A -Ensaio de José Oliveira Barata [Cadernos de Literatura nº 10, 1981]
· criação de um texto dramático
· transposição para um espaço onde alguém se mostra a outro alguém que aí vai para ver
· interpretação e enriquecimento do guião dramático escolhido
· finalmente, receber o aplauso, o apupo ou a indiferença de um público.
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A leitura da obra dramática não pode dispensar as condições da sua realização teatral, cénica, espetacular.
A leitura do teatro é um ato específico e irredutível, porque:
· Todo o código sígnico é pensado para ser apresentado ao público, simultaneamente. O acto teatral é vivido em comunidade. A vida de uma peça joga-se no palco.
· O dramaturgo sabe manejar as palavras, mas não pode ignorar as imposições do palco: ritmo das falas, fluência do diálogo, extensão dos actos, linha evolutiva do enredo... E que tudo terá que funcionar dentro das apertadas e exigentes condicionantes de espaço e tempo.
· O dramaturgo sabe que o seu destinatário é um grupo social, visto que o teatro é, desde sempre, uma prática social.
· Entre o texto dramático e a sua apresentação ao público, muitos são os intervenientes que agem sobre o guião que lhes é proposto. É essa copresença de vários sistemas de significação que sublinha, por acumulação, o que as palavras, por si só, não podem explicar [música, pintura, escultura]. Para além do dramaturgista, há que não esquecer o cenógrafo (o que escreve a cena) e, em particular, o encenador, cujo objetivo é “penetrar até ao mais profundo do pensamento do autor e tornar sensível da forma mais viva o seu sonho ao público.”[1]
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· Uma estrutura bem definida: um texto principal acompanhado de um texto secundário, isto é, um texto para ser dito pelos atores, interrompido aqui e ali por indicações cénicas ou didascálias.
· A inter-relação dos contextos: só considerando esta relação se poderá compreender a evolução simultânea de várias personagens no mesmo universo, na medida em que cada personagem - apesar dos traços específicos que a individualizam - participa de um discurso comum, justificando, deste modo, o diálogo.
· Simultaneidade da representação e realidade representada: na tradicional forma dramática, a convenção do jogo cénico exige a cumplicidade de quem assiste, isto é, exige a ter que assistir ao que se passa em cena no preciso momento em que se desenrola a ação nessa mesma cena; ou seja: não reconstitui um acontecimento passado, mas vive-o presencialmente...
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· Compreender o sistema de forças que se digladiam no interior do texto dramático:
1. o lugar
2. o tempo da ação
3. o tipo de teatralidade
4. as condições necessárias que condicionam a correta emissão da palavra teatral
· Leitura das falas das personagens
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Cortes de Júpiter, 4 de agosto de 1521. Reinado de D. Manuel I, que falecerá nesse mesmo ano. Comédia
Dona Beatriz, casada por procuração com o duque Carlos II de Sabóia, vai embarcar no dia seguinte.
Personagens: Providência (em figura de princesa); Júpiter; 4 ventos; Mar; Sol; Lua (senhora do mar); Vénus (rainha da música)
Vilancete: No los
alceis desdeñosos / sino ledos e amorosos
Os deuses dos elementos reconhecem a superioridade do Deus
dos cristãos…
Os homens tornam-se em peixes para melhor acompanhar a
partida de Beatriz:
Cónegos (toninhas)
Vereadores (rodovalhos)
Frades (ruivos /atuns)
Correctores (robalos)
Juízes (peixes voadores)
Ouvidores (peixes cavalos)
Estudantes (barbos de Monção/ rãs cantantes)
Os da moeda (garoupas de Guiné)
… (moreias)
… (pescados)
As regateiras (cardume de sardinhas)
Bacharéis (tubarões)
Almotacés (cações)
Gil Vaz da Cunha (baleia)
Dona Isabel (raia)
Os músicos (carapaus, enxarrocos, bacalhaus)
Pero do Porto (congro): yo
me soy Pero Safio
As aves
O príncipe João,
futuro D. João III (n.1502) – Alexandre segundo, sem grifos
Garcia de Resende (peixe tamboril)
O infante Dom Luís
(sobre cirnes alvos)
Juan de Saldaña (arenque d’Alemanha)
O infante Afonso,
o cardeal (sobre homens marinhos)
O infante Fernando
(sobre sereias, dentro de um castelo voador)
Comendador Diogo Fernandes (disfarçado de um peixe que ainda
não há)
O Infante D. Anrique
(em cama d’arminhos brincando com dous anjinhos)
Tristão da Cunha (congro da Pederneira)
A infanta dona Isabel
(estrela clara da aurora)
Estribeiro mor (peixe mu)
A infanta dona Maria
(sobre querubins)
Joana do Taco (grã centola)
(…)
O cortejo vai durar até ao estreito de Gibraltar. Entrados
no Mediterrâneo…. Entra em cena MARTE, pois a costa é moura…. Acompanhado pelos
três signos: câncer, leo e capricórneo.
