31.7.14

A mim, o que me espanta...


Há uns dias, referi-me, aqui, aos Contos Municipais do António Manuel Venda, omitindo deliberadamente uma parte do que caracteriza a construção da narrativa: o recurso à hipérbole, à animização, à caricatura... Apesar do mérito do autor, o impacto da obra não é grande. Afinal, o meio retratado é provinciano, quase magrebino. E as elites da capital têm mais em que pensar e, sobretudo, APOIAR...

Não sei por onde é que andam os caricaturistas, mas matéria não lhes falta...Talvez, tendo ido ao BES, não tenham vontade de sorrir nem de fazer rir...

A mim, o que me espanta é a expressão hiperbólica do fenómeno: "torpedo", "hecatombe", "catástrofe", "nunca visto neste jardim, nem no tempo do BPN", "colossal", "trágico", "uma ministra desesperada por não conseguir ver-se livre disto, refugiando-se em bruxelas", "um seguro espantado por ter sido enganado pelo governador do banco de portugal (outro costa!)...

A mim, o que me espanta é que ninguém esteja preso ou, pelo menos, que alguém se tenha suicidado...

30.7.14

Qual é a pressa?

O médico de família, na sequência de observação através de ecografia feita e avaliada por médico especialista, entende que o paciente deve submeter-se com  urgência a uma TAC – tomografia axial computorizada. Só que o exame complementar de diagnóstico tem de ser autorizado pelo chefe da Unidade de Saúde Familiar (UHF).

Hoje é 4ª feira, a TAC poderia ser realizada amanhã, 5ª feira. No entanto a autorização só será concedida (?) na próxima 3ª feira, à tarde.

Consequência: o exame só será realizado no dia 14 de Agosto.

29.7.14

Não sei o que pense desta fraternidade

O investigador imagina-se caçador. O investigado não quer ser tomado como CAÇA, pois ainda sonha ser a pessoa que nunca chegou a ser. Não se nasce pessoa e muito menos boa pessoa!

O candidato tudo faz para destruir o candidato. A única finalidade é ser ELEITO! Depois se verá, se ainda houver povo... Já começo a pensar em tornar-me candidato para destronar o candidato a candidato. Só não o faço porque o meu boletim clínico é agoirento e me falta a estrutura acionista...

O estadista reivindica ser filho do povo, o banqueiro não se importa de ser bastardo do patrão da criada que o trouxe ao mundo...

O acelerador de partículas desfaz os miolos a pessoas que se fazem passar por respeitáveis, mas que, no íntimo, sabem que não passam de pequenos traidores.

Nada do que possamos fazer ou padecer é original. Há sempre quem tenha experimentado as mesmas dores, conheça, de antemão,  o nosso futuro. Há sempre quem queira tomar decisões por nós. Ser senhor de nós. 
Não sei o que pense desta fraternidade, se age por amizade, por piedade ou porque receia a solidão. É, no entanto, uma fraternidade que nos esvazia, que nos impede de SER.

Quando deliro, chego a pensar que a culpa de tudo isto é da estrutura acionista e da robótica.

28.7.14

Contos Municipais, escritos de baixo para cima...

Terminada a leitura de Contos Municipais, de António Manuel Venda, quis registar uma ou outra ideia, o problema é que fui assaltado por uma associação mental... (Trata-se de um conjunto de estórias sobre um meio pequeno: o presidente da câmara, manda-chuva; a vereação conformista; a secretária discreta e prestável; a bruxa milagreira maria cadela; o vereador, chico esperto; a oposição diabolizada - um meio animizado, com joaninhas e ouriços, dióspiros, um elevador, e o imprescindível whisky presidencial... E claro, um meio que abomina qualquer intervenção externa, da capital... do ministério das finanças...). 
Entretanto, a associação mental está a ficar para trás, ou, melhor, está a dar lugar a outras ligações umbilicais: de Mário de Carvalho a Mia Couto, sem descurar José Eduardo Águalusa. Não querendo comprometer o António Manuel Venda em qualquer ligação perigosa, regresso à primeira associação mental: Gabriel Mariano, Cultura Caboverdeana, Ensaios... 
Pensava eu que me seria fácil recorrer a uma citação  do poeta e ensaísta Gabriel Mariano (aliás, José Gabriel Lopes da Silva) sobre a importância dos meios pequenos, quando me apercebi que a relação entre a memória e o lugar na estante pode tornar-se uma dor de cabeça... Da estante, saltaram, à vez, Vida e Morte de João Cafume, Ensaios, Claridade revista de Arte e Letras... e nada ou quase:
A cultura fez-se de baixo para cima. Não se fez da Casa Grande para a sanzala como sugere G. Freire.
No essencial, o que tenho a dizer da obra Contos Municipais é que ela foi escrita de baixo para cima, mesmo quando as nuvens pairavam sobre a Câmara Municipal de Monchique, de Portimão, de Tavira...
/MCG

