22.10.16

Woody Allen, 2016

Resultado de imagem para Café SocietyNovo filme, bem realizado, simpático, com os temas de sempre, embora com um ajuste de contas entre Hollywood e Nova Iorque. Os judeus noviorquinos, para o bem e para o mal, superam a artificialidade hollywoodesca.
Claro que há outras contas por ajustar entre o judaísmo e o cristianismo, entre a identidade e a alteridade...
E, principalmente, na música e nos amores, o que predomina é a autorreferencialidade, mesmo que o  realizador já tenha dobrado o cabo dos 80 anos...

Quanto ao público, na maioria, já dobrara os 60 anos... e continua a rir, como sempre... Por vezes, parece que ri de si próprio.  

21.10.16

Sibilas ressabiadas

"Vem aí mau tempo. Inundações e cheias nos próximos dias" - diz a notícia... que prevê. Outrora, a notícia informava.

E nós, indiferentes ao oráculo! E nós, desconfiados do oráculo, pois este só anuncia a catástrofe quando pode tirar proveito ou, pelo menos, tomar partido...
No que me concerne, detesto a astrologia, sobretudo, porque ela passou a ditar os acontecimentos que bem podiam ser diferentes se não lhes dessemos tanta atenção.
As notícias são cada vez mais promessas de sibilas ressabiadas. A comunicação social está pejada dessa espécie satânica, e o mal que provoca é incalculável...

20.10.16

Viva a Propaganda!

Mário Draghi: «...são necessárias reformas ambiciosas e o governo português sabe disso

Há anos que, por esta altura, surge este estribilho. É o momento em que se apresenta e debate o OGE.
Mudam os Governos e o estribilho regressa. O que me intriga é que ninguém explicita quais são as reformas adequadas ao país... e na verdade, nos últimos anos, não foi feita qualquer reforma, a não ser cortar nas reformas e... adiar as reformas... 

O resto é propaganda! Finge-se que se repõem vencimentos e reformas, mas não é possível repor o que se perdeu ou o que se não progrediu, até porque, em simultâneo, as taxas e as multas multiplicam-se... O que diminuiu foi o consumo, embora se persista em insistir no contrário...
Entretanto, em finais de 2016, seremos menos 0,4%!

PS. Reposto o vencimento de  2011, aplicadas as deduções referentes à ADSE, CGA e IRS, acabo de verificar que passei a receber menos. Viva a Propaganda!

19.10.16

Riem em coro...

Eles não sabem, nem sei se algum dia chegarão a saber, mas deste modo não irão a lado nenhum... O esforço é mínimo, a convicção máxima; já pouco lhes resta por aprender.
Provavelmente, argumentarão que já não há onde ir, e que eu há muito o devia saber - o país já foi; resta uma múmia para turista visitar.
Entretanto, riem em coro, não sabendo porquê, talvez do que 'acham' ver: ninguém pensa, imagina, estima, acredita, crê... apenas 'acha', e 'acham' a todas as horas, em todos os lugares, independentemente da situação, porque estas são todas iguais, as situações...
Alinhados, lembram-me os periquitos de colar, uma espécie exótica que esvoaça ruidosamente sempre que um espectro se move na copa dos plátanos...
O que parece gratuito e absurdo é, afinal, consistente e lógico!

18.10.16

E eu nada posso!

Agora que a persiana voltou a subir, a luz dilui-se na fachada, e, por cima do prédio, as nuvens cinzentas imobilizam-se numa promessa ambígua, apesar do braço do Tejo, sequioso, serpentear o verde aluvião resultante do desleixo humano...
A fachada divide-se, agora, em duas, e no topo, a luz torna-se mais solar; por seu turno, o rio escurece à espera que a nuvem cumpra o seu destino.
Os olhos distraem-se da atenção do dia - ruas cheias de manjedouras, intermináveis filas de carros, leituras cruzadas na sala de aula -, perscrutando quatro parabólicas de antanho, esquecidas ou que, talvez, esperem captar um qualquer sinal extraterrestre...
Entretanto, a luz continua a subir a fachada, deixando as persianas na sombra... as nuvens estão, agora, numa fase de diluimento, alongando a toalha, ambígua, sobre o Tejo, à esquerda...
E eu nada posso! 

17.10.16

O gesto absurdo

É quase noite! Ou melhor, a luz solar vai diminuindo... de súbito, quando decidira verificar se a luz artificial se anunciava, a persiana baixou, indiferente ao desejo, absurdo.
Segundos antes, pensara que aos leitores só interessam as primeiras palavras, e não querendo ceder à gulodice, caio na dúvida se o sentido ainda existe, absurdo.
Nesse intervalo, relembro o gesto, absurdo, em plena rotunda do relógio - abro a porta, verifico se o cinto ficara preso, ou talvez a aba do casaco, azul às riscas, vinte anos, vestido pela primeira vez na defesa de uma leitura imagológica, absurda como o tempo se encarregou de provar... afinal, a senhora, a mando do marido, queria saber para que lado ficava o aeroporto.
Do outro lado da rotunda, ainda avistei uma interminável fila de taxistas da semana anterior, absurda - só eu é que a via; o casal não queria saber da luta, só queria as chegadas ou, melhor ainda, as partidas...
Se a alvorada fosse minha, teria partido em vez de ficar a pensar no gesto absurdo, pois o que a senhora queria de mim era que eu baixasse o vidro naquele semáforo que, entretanto, passara a verde, indiferente ao casaco absurdo que um dia fora comprado para celebrar uma iniciação absurda...
Se o leitor chegasse ao absurdo do dia que anoitece, cerraria as pálpebras e, no absurdo, ficaria até que o semáforo se esfumasse.  

16.10.16

Costureira, me confesso

Se cada ano fosse apenas um dia, estaria, hoje, a iniciar o sexagésimo segundo dia - um trilho cuja duração não parece ter sido definida à partida, isto contrariando o Diderot, para quem tudo estado está escrito "lá-haut, dans le grand rouleau"... Claro que este dia incluiria a noite, a grande mistificadora...
Às voltas com um PC que, a cada passo, interrompe a elaboração de um qualquer teste, porque lhe apetece ou porque entende que eu, hoje, deveria entrar em modo de pausa... concentro-me numa afirmação, para mim, inesperada de Claude Lévi-Strauss e relembro o Sartre e, em particular, o Vergílio Ferreira:

«Quanto à corrente de pensamento que iria expandir-se com o existencialismo, parecia-me que representava o contrário de uma reflexão válida em virtude da complacência que demonstrava relativamente às ilusões da subjetividade. Essa promoção das preocupações pessoais à dignidade de problemas filosóficos implica um risco de desembocar numa espécie de metafísica para costureiras...»
                             Claude Lévi-Strauss, Os Tristes Trópicos.

A verdade é que, não sendo capaz de formular um problema filosófico em que eu não participe, me vejo, ao sexagésimo segundo dia, incapaz de vislumbrar o fim do trilho, caindo, assim, numa abordagem própria de uma exemplar costureira que só dá a obra por terminada quando o fio se quebra...