Elogio heróico dos cavaleiros e do reino lusitano…. Ver
semelhanças com Os Lusíadas, canto I (fala de Júpiter)
A moura TAIS (que está no Inferno) trará 3 presentes rituais: um anel; um didal de condão; um treçado
A 15 de Agosto de 1838, estreia, no Teatro da Rua dos
Condes, Um Auto de Gil Vicente, escrito, ensaiado e produzido por Almeida
Garrett (o 1º acto público do romantismo português).
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Texto dramático, Steen Jansen, Universidade de Copenhaga
O texto é determinado pela noção de “dramaticidade”. A obra pela noção de coerência. A análise do texto distingue 2 planos: um plano textual e um plano cénico.
O plano textual poderá sempre ser dividido em partes, ou unidades sucessivas, que pertencem a uma de duas categorias: réplica ou “régie”
O plano cénico poderá sempre ser dividido em elementos, ou unidades não sucessivas, que pertencem a uma de 2 categorias: personagem ou décor (cenário)
Qualquer réplica é precedida por uma indicação cénica ( ex: informação sobre a personagem que fala). Todavia, a indicação cénica exige sempre uma réplica.
Entre a personagem e o cenário, nenhuma personagem pode ser representada fora de um cenário, mas o cenário pode perfeitamente em certos locais estar vazio de personagens.
Planos distintos: textual e cénico.
Entre a réplica e o personagem há uma relação de solidariedade. A presença de uma destas categorias implica presença da outra. Não há personagens mudas. O que não fala será interpretado como um elemento do cenário. Inversamente, o objecto que fala ( um aparelho de rádio, por ex.) será uma personagem.
Entre a indicação cénica e o cenário há uma relação de selecção, se entendermos o lugar (eventualmente o lugar + o momento) que o cenário representa em determinado momento do texto. Este lugar deve necessariamente ser indicado por uma indicação cénica; porém nem todas as indicações cénicas se referem obrigatoriamente no lugar.
De contrário, se entendermos por elementos do cenário os objectos, que o compõem, haverá sobretudo uma relação de combinação…
A situação
Define-se como o resultado duma divisão do plano textual em partes que correspondem a grupos acabados do plano cénico. Na análise do texto concreto instaura-se o limite entre 2 situações no ponto em que uma personagem entra ou sai ou ainda quando há mudança de lugar no cenário.
Metodologia
1. Qualquer descrição começa por dividir o texto em situações.
2. Inventário de cada uma das categorias, incluindo a das situações, e a frequência dos seus elementos. Número e extensão: réplicas / didascálias / personagens / lugares
Teatro no século XVI
Gil Vicente, Romagem dos Agravados, 1533
Sá de Miranda, Os estrangeiros
António Ferreira, Castro
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Henrique da Mota (poeta do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende)
Neill Miller, investigador norte-americano, As origens do Teatro Ibérico
Eugénio de Asensio descobriu um dos mais importantes documentos «dramáticos», passe o termo, de tal juiz dos órfãos no tempo de D. João III, nada mais nada menos que um códice da Biblioteca de Évora intitulada Carta sobre a Morte de Dona Inês de Castro, que data de 1528. Este texto tem forma narrativa e poética.
Sobre a Castro de António Ferreira, há quem conteste a sua originalidade, uma vez que se lhe opõe, como antecedendo-a, a obra Nise Lacrimosa, de um certo frei Jerónimo Bermudez, dominicano natural da Galiza…
A arte dramática não é apenas a obra de autores, de actores, de encenadores, é trabalho colectivo.
