28.3.08

Pepetela procura um novo público...

Para quem já escreveu uma dissertação sobre a obra de Pepetela e, em particular, sobre o romance YAKA (1985), a leitura de "O Terrorista de Berkeley, Califórnia" (2007) deixa uma sensação de vazio, diria mesmo de nulidade.

A começar pelo título, o "terrorista...", termo maldito para o gerrilheiro revolucionário que combatia o fascismo colonialista e o capitalismo expansionista. Agora, o "terrorista" não passa de um "cérebro de formação matemática e informática" que resolveu brincar com o decrépito sistema de informações americano, simulando, através da troca de e-mails, a preparação de atentados capazes de rachar a Califórnia ao meio.

A equipa de Steve Watson, o chefe do grupo especial de combate ao terrorismo para a região de S. Francisco, enceta uma minuciosa caça à perigosa rede terrorista, revelando ao longo da novela muitos dos estereótipos que, actualmente, aterrorizam o americano médio, protestante... e branco.

Larry, o terrorista de Berkeley, "jaz sobre o computador, como a tentar protegê-lo, doze balas nas costas" ...

Por esta novela, ligeira  na abordagem do tema, perpassa alguma da ironia que caracteriza a obra de Pepetela e, sobretudo, um fino anti-americanismo. De Angola, apenas raros vestígios lexicais: muata; mujimbo; e algumas construções sintácticas com cheiro a Brasil...

De qualquer modo, o Autor parece procurar um novo público mais afastado do debate político e mais próximo das novas tecnologias. Um público, para quem a leitura é, sobretudo, um acto lúdico...

18.3.08

Ovelha dócil sem pastor...

Ovelha dócil, sento-me, aqui, em frente desta porta, à espera do veredicto. Ainda ninguém me chamou, mas o hábito condiciona-me. Do outro lado do corredor, também há luz, o que indicia presença humana. No entanto, espero não ser chamado a atravessar o corredor. A memória fustiga-me por causa de um diagnóstico adiado.

As portas são rigorosamente iguais e simétricas, mas as possibilidades são distintas.

(pausa) Afinal, a porta deste lado do corredor traiu-me. Acaba de sair uma fisionomia que não corresponde à imagem que retive da anterior visita. Mas espero estar enganado: talvez aquele rosto corresponda ao de um paciente tranquilo, ciente de que a Quaresma está chegar ao fim.

E de facto, o meu nome obriga-me a atravessar o limiar desta porta para ouvir dizer que a Quaresma é o único tempo de que disponho: água com umas gotas de limão elimina os cálculos e quanto ao resto, tenho que carregar a cruz dos dias sombrios...

Ficou, todavia, uma esperança: daqui a um ano estou obrigado a sentar-me novamente diante daquela porta, deste lado do corredor, e aposto que ninguém se surpreenderá se às 18:45 eu lá estiver sentado, ovelha dócil sem pastor...

16.3.08

Resposta subjectiva a uma defensora da objectividade

O Governo quer a avaliação para reduzir os custos e aumentar o sucesso.

Muitos professores detestam a mudança; outros vêem na escola um espaço de luta permanente, que os compense dos seus próprios fracassos; há ainda os que, atemorizados pelos comportamentos actuais, acreditam que é possível impor um novo (ou será velho?) sistema de valores.

Pessoalmente, a avaliação não me incomoda, se ela não significar, de imediato, uma penalização. Sempre me esforcei por acreditar que o homem pode aprender e ser útil, apesar dos múltiplos sinais em contrário…

Quanto aos itens de observação /avaliação, defendo que o seu número deve ser limitado. 10, no máximo, como os mandamentos. E, também, defendo que aqueles que procuram itens objectivos e mensuráveis, sãos os mesmos que põem em causa o avaliador. Ora avaliador e avaliado, antes de serem “objectos”, são “sujeitos”. E a experiência diz-me que, em matéria de avaliação do sucesso educativo, a subjectividade se deve sobrepor à analise comparativa e estatística… o que me reconduz à crítica do paradigma sociológico que tantos estragos tem feito nos últimos 10 anos, em Portugal.

