31.3.14

Peões de brega

 Uma pessoa sensata!  Parece ser um elogio... No intervalo uma linha preenchida por pontos anónimos

Escrever sobre pontos e linhas pode não fazer sentido, mas tem uma vantagem, não desassossega a não ser quem se sente desfasado, forma passiva de uma ação cujo sujeito mais vale ignorar...
A alternativa é colocar os pontos nos is... Para quê?
(...)
Desfazer o enigma? Suspensos os dedos, os pensamentos saltitam: um vulto atrás de um ecrã, imagem estática, quotidiana, medeia interesses; outros vultos, todos atrás de ecrãs, recebem ordens escondidas; ainda outro vulto delira com a vitória programada; há mesmo um vulto diante do ecrã  que finge que os 7% da extrema-direita francesa podem ser anulados por uma baixa de impostos...
(...)
O problema é que todos estes vultos, peões de brega, estão ao serviço da mediocridade de que se valem os Senhores para governarem o mundo a seu belo prazer. 

30.3.14

Do outro lado da linha

Em algumas horas, a linha pode virar ponto e ao pensar-se que finalmente a ânsia foi esbatida, eis quando do outro lado da linha nos dizem que o ponto se transformou em fila (bicha voraz) porque parte da bagagem ficou retida num tapete rolante para lá da distância esbatida... e não ficou sozinha, de tal modo que múltiplos pontos se veem no labirinto burocrático...
No caso, nem as asas de Dédalo nem as esferas de âmbar de Bartolomeu se mostram capazes de trazer de volta as malas, por ora, turcas...
Lá as eleições municipais deram cabo do zelo reparador - os turcos preferem o confronto direto mesmo que isso lhes traga a morte, porque para Erdogan a «questão é de vida ou de morte»...
Cá o faz-de-conta burocrático obriga o viajante a fazer morosa prova dos objetos retidos... Talvez venham no próximo voo e sabe-se lá em que estado! 
Entretanto, o zeloso funcionário, desconfiado, vai exigindo a chave de cada cadeado...

29.3.14

Tenho uma linha!

Se começar a ligar os pontos, tenho uma linha. Uma linha com tantos pontos que os não consigo abranger. Alguém se lembrou de a medir, não em pontos, mas em quilómetros, e para me tranquilizar (ou assustar?), dizem-me que são mais de 4.500 km...
De facto, eu não passo de um ponto (ou de conjunto de pontos) e ninguém se propõe medir-me em quilómetros. No meu caso, a medida é em centímetros! Mais do que uma linha, vejo-me como um novelo debruçado ora para dentro ora para fora. 
Hoje é um daqueles dias em que muda a hora, em que os pontos parecem reduzir-se tornando a linha mais tensa, mas a qual, de verdade, não deixa de ter mais de 4.500 km...
Em rigor, quero acreditar que, à medida que as horas passam, a linha vai encurtando, os pontos vão diminuindo...
Tenho uma linha! Mas como, se não passo de um ponto?

(Entretanto, a linha invisível está a aproximar-se: o espaço diminui à medida que o tempo avança. Quem diria que o tempo pode avançar ou recuar? A noite desalinhada foi dizendo que o tempo é um malfeitor, pois até os telemóveis necessitam de ser reiniciados sempre que a hora muda... e se não o soubermos, a ansiedade cresce mesmo que a extensão diminua...)

28.3.14

A batata, a erva daninha e os bastardos

A diferença entre esta batata e o governo é que ela faz pela vida. Deem-lhe um pouco de água e de sol, e enraíza, ganha folha e flor. Torna-se produtiva e bela. E não precisa de muito tempo para assegurar a mudança…
Também se pode pensar que o governo enraíza, mas trata-se de um erro. O governo é a erva daninha que há muito dizima o batatal. O governo é improdutivo, gasta o tempo a cortar. Não precisa nem de água nem de sol, basta-lhe uma foice ou uma gadanha para limpar a seara…
E zelosamente, vamos sendo ceifados pelo governo e pela parte bastarda de nós…

27.3.14

As redes sociais

http://www.dailymotion.com/video/x1ip4e5_turquie-erdogan-execute-ses-menaces-et-bloque-twitter_news

As redes sociais incomodam o poder instalado. E como tal transformaram-se  no alvo incontornável dos poderosos... A médio prazo, qualquer rede social acaba controlada ou silenciada pelos inimigos da transparência...
O exemplo mais recente, provavelmente mais grave, é turco. Portugal, por seu turno, já encontrou o pretexto para exercitar uma velha competência - indexar, censurar. O nosso ministro da educação consegue ir mais longe do que ERDOGAN: começou por limitar o acesso ao facebook... A Turquia  só o fará com a mudança de hora...

