de pretos para os motores?

Quem faz o branco prosperar

ter barriga grande – ter dinheiro?

 - Quem?

E as aves que cantam,

os regatos de alegre serpentear

e o vento forte do sertão

Responderão:

            - “Monangambééé…”

Ah! Deixem-me ao menos subir às palmeiras

Deixem-me beber maruvo, maruvo

e esquecer diluído as minhas bebedeiras

            - “Monangambééé…”

 

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