«A verdade é que nós ficámos sempre à margem daquilo que entretanto virá a ser a arte dramática propriamente dita – em Inglaterra, com o teatro isabelino, particularmente com Shakespeare, em Espanha, com o teatro do século de oiro, particularmente com Caldérón e Lope de Vega.» … Auto da Índia como excepção.
«E, grande erro nosso em matéria de teatro, em vez de seguirmos a estrada da écloga, poética convertida em «diálogo dramático», à maneira dos mesmos «diálogos dramáticos» do Henrique da Mota do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, voltamo-nos para o lado do teatro em prosa. Este desvio, numa tradição literária de essência lírica, constitui, quanto a nós, o óbice maior a uma fecunda actividade num terreno que só nos traria apreciáveis vantagens, caso o pisássemos como poetas (versejadores), não como prosadores.»
«Alguns dos continuadores de Henrique da Mota e de Gil vicente – os dramaturgos ou comediógrafos dos séculos XVII e XVIII – salvo raras exceções, ainda vão na corrente do teatro em verso, e se o não praticam com grande mestria um Chiado, um António José da Silva, um Garção, o certo é que não abandonam o verso, são dramaturgos ou comediógrafos com um pé na métrica, quanto mais não seja essa métrica satírica que já era matéria-prima dos «diálogos dramáticos» do próprio Henrique da Mota que figuram no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende. Aliás, que são senão poemas dialogados, satíricos ou líricos, os autos de Gil Vicente? E precisamente com a implantação de um teatro dado à prosa – o teatro de Garrett, que goza de fama «restaurador» do teatro português – Gil Vicente seria o seu «fundador» não «inventor», como acentua outro erudito estrangeiro empenhado no estudo das origens do nosso teatro – I.S.Révah -, quando a verdade é que nem um nem o outro «fundaram» quanto mais «inventaram», o teatro português.»
Para J.G. Simões, os problemas são de dois tipos: a) os nossos autores dramáticos podem considerar-se responsáveis do malogro da nossa literatura teatral, uma vez que trocaram o verso pela prosa; b)os nossos actores dramáticos são incapazes de comunicar à elocução dos seus papéis aquele boleio de frase que integra a língua em que foram escritos…
Neste artigo, JGS exalta as virtudes da peça Pedro, o Cru, de António Patrício.
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Inês e Pedro na literatura
João Aguiar, Inês de Portugal
Margarida Pinto Rebelo, Minha Querida Inês
Fernão Lopes, Garcia de Resende, Camões
Contos Teorema (1963) de Herberto Hélder
D. Pedro e Inês de Castro, 2004, de Mário Cláudio
Adivinhas de Pedro e Inês, 1983, de Agustina Bessa-Luís
Inês de Castro na História e no Teatro
A morte de Inês (…) não passou de um ato meramente político. Obedeceu ao dilema que se põe entre a razão de estado e as paixões humanas. «Que morra por salvação do povo», reclama Diogo Lopes Pacheco perante o rei, hesitante… (António Ferreira, A Castro)
- representação em agosto de 1935, espectáculo realizado por Amélia Rey Colaço e Robles Monteiro, ao ar livre no adro da velha abadia cistercense, Alcobaça. 5000 espectadores idos de Lisboa… Palmira Bastos recitou, com a voz densa de emoção, os lindos versos que Afonso Lopes Vieira compôs para o efeito. O coro das Moças de Coimbra, ora comentador ora personagem integrada na ação da peça, entoou numa cadência patética as estrofes de Camões que serviram de comentário ao longo da tragédia «Estavas linda Inês posta em sossego…»
A acompanhar a representação uma grande orquestra dirigida pela batuta magistral de René Bohet que fez ouvir a partitura inspirada de Ruy Coelho que serviu de comentário musical à representação.
Como epílogo da tragédia improvisou-se uma visão cinematográfica do enterro de Inês…
A companhia já representara a peça de Ferreira ao ar livre, em 1934, em casa de Vicente Arnoso, num terraço aberto sobre a paisagem bucólica da Serra da Estrela
Em 1983, sobreviviam apenas Amélia e Raul de Carvalho, que interpretaram os dois protagonistas; Ruy Coelho, que escreveu a música de cena, e o eng. Branco Cabral.
- representação em 1983 pela Comuna, numa encenação de João Mota.
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