26.3.14

Vida que passa


(...) Insisto que, n' Os Maias, o discurso vale mais do que a história, que a leitura pausada e repetida de uma página pode criar uma relação de cumplicidade inesquecível com o autor, pode ensinar a equacionar a realidade de ângulos surpreendentes, pode abrir as portas para um inevitável e retrógrado choque de culturas, para a expressão da incapacidade de resolução de um problema vivido interiormente, sobrando apenas o riso amargo e vencido da ironia pessoal e coletiva... Para atrás vão ficando os adjetivos, os advérbios, os polissíndetos, os assíndetos, as metonímias preguiçosas, as hipálages audaciosas, os paradoxos e os oxímoros, a lógica e a retórica, os tropos e as figuras, os retratos e as caricaturas, as descrições,  as cores, rosadas, rubras e cerúleas, ... e, por força, as personagens, o tempo que que avança e recua e o espaço que se contrai e se expande em avenidas, corpos e fantasias... as nódoas de sangue... 
( E a espaços uma voz se levanta: - É necessário ler o romance? E qual é a Gramática?)

Sem resposta, desço pela Conde Redondo, as ruas esventradas, não sei se o gás se a eletricidade? Procuro uma loja de acessórios, fechada? Definitivamente. Mais abaixo, uma informação: - Procure rua António Pedro (o ator)... Agora subo, entro na dita rua, também ela esventrada - desapareceram uns tantos números. Desço e volto a subir, estou quase no Chile - uma Churrascaria pegou fogo! Os mirones do costume, um cerco de bombeiros e polícias, o trânsito desviado e deixado à sorte do fluxo... e eu entro, finalmente, na loja de acessórios que não tem terminal de multibanco e passa recibo em euros e escudos. Saio satisfeito porque o stock não estava esgotado como na farmácia. Regresso à Pascoal de Melo, caminho sem pensar na traição da classe aristocrática, quando, de súbito, uma placa chama a minha atenção: Fernando Pessoa morou ali no 3º direito durante uns meses em 1914. Uns meses! Quais? Que importa? Sigo caminho, passo ao lado do Neptuno sem lhe prestar atenção, já com a mira no novo edifício Pessoa. E claro, Pessoa também morou ali na Almirante Barroso, 12, por cima da Leitaria Alentejana. Dormia de empréstimo e favor do venerável e iletrado Sr. Sengo... e quem quiser saber mais e ficar desorientado faço favor de revisitar o Sr. João Gaspar Simões, sobretudo o capítulo VIDA QUE PASSA, título de uma Crónica que Fernando Pessoa foi escrevendo até um que a associação de classe dos chauffeurs da capital lhe acabou com a carreira de jornalista... 

E há só um caminho para a vida, que é a vida... Álvaro de Campos

25.3.14

Pessoa parou no Espírito...

Perante o problema da opção sexual de Fernando Pessoa, custa-me que haja um problema por resolver, sobretudo, nos dias que correm... Nem creio que essa opção pudesse ser feita. Primeiro: faltou-lhe a amizade de Mário Sá-Carneiro. Segundo:  Pessoa parou no Espírito.

De qualquer modo, questionado, decidi consultar "Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação" e a páginas 27 e 28 encontro a reposta: 
a) «Não encontro dificuldade em definir-me: sou um temperamento feminino com uma inteligência masculina
b) «A minha sensibilidade e os movimentos que dela procedem (...) são de mulher. As minhas faculdades de relação - a inteligência, e a vontade, que é a inteligência do impulso - são de homem
c) « Reconheço sem ilusão a natureza do fenómeno. É uma inversão sexual frustre. Pára no espírito.»
d) « Sempre me inquietou (...) que essa disposição de temperamento não pudesse um dia descer-me ao corpo.»
e) « Não digo que praticasse a sexualidade correspondente a esse impulso; mas bastava o desejo para me humilhar.»