16.10.17

A nau Catrineta não volta mais

Ao calcorrear o país durante muitos anos, a imagem gravada era a de uma terra diversa, rica florestalmente, embora maltratada pelo primitivismo dos seus habitantes e, sobretudo, por projetistas em busca do el dorado.
Não será difícil perceber que o empreendorismo português, nos últimos 40 anos, não olhou a meios para capturar recursos, destruindo caminhos e linhas de água e, sobretudo, construindo vias rápidas que trouxeram consigo a desertificação.
As populações residentes, cada vez mais reduzidas, viram desaparecer a escola, o posto de correio, o mercado, a mercearia e a taberna, a agência bancária, e até as ermidas se tornaram apenas objeto de romarias estivais dos emigrantes que por alguns dias regressavam ao lugar que os viu nascer - o progresso, a austeridade, a troika, o centralismo...
Agora, já não é só o pinhal do interior, é também o de D. Dinis que é devorado pelas chamas gulosas dos abutres, políticos e seus comparsas.
Com a chegada do inverno, chegarão as marés vivas que não olharão a dunas e a edificações alcandoradas. O mar entrará terra adentro e destruirá tudo o que se lhe opuser... e depois alguém gritará que a culpa é das alterações climáticas.
A verdade é que a culpa é nossa, porque não sabemos escolher os governantes. Gostamos dos incompetentes, dos demagogos, dos manhosos, dos intriguistas e até dos corruptos, sem esquecer aqueles que, de tempos a tempos, nos dão com o pau...

15.10.17

A Acusação

Estive a folhear a Acusação e fiquei com a ideia de que, afinal, neste país, há pessoas com muito espírito empreendor. 
O crescimento dos negócios é de tal ordem e tão célere que a velha de ideia de que o catolicismo sempre fora um entrave ao desenvolvimento industrial e comercial se me apagou. Vou deixar de ler o velho Antero das Causas da Decadência dos Povos Peninsulares... (Terei, entretanto, encontrado a explicação para o facto do Partido Socialista, nascido na Alemanha luterana, nunca reivindicar a herança da Geração de 70 do século anterior...)
Por outro lado, parece que o crescimento do negócio transfronteiriço é inseparável da criação de fortes laços de amizade, mesmo nos casos em que as relações terminam em divórcio. Há ainda um outro dado a não descurar, a província leva a palma à capital na sua capacidade de expansão e de internacionalização. E não menos importante, os amigos tudo fazem para promover a formação do Amigo Maior, mesmo que este ame o fausto e a prosápia...
Finalmente, começo a desconfiar que a fraternidade é tão profunda que há amigos tão poderosos que nem sequer são mencionados pela Acusação. Pelo menos, o localizador não os conhece pelo nome que lhes terá sido dado na pia batismal...
(Um destes dias, voltarei à Acusação!)

14.10.17

Ontem, senti pena do jornalista Vítor Gonçalves

Ontem, senti pena do jornalista Vítor Gonçalves. Senti que na sua contenção morava uma alma isenta e nobre que, de algum modo, desejava que o seu entrevistado se redimisse.
Mas era absolutamente impossível cumprir o guião. Ao entrevistado pouco interessavam as perguntas; as suas respostas apenas visavam encobrir as causas da megalomania que deixou um país de pantanas...
A certa altura, apeteceu-me regressar a Platão e reler os diálogos socráticos, em que o filósofo utiliza os seus interlocutores para os rebaixar, expondo-lhes a mediocridade e a sordidez dos seus pensamentos...
Sem público, Sócrates não existiria, e é isso que explica a necessidade de controlar o entrevistador, exigindo-lhe submissão e denegrindo-o.
Afinal, o público ama a megalomania e a hipocrisia do poder...

12.10.17

Em dois pés

Nada avança, nem sei se não será melhor assim.
À volta é só especulação e depressão!
Uns presos ao passado, outros a um futuro impossível.
Por mim, cansado de formular perguntas e de fazer reparos, creio que o melhor é desligar, e, de preferência, em dois pés, desatar a andar... seguro, no entanto,  de que não irei longe.
Até que um dia lá terão que se habituar!

11.10.17

Um romance com 4000 páginas é obra!

Bem sei que uns tantos juristas desistiram do Direito para se dedicarem à Literatura. Outros, como a Literatura não mata a fome, lá foram vivendo com um pé num lado e outro no outro, mas sem grande arruído...
Hoje, ouvi, no entanto, um advogado afirmar que a acusação no "caso Marquês" não passa de fantasia, de um romance com 4000 páginas...
Um romance com 4000 páginas é obra! O que é que terá passado pela cabeça do romancista? Não vai ser fácil encontrar leitores com tempo e fôlego para fruir tal obra... 
Face a tal desconchavo, vou esperar que o engenheiro Sócrates não seja condenado por ter escolhido mal o crítico literário. 
E já, agora, recomendo que uma obra de tal dimensão seja lida longe dos meios de comunicação, dita, social, para não envenenar a populaça...

10.10.17

Carles Puidgemont, uma figura messiânica?

Fui ler o artigo da Wikipédia sobre Carles Puigdemont i Casamajó, e o que me desperta a atenção é a sua formação, o seu percurso profissional e político centrados na identidade cultural catalã, como se estivesse a ser preparado para a cumprir o destino nacionalista... Uma figura messiânica?
Quanto à aspiração catalã de independência, ela não me surpreende, pois se não é tão antiga como a portuguesa, anda lá perto. Como se sabe, no século XVII, a restauração da independência portuguesa só foi possível graças à subjugação da Catalunha. Se os ventos independentistas tivessem soprado de outro modo, o rumo português teria sido certamente bem diferente!
Apesar de ser defensor de uma Ibéria reunida num estado federal, creio que, do ponto de vista português, no contexto atual, a Catalunha satisfaz as condições para declarar a sua independência e de que nada serve esperar que Castela lha reconheça...
O que me preocupa, no entanto, é o messianismo de que Carles Puidgemont parece investido...
(...)
Está declarado o estado de nevoeiro - temos agora um novo conceito: A República da Catalunha suspensa...

8.10.17

Na minha vida de campónio

O sargaço e o pilado

«Minha alma é lúcida e rica
E eu sou um mar de sargaço
              Fernando Pessoa

Compreender a ideia ( a metáfora) pressupõe uma experiência do leitor que, muitas vezes, este não detém.
No meu caso, por exemplo, levei algum tempo a interpretar o verso, pois nunca me passara pela cabeça que o sargaço pudesse ser uma alga utilizada como fertilizante, tal como o pilado (caranguejo voador)...
Na minha vida de campónio, o mar era uma miragem, os adubos químicos eram caros, e o único fertilizante natural era o estrume. 
Imagine-se, agora, que eu era aprendiz de poeta e ousava escrever "Minha alma é lúcida e rica» / E eu sou uma courela de estrume
Já estou a imaginar a jovem professora, algarvia e marítima, Lídia Jorge, a dizer-me "o menino está a assassinar a poesia..."

Em tempo de agricultura biológica, será que o jovem leitor ecologista terá tempo para recuar à época em que não havia adubos químicos e, sobretudo, para se googlar  e observar atentamente: 
Sargaço
Hoje, dispomos de tantas ferramentas que é pena que as escolas não estejam devidamente equipadas para suprir as insuficiências que nos distanciam de outrora... Por exemplo, amanhã, se quiser utilizar este post, o mais provável é que o computador tenha adormecido ou que o sinal de Internet seja tão fraco que a estratégia morra no momento... e a Escola a que me refiro, em particular, está localizada em Lisboa a 100 metros da sede da Altice - ou será da PT?