27.2.12

Comentar…

Não sei se vale a pena responder a comentários, sejam apreciativos ou depreciativos. Em geral, um comentário serve para explicitar a substância e não para enfatizar o acessório.

Na foto desaparecida, nós vemos a flor da amendoeira que, certamente, procuraremos adjetivar. No entanto, à volta das corolas, atarefam-se as abelhas…

… e claro, na colmeia há sempre um zângão!

25.2.12

O caminho da água

Eram dois os caminhos, mas o da ponte era o preferido. A clausura da estrutura assustava-me menos que a espessura da muralha escalabitana. Durante duas horas, a carreira percorria pachorrentamente os campos alagados – os da Páscoa chegavam a ser deslumbrantes! O Tejo desmedido embalava-me na ida e no regresso. Durante três meses, sonhava com aquele caminho – o caminho da água.

Hoje, voltei a atravessar a ponte, mas do Tejo só vislumbrei bancos de areia, e senti-me mais só do que naqueles meses em que, outrora, vivia cercado pelas muralhas fernandinas.

/MCG

23.2.12

«Numa rua perto (…) Não correu mais sangue.»



«(…) esperou que Baltasar terminasse para se servir da colher dele, era como se calada estivesse respondendo a outra pergunta, Aceitas para a tua boca a colher de que se serviu a boca deste homem, fazendo seu o que era teu, agora tornando a ser teu o que foi dele, e tantas vezes que se perca o sentido do teu e do meu, e como Blimunda já tinha dito que sim antes de perguntada, Então declaro-vos casados.» José Saramago, Memorial do Convento, pág. 56, 16ª edição

22.2.12

Um tempo pobre…

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Ao lado, um casebre em degradação no casco da vila. Por detrás, as muralhas, parte delas, em ruínas…

O arco, abandonado à sorte da natureza, esconde-se, envergonhado da nossa inépcia.

É essa inépcia que explica o nosso cativeiro!

20.2.12

São mil os passos perdidos…


«Al fin y al cabo, al recordarse, no hay persona que no se encuentre consigo mesma.» Jorge Luis Borges, El Otro, El Libro de Arena.
No que me diz respeito, o princípio não se aplica, pois, por mais que me esforce, não consigo lembrar-me das onze mil virgens mártires, às mãos dos Hunos, nem vejo por que motivo alguém se lembrou de as enterrar na igreja do franciscano Santo António, em Alcácer do Sal.

E quanto a Átila (385-453), rei dos Hunos, também já esqueci a sua crueldade que, ainda antes de ter nascido, teria degolado Úrsula, na cidade de Colónia, no dia 21 de outubro de 383. O mais interessante é que nesta cidade, uma igreja guarda o túmulo de Santa Úrsula e das suas onze companheiras.

Sempre que recordo o passado, acabo por me desencontrar e, simultaneamente, perceber que a escrita é um lugar de perdição. Neste caso, são mil os passos perdidos… ou talvez, uma dúzia de virgens perdidas!

19.2.12

Embora não pareça…


Embora não pareça, o aprumo de nada lhe serve: os ramos murcharam e as pinhas secaram.

Em torno, o verde ainda desponta, mas a seca não perdoa.

Longe dos caminhos, continuam a desfilar as máscaras, indiferentes ao incêndio que alastra.

18.2.12

Ao entardecer…

O arame farpado bloqueou-me a voragem…

Entretanto, concluo a leitura da enciclopédia ficcional de Roberto Bolaño, A Literatura nazi nas américas,  e fico a pensar na excentricidade, na megalomania, na violência e na irracionalidade daqueles monstros que povoam o continente americano, e cujas raízes ora se escondem ora se revelam na europa…

E claro, o plágio é tão comum que, a páginas tantas (125), acabei por chocar com «o Pessoa bizarro das Caraíbas», cuja morte o encontrou «a trabalhar na obra póstuma dos seus heterónimos.» ( Max von Hauptmann)

(De facto, Roberto Bolaño convida-nos à voragem do entardecer!)