22.2.10

A ribeira do Funchal…

 Dia 29 de Outubro de 2004. Naquela data, pensei que havia alguma coisa de errado. Quase seca e suja, a ribeira destoava naquele jardim… como se tivesse sido esquecida. De súbito, acordou e afogou a cidade num mar de lama e de morte.

/MCG

21.2.10

Esc(re)ver…

Escrever, quando as forças da natureza reivindicam o espaço que lhes foi sonegado, ontem, na Madeira, hoje, sabe-se lá, no Continente, pode parecer um acto de alheamento. No entanto, escrever tanto pode ser sobre  leitos de rios, ribeiras e arroios que foram ocupados pela ignorância ou pela cobiça dos homens, sobre as encostas e as falésias a quem inadvertidamente matamos os socalcos ou sobre o alfaiate, que, sozinho, insiste em varrer o lodo Tejo e engolir todas as  minhocas que lhe surgem.
E também se pode escrever sobre o Poeta (D. M-F.) que anunciava ao mundo (ou seria às mulheres?): «Prazeres que prefere: os que o papel e a pele lhe proporcionam». Os prazeres tácteis, diria eu, de quem não resiste à tentação de sentir o mundo na ponta dos dedos!
Escrever é, assim, dar luz ora à pele ora ao osso, sem esquecer uma certa adiposidade que os  pode enredar. E a propósito, não posso deixar de me interrogar sobre a tradução do título de um filme de François Truffaut LA PEAU DOUCE, em português, ANGÚSTIA, estreado em Portugal a 8 de Outubro de 1965. A doce pele da jovem Nicole que incendeia e arruína Pierre Lachenay, traduzida em português, perde a força perturbadora que o corpo irradia para se transformar num sentimento decadente e irreversível – angústia. Malhas que o império tecia!

19.2.10

Uma boa notícia…

Fernando Nobre não tem qualquer hipótese de chegar à presidência! No entanto, vai obrigar os políticos a repensar as dimensões da acção política. No essencial, Fernando Nobre é herdeiro de Lurdes Pintassilgo cujo tempo político foi efémero… Será Fernando Nobre capaz retomar os valores da antiga primeira ministra?

16.2.10

O Tejo

 Nas estradas do passado, há uma que, a espaços, reaparece. O Tejo. Ultimamente, vem ocupando cada vez mais espaço. Aqui, em Alhandra, em dia chuvoso de Carnaval, o Tejo corre cinzento, cor de cimento… pronto a mudar de mãos com o consequente empobrecimento das populações ribeirinhas, já de si tão abandonadas. Os sinais de decadência estão à vista. Basta olhar as casas em ruína, a sinuosidade das vielas. Nem Deus se mostra disponível, tão íngreme é a escadaria! 
O Tejo devia ser uma via nobre e estruturante do nosso crescimento; pelo contrário, arrasta-se ora tímido ora revoltado sob o olhar indiferente dos governantes que só se lembram dele para construir mais uma via rápida, como se ele não passasse de um escolho... 

14.2.10

Caminhos II

De cima, não avisto o lugar onde outrora subia a estrada que se perdia na curva dos moinhos. Olhava a serra próxima que matava o horizonte; uma encosta, em labareda, cegava-me a vida. Se virava à esquerda, percorria dois, três kilómetros, e regressava à origem. Durante anos, a estrada orientou-me para a direita, levando-me a outro castelo, cujas muralhas se tornaram confidentes, muralhas fernandinas, outrora testemunhas da barbárie de D. Pedro I, ali, na janela do Condestável, em nome de amores proibidos ou imaginados…, também eu fui atirado à vida por insuficiente fé.
De regresso à origem, sem consciência da minha vizinhança com Pedro Álvares Cabral, jazente na Graça, deixei de virar à esquerda ou à direita, e passei a caminhar em frente, desembocando nas margens do Nabão, donde, na encosta, observava o Convento de Cristo, como se este ali estivesse para me obrigar a reflectir sobre a fé que nunca compreendera…
À esquerda, à direita, ao centro… sempre o castelo e a encosta que me cegavam a vida. E lá longe, lá em cima, ficam África e o Brasil… e eu continuo aqui em baixo. Sem fé em Deus e nos homens. Até quando? Só os caminhos continuam a levar-me…

13.2.10

Caminhos de Ourém

Do terramoto de 1755, sobrou apenas o túmulo do IV conde de Ourém, neto de Nuno Álvares Pereira e de D.João I. No entanto, logo no reinado de D. José, este mandou reconstruir castelo e igreja. 

Castelo, túmulo e pelourinho evidenciam a riqueza herdada de D. Nuno Álvares, senhor quase absoluto do território, em paga do seu patriotismo, entre 1380 e 1385. O seu neto viaja  para terras de Sabóia e de Itália e consigo traz o estilo italiano, visível no castelo e pelourinho ( a águia de Sabóia).

A abertura à Europa, começou cedo, apesar de, quase simultaneamente, lhe termos voltado as costas. A sombra de Espanha atirou-nos ao Atlântico e, logo que nos distraímos, lançou-nos nos braços dos jesuítas.

/MCG

11.2.10

Preocupante

Vivemos um tempo em que todos temos opinião sem sentirmos necessidade de a fundamentar. Deixámos de procurar e ponderar argumentos. Os bons e os maus exemplos da História não nos interessam minimamente. Acreditamos piamente nos nossos caprichos e desvalorizamos por inteiro o estudo e o trabalho. A paródia tornou-se o género predilecto.

Ora, como bem sabemos, a paródia sempre recorreu à manipulação dos dados e ao empastelamento da informação. Em Portugal,  a paródia é um género antigo e temível. Actua à sombra da liberdade de expressão e não resiste a censurar ou até em liquidar o alvo.

Paradoxalmente, a paródia está a matar a caricatura.