1.7.07

No Maranhão, terra de maranhas...


Por (de)formação profissional poder-se ia pensar no lugar onde o Padre António Vieira proferiu o famoso "Sermão de Santo António aos Peixes" e também donde enviou as famosas "Cartas do Maranhão" a El-Rei D. João IV, a partir de 1654. Não. Estou a referir-me à Barragem do Maranhão, situada no concelho de Avis, a 165 Km de Lisboa.
Lá decorreu, neste fim-de-semana, uma interessante competição de remo, "patrocinada" pelo Mestre de Avis. Havia dezenas de remadores, de ambos os sexos, um pouco de toda a parte: Barreiro, Setúbal, Figueira da Foz, Gondomar, Póvoa do Varzim... O associativismo continua vivo! A organização local esforçou-se por ultrapassar a falta de meios e de apoio federativo... Mas, se não fosse assim, não estaríamos em Portugal!
O Parque de Campismo Municipal, em remodelação, oferece sossego e boas instalações aos campistas, apesar de, por exemplo, para ter pão a um Domingo, ser necessário requerê-lo à 6ª feira. Mas onde estaríamos nós se não fosse asssim?
Lá, no quase deserto Maranhão, ainda é possível observar as aves de rapina, protegidas pela serra alentejana, e alimentadas por reses desafortunadas e pelas águas cada vez mais abundantes.
Triste está o casco histórico de Avis, sobretudo no que respeita ao património medieval. E é pena! A Rua da Mouraria, onde ficaria a casa do Mestre de Avis, merece ser conservada de outro modo. A não ser que a ligação do Mