30.9.12

Interlúdio III

Escrever é uma forma de nos expormos .
Nestes últimos dias, li 28 textos narrativos, subordinados ao tema «...pois é fraqueza / Desistir de cousa começada.» (Camões, Os Lusíadas, Canto I, estância 40)
(A instrução visa que cada aluno aprenda a construir um conto.)
Pelo resultado, uma parte seguiu a instrução; outra parte, descurou-a. Nesta última situação, falta a planificação do texto, abunda o registo informal, e, por vezes, uma tendência para uma linguagem desenraizada e maneirista.
Claro que, salvo raras exceções, a maioria pensa que o conto é uma narrativa onde tudo cabe. Em vez da forma simples, em que  surge um acontecimento capaz de criar uma nova ordem, após a resolução de um ou dois obstáculos, esta maioria prefere criar  um interminável folhetim, impossível de memorizar...
(Felizmente, ainda estamos a tempo de aprender a escrever de forma simples, clara e concisa!)

29.9.12

Benefícios fiscais e subsídios

Num país de desempregados, de reformas de miséria, de congelamento e diminuição de salários, a manutenção de benefícios fiscais e de subsídios é vergonhosa.
Ao Estado não compete premiar empresas, fundações ou institutos que se revelem incapazes de viver sem benefícios e subsídios. O Estado, profilaticamente, deve impor o encerramento de todos esses organismos parasitas.
Em situação de insolvência, só começarei acreditar num governo que seja capaz de eliminar as exceções, os benefícios fiscais e os subsídios.
 
 

27.9.12

A canga e as exceções

Quando se justifica a decisão, argumentando que o momento que vivemos é de exceção, perde-se a face ao aceitar exceções à regra.
Logo pela manhã, a TSF anunciava que os cortes salariais em sede de IRS vão ser aplicados a todos, à excepção dos trabalhadores da CGD, da TAP e de outras corporações em que as progressões nas carreiras irão ser desbloqueadas, designadamente certas categorias de docentes do ensino superior universitário.
Por outro lado, objetivamente, ninguêm sabe qual é a dimensão das exceções, o que aumenta a frustração daqueles que se encontram sob a alçada da regra. E também já se perdeu a noção do volume dos sacrifícios que estão a ser pedidos sempre aos mesmos, assim como ninguém sabe ao certo qual´é o peso da economia paralela.
Um estado, que não só não controla estas variáveis como cria exceções que geram cada vez mais desigualdades, é um estado falhado que nos reduz à categoria de bois mansos.
É hora de acabar com as exceções!
 

Dia VIII

I - O leitor crédulo aceita facilmente como inquestionável o texto (auto)biográfico. Regra geral, não filtra a «verdade», porque confia no sujeito (eu), nas suas opções, dando expressão à ideia de que a escrita na 1ª pessoa é mais sincera do que qualquer outra. Ora se o leitor se habituar a extender a leitura ao CONTEXTO, entendido como descoberta de elos (ligações, conexões) existentes entre os vários textos do autor e /ou da mesma época, não só enriquecerá o seu conhecimento como passará a ser mais exigente, um leitor crítico.
Entre a escrita e a leitura, há um fosso difícil de ultrapassar, pois o escritor ( escrevente, escriba, secretário da puridade, escrivão, copista...) tem ao seu alcance meios ilimitados  que lhe possibilitam criar, em diferido, uma verdade construída, mas que o leitor não vê como produto de uma construção, mas, sim, como um acontecimento.
Estejamos a ler José Luís Peixoto, Raduan Nassar ou António Vieira, o texto é sempre a expressão de uma composição, de uma construção, por vezes, tão poderosa que ela pode moldar irremediavelmente a verdade das nossas vidas.
É por tudo isso que o CONTEXTO se torna muito mais importante do que as circunstâncias.
 
II - Fujamos do homem moderno... pela palavra e pelo gesto.
 
III - Quando um padre jesuíta se torna num homem de ação, num patriota que luta pela soberania do seu país, acaba por gerar uma multiplicidade de inimigos de que  dificilmente se libertará, sobretudo combatendo-os pela ação verbal.
 

26.9.12

Não chove

Não chove na praça neptuno
já choveu em sevilha zagreb santiago

Um dia irá chover na praça neptuno
resta saber de quem será o sangue

e voltará a chover na praça do império

Dia VII

(A dificuldade reside na ausência de conhecimento sistematizado da História.)

Como explicar o rumo do escritor romântico, se o destinatário ignora que entre o século XV e o século XIX  a matriz foi, em geral, estrangeira - do renascimento ao iluminismo - mesmo que cercados pelo Tribunal do Santo Ofício?
Até o protótipo do império era estrangeiro! A arte apresenta-se como reflexo de uma cultura cujas raízes se encontram fora do solo pátrio. Será assim tão difícil de entender a regra e aceder às exceções?
A ruptura romântica inscreve-se num ato refundador da História e consequentemente de todos os ramos que à sua sombra florescem: as artes, em particular...
E nesse movimento, o povo eleva-se do solo e a sua memória passa a ser sondada como o adubo que pode fortificar a seiva romântica.
Claro que com equívocos! Os românticos, apressados, confundiram quase tudo. Sobretudo, exaltaram o espírito criador coletivo, ao não distinguirem autoria de transmissão (tradição). Quiseram convencer-nos que a criação individual fora inicialmente do grupo, como se o romance transmitido oralmente não tivesse sido criado por um indivíduo. Reservaram o génio individual para eles próprios, os vates, os mensageiros de uma nova ordem gerada pelos enciclopedistas e consagrada na execução dos reis (do antigo regime).

Está na hora de voltar atrás e explicar o que significava "convocar e reunir cortes", o que talvez ajude a perceber que o "concílio dos deuses" camoniano já tinha raízes nas "Cortes de Júpiter" vicentinas. Claro que os reis (absolutistas) já só convocavam as cortes em situações extremas. O ato passara a ser encenação:

"Oh caso pera espantar
que é isto Jupiter
a que nos mandais chamar
quer-se o orbe renovar
ou tornar-se o mundo a fazer?"
(Vicente, Cortes..., 1521)

25.9.12

Praça Neptuno

A voz inocente manhosa ergue-se na praça
a chuva sobre a terra seca

cresce involuntário o cerco
da pedra nada sobrará