27.7.14

Situações de exceção

Cito o Expresso, Economia, 26 de julho de 2014:

a) O secretário de Estado da Administração Pública está neste momento a negociar com os sindicatos a tabela salarial única e a revisão dos suplementos.
b) O atual secretário de Estado da Administração Pública, José Leite Martins, nomeado no final de 2013, depois de quase uma década como inspector-Geral das Finanças, criou e manteve uma situação de exceção para muitos quadros de topo da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) que dura há vários anos. (...) Existem atualmente 24 inspetores cuja remuneração é ainda calculada com base nas regras anteriores a 2009, o que, na prática, representa uma diferença na ordem dos €1500 brutos por mês face ao que ganham os seus colegas que assumiram o cargo depois dessa data.... 

- Quantas serão as situações de exceção neste inefável país?
- Como é que o criador da exceção citada pode ser o negociador da tabela salarial única?

Hoje também poderia falar de outras situações de exceção: Marcelo Rebelo de Sousa a comparar o pobrezinho do amigo Ricardo Salgado com o Paulo Bento; o tristonho presidente da República a comparar a Guiné Equatorial com a Coreia da Norte...
Vou ficar por aqui, pois não sei o que pensar. Lembro-me, contudo, que, há pouco tempo, na Coreia do Norte, foi encontrada uma professora que ensinava Português sem nunca ter tido a possibilidade de cavaquear com um nativo desta ditosa pátria... 


26.7.14

Suspenso do tempo

Assinamos um título de responsabilidade, absurdo. Se não voltarmos a despertar, essa assinatura é uma garantia preciosa para a instituição (anestesista, médica, enfermeira). Quanto a nós, que importa? 
(...) Antes da suspensão, ainda ouvi pense 'em alguma coisa agradável' e a ilha do Pico, subitamente, eclipsou-se... até que uma voz máscula gritou 'senhor manuel, acorde, acorde', cada vez mais alto. 
E acordo, estremunhado, sem perceber o que aconteceu no intervalo; apenas uma mancha vermelha no resguardo. Ponho-me de pé para me vestir, vejo ao lado as roupas que deixara no gabinete de acesso e pressinto que o espaço está diferente, e penso que devo estar na sala de recobro... tudo tão rápido ou, pelo menos, parece... 
O tempo de ontem era tão lento e o de hoje tão apressado, a não ser que, por momentos, ele tenha estado suspenso. 
Recebo os resultados em videograma: as imagens são esclarecedoras, as palavras nem tanto...
/MCG

25.7.14

Palavras estranhas - endofalk

Endofalk é uma dessas palavras que associo, de imediato, a cadafalso. Porquê, não sei... O termo designa um «pó para solução oral constituído por uma mistura de sais e macrogol» - outra palavra que associo a mongol. Associação inapropriada, pois trata-se de um laxante, vocábulo imaginado por algum preguiçoso...
As minhas associações revelam-se primárias, com leve vestígio assonântico (ou será aliterado?)...  
A verdade é que estas palavras estranhas acabam por se liquescer, obrigando-me bebê-las durante três horas à média de 200 a 300 ml a cada 10 minutos. No total, três horas de progressiva bebedeira adocicada! E para quê?
Para que ao fim de três longas horas, o líquido volte a sair límpido... e tudo, assim, se mantenha por mais 14/15 horas...

(Estou a meio da função! Alguém me disse que este procedimento libertar-me-á da melancolia. A ver vamos, embora já comece a sentir as entranhas...)