Bem sei que estas minhas palavras falham na clareza e na concisão, mas são as que te posso dizer aqui e agora. Sem ser Séneca, também posso dizer que sei para onde vou, mesmo que os ventos sejam desfavoráveis e que isso nada importe a quem nos governa, precisamente porque lhes falta a subjectividade…

13.3.08

Antes que seja tarde

Fica dito:

  • Que não sou a voz de ninguém
  • Que, perante um problema, começo por pocurar-lhe a extensão
  • Que descoberta a causa, invisto tudo na solução
  • Que a melhor solução raramente é comoda
  • Que não compreendo nem a fuga nem a deserção
  • Que a delação me enoja até à exaustão
  • Que aos deuses já disse tudo
  • E que aos homens pouco mais tenho a dizer

8.3.08

A força dos professores...

Mais de 80.000 nas ruas! Impressiona pela capacidade de mobilização, mas, sobretudo, porque cada um tem uma razão de queixa.

Há muito que o Estado se vem servindo dos professores como bem lhe apraz. Não lhes proporciona nem formação científica nem pedagógica rigorosas. Não define um rumo para o país e, consequentemente, para a educação. E agora, o mesmo Estado exige competências que sempre sonegou.

Por isso, a indignação. Até porque as reformas em curso, em nome da optimização dos gastos, visam mais do mesmo: diminuição das despesas com a formação, diminuição das despesas com os equipamentos, diminuição das despesas com o parque escolar, diminuição das despesas com os salários. Não parece que o director de turma, o director de ciclo, o director do curso profissional, o director de departamento, o presidente do conselho pedagógico, o presidente da assembleia e, mesmo, o presidente do conselho executivo passem ser devidamente remunerados pelas funções que exercem. Em qualquer empresa privada, e, também, em muitas empresas públicas, todos estes cargos são remunerados de forma diferenciada.

Deste modo, a avaliação surge inquinada. Não valoriza salarialmente os docentes e, por outro lado, qual espada de Dâmacles, entrava a progressão dos mais novos e ameaça os mais velhos...

Um Ministério que não percebe que a formação científica e pedagógica é essencial, arrisca-se a ver na rua uma luta política que acabará por dinamitar o Governo e empobrecer ainda mais o País. Arrisca-se a que sindicatos e partidos se aproveitam da indignação dos professores, em benefício próprio. E humilha os seus professores perante pais e alunos, empurrando-os, depois deste pronunciamento, ou para o combate político no interior das escolas ou para a abulia...

 

6.3.08

Mais vale o Inverno do que o Inferno...

Hoje, vou continuar a acompanhar a inclinação do eixo da terra na esperança de que o céu se mantenha azul, apesar das baixas temperaturas.

Bem sei que, deste modo, a Fortuna me precipita mais de depressa para o Inverno, mas que fazer? Mais vale o Inverno do que o Inferno?

Um pouco de chuva, talvez, limpasse os Céus severos, mas isso é pedir demais.

Sobram os erros (meus) e os dedos acusadores... Que fazer? Só sei que nunca alinhei em garraiadas... donde vim, o touro pega-se de caras...

5.3.08

Falta de pudor...

O problema já não é a falta de pudor; o problema está no descaramento: os alunos ignoram o professor e, pior, afrontam-no; os professores esquecem o decoro e fazem da escola arena política;  os ministros e seus acólitos desprezam a razoabilidade que devia pautar as suas acções. A boçalidade reina um pouco por toda a parte.

Hoje, voltei à escola de 1974/75. E recordo a ligeireza saneadora que varreu as escolas, em julgamentos sumários...

E de memória em memória, lembro a fúria inquisitorial que, em efígie, queimou o Padre António Vieira...

E não vale a pena citar Antero nem António Sérgio. Quem os lê e lhes conhece as dúvidas?