8.7.10

Passemos antes por Paris…

Com as Juntas Médicas da Caixa Geral de Aposentações nem todos os caminhos vão dar a Roma! Já todos ouvimos falar da estreiteza  dos atalhos. O que eu não sabia é que podemos chegar a Roma desde que, antes, passemos por Paris.

Se eu estiver incapacitado para o trabalho, não devo tomar a iniciativa de solicitar uma Junta Médica. Essa decisão prova que, afinal, não estou tal mal como isso. Então, que fazer?

Decididamente, não me apresento ao serviço. Arranjo um atestado médico, de preferência, passado por um psiquiatra que domine as novas tecnologias de informação, não vá algum grafólogo pôr em causa a saúde mental do atestador. Deixo-me ficar por casa (ou por onde me apetecer!) 60 dias. Terminada a “quarentena”, o chefe de serviço lembra-se que a Lei o obriga a enviar-me a uma Junta Médica do Ministério a que o (dis)funcionário pertence…

Combalido, chego à primeira Junta Médica do meu Ministério, a qual, incapaz de contrariar a declaração do ilustre psiquiatra, me devolve a casa, justificadas as faltas, sabendo, desde logo, que o ritual deverá durar, no mínimo, dezoito meses… para que a Junta Médica do meu Ministério, perdida a esperança de que eu entre em remissão (isto é, que o meu psiquiatra me dê alta), me despache, finalmente, para a Junta Médica da Caixa Geral de Aposentações…

De regresso ao lugar (no caso, uma cave!) onde, um dia, me perguntaram quem é me lá mandou, eu, serenamente, responderei: a Junta Médica do meu Ministério!

Está claro que não devo ir sozinho. O (meu) caminho há muito que é percorrido por um médico de medicina interna e /ou por um reputado psiquiatra… Se bem percebi, eles passaram a ser o meu corpo e a minha voz! Eles falarão por mim…

Se nem assim conseguir chegar a Roma, há que ter paciência: voltar para casa; arranjar novo atestado médico de outro ainda mais reputado psiquiatra; faltar mais 60 dias ao serviço… até que a Junta Médica do meu Ministério…

Mas, nunca, por nunca, tomar qualquer iniciativa…    

6.7.10

A personagem…

«Quando encontro um leitor que é capaz de falar de uma personagem apetece-me abraçá-lo como um amigo.» Lídia Jorge, entrevista ao DN de 4 de Julho de 2010

Ora aqui está uma boa ideia: incentivar o leitor a escolher uma personagem e a falar dela. Para os burocratas que inventaram o contrato de leitura, ler já é, em si, um acto de progresso, mesmo que o leitor valorize apenas a acção e o insólito das situações; mesmo que falar da obra não passe de um acto gratuito e, frequentemente, deseducativo.

De facto, nos tempos que correm quem é que se interessa pela personagem? A crise da personagem radica no falhanço da pessoa, nas falhas de carácter.

E se, por instantes, cedemos ao fascínio da personagem, não resistimos, contudo, a investigar os defeitos do homem que supostamente a gera…

5.7.10

Na sombra…

A viagem, iniciada na última 6ª feira, terminou hoje às 20h30. Os olhos percorreram linhas atrás de linhas à espera de encontrar uma ideia fundamentada, uma resposta rigorosa, uma centelha de originalidade… Em vão. Chavões atrás de chavões… Apenas uma ideia sombria! Descoberta a Índia, ao entrarem no Tejo, os nautas apátridas fundaram a nação lusa. 

A ignorância da História mata qualquer hipótese de contextualização, sabota a interpretação. E esta falha é cada vez mais frequente. Basta ler os jornais:

«D. João II era grande apreciador de sardinhas, que considerava baratas e saborosas, de acordo com os relatos de Fernão Lopes.», Notícias magazine, de 4 JUL 2010.

Na sombra deste discurso vive uma singularidade que vem brincando impunemente com coisas sérias (e não é única!). E brinca porque a Academia não cumpre a sua missão. Pelo contrário, recompensa a ignorância, o disparate e, sobretudo, o laxismo.

3.7.10

Absurda viagem…

Viajei todo o santo dia, sem sair do lugar. Resta saber se aprendi alguma coisa. Do outro / outra é melhor não falar, e de mim, vejo-me refém de uma absurda engrenagem… E o prazo a cumprir obriga-me a interromper o discurso…

1.7.10

Em nome da verdade…

«A biografia não é um meio de unir a vida e a obra, mas um discurso sobre a vida / a morte que ocupa um certo espaço entre o logos e o drama.» Jacques Derrida, Otobiographies…, 1984 

A biografia ao querer transformar o Singular em Discurso atira-nos, de imediato, para o território da ficção, apesar de nos apresentar como sujeito absoluto o que é apenas um sujeito possível. A coerência da vida e a coesão do discurso não passam de mecanismos de autenticação do sujeito / autor.

Na Idade Média, o discurso biográfico era naturalmente hagiográfico ou, em alternativa, satânico. O homem pouco importava… a sua singularidade morria com ele, salvo se pelo Discurso (seu ou/e alheio) se conseguisse apresentar como sujeito absoluto – lugar de fingimento ou mesmo de mentira…

Em nome da verdade, vamos construindo um discurso de mentira…

29.6.10

Quando os amigos…

Quando os amigos partem, todos ficamos mais pobres. Da vida vivida, sobram, por enquanto, os caminhos que percorremos a par, cientes de que a Natureza, que aprendemos a amar, nos pode trair… Que Ela te acolha e te abrigue nesta última caminhada, amigo Alberto…