31.3.16

A Senhora da Furgoneta

The Lady in the Van. Filme, 2015.

Só hoje vi este filme sobre as relações humanas num bairro londrino no período thatcheriano. Relações postiças que, apesar de tudo, se vão tornando corteses. 
Miss Shepherd sabe como ninguém explorar a má consciência da rua em que instala a sua "furgoneta", obrigando os vizinhos a tolerar-lhe o lixo, a sujidade, a pestilência e uma certa sobranceria. Sobretudo, o "vizinho" Alan Bennet acaba por, ao usá-la como tema de escrita, dar-lhe uma assistência inesperada até porque a recusava à própria mãe...
Por outro lado, este filme revela uma crítica explícita, embora pontual, ao catolicismo, porque fora, afinal, um sacerdote católico que censurara o amor da jovem Margareth (Miss Shepherd) pela música, levando-a entrar num convento... Critica, também, a assistência social inglesa que só muito tarde se ocupou da velha Miss Shepherd.
Esta obra mostra que uma personagem excêntrica e foragida esconde muitas vezes uma vida frustrada, porque os padrões de cultura assim o determinam. E Miss Shepherd nunca aceitou por inteiro esse destino...  
Finalmente, embora o tema possa parecer 'negro', há momentos que são hilariantes, e a interpretação dos atores Maggie Smith e Alex Jennings é excelente.

(Na sessão das 15:20, no Cinema City Alvalade, estiveram apenas 7 (sete) espectadores...)

Nem os lesados do BES /GES!

Ontem, foi celebrado um acordo entre os do costume para que hoje o Novo Banco possa ser posto novamente à venda sem assustar os potenciais compradores.
A leitura do ato é fácil, mas parece que ninguém deu conta disso. Nem os lesados do BES /GES!

30.3.16

Perda de tempo...

Do que ouvi até agora na comissão de inquérito ao Banif, Administração, Banco de Portugal e Governo, colocados sob a pressão de Frankfurt, mais não fizeram do que perder tempo... O mesmo tem vindo a acontecer com o Novo Banco... E provavelmente o mesmo estará a acontecer com o BPI...
Todos dão mostra de grande azáfama na procura de soluções, mas o resultado é a rendição a Frankfurt. Pelo meio, engordam uns tantos à custa do empobrecimento dos restantes.

A perda de tempo deveria ser tratada como 'caso de polícia' e não numa comissão de inquérito, pois esta é, também, uma perda de tempo...


29.3.16

Só porque existo...

«Isto é que fim, que princípio, que fim de que viagem, que crónica?» Mário Cláudio, A Memória do Rito.

Só porque existo
há princípio e fim
a dor da viagem acentua-se com a impressão de que o cais irá ficar deserto de mim
o cais existe sem pensar que possa haver princípio e fim
nem a ilha que o acolhe lhe desperta atenção
as flores são de pedra
azuis, as águas e as aves

Só porque existo
o cais as flores as águas as aves ganham cor, e parece que têm princípio e fim.

28.3.16

Revolta e Revolução - longe vai o tempo...

«Globalmente, o tribunal deu como provado que os acusados formaram uma associação de malfeitores, pelas reuniões que realizaram em Luanda entre Maio e Junho de 2015 (quando foram detidos). Num "plano" desenvolvido em coautoria, pretendiam - concluiu o tribunal - destituir os órgãos de soberania legitimamente eleitos, através de ações de "Raiva, Revolta e Revolução", colocando no poder elementos da sua "conveniência" e que integravam a lista para um "governo de salvação nacional".» Lusa

Longe vai o tempo em que o MPLA apelava à Revolta e à Revolução! Longe vai o tempo em que os escritores escreviam poesia e narrativa a apelar e a legitimar a Revolta e a Revolução. Longe vai o tempo em que Agostinho Neto (NOITE ESCURA) acreditava na liberdade: 
(...)
Um dia começou uma noite sem estrelas.
Mas na noite escura
os corações se erguem
Ah! é tão alegre a madrugada!
  
Vivemos num tempo em que os tribunais angolanos utilizam o mesmo léxico e decidem do mesmo modo  que as autoridades coloniais. 
Ah! é tão triste o despotismo!
Ah! é tão mesquinha a indiferença!

27.3.16

No domingo de Páscoa

Deste lado, um pontão e uma ponte. Curiosamente o sufixo /ão/ nada acrescenta, pois a ponte, quase invisível, leva muito mais longe...
Em 'ressurreição', o sufixo /ão/ deveria acrescentar ou, pelo menos, trazer o perdão à iniquidade humana, mas não. Tudo continua como dantes... até os flamingos voltaram, às centenas, ao leito do Tejo... Longe da (minha) objectiva, mergulham os longos pescoços sem qualquer preocupação com a redenção.
Alimentam-se sofregamente, porque a viagem pode ser a derradeira. Ninguém os irá acusar de gula, nem ouvi-los em confissão...
Eu é que já não tenho perdão!   

26.3.16

Uma ideia oblíqua

Sábado de chuva! 
Ninguém refere se as barragens estão cheias, nem se o preço da eletricidade deveria baixar...
Só as cerimónias da semana santa surgem misturadas com os falhanços do Cristiano Ronaldo e com a celebração do dia mundial do chocolate. Lá por fora, ecos prolongados dos atentados em Bruxelas e do acidente que vitimou doze portugueses, numa furgoneta de sete lugares conduzida por um jovem de 19 anos... 
Entretanto, eu termino a leitura de "Resgatados", de David Dinis e Hugo Filipe Coelho. E concluo com uma ideia oblíqua: quando à nossa frente se levanta uma parede é muito difícil derrubá-la. A teimosia de uns acaba por ser a desgraça de outros...
« Para ele (José Almeida Ribeiro), Sócrates era um líder político nato, com os inconvenientes que os grandes líderes sempre tiveram: quando acertam os resultados são magníficos; quando erram os seus erros são históricos.» op. cit, pág 233. 

O que é curioso no meio de tudo isto é que também eu vivo cercado de paredes, e não sei como escapar-lhes... Creio, todavia, que pouco falta para que a chuva de hoje se transforme no fogo de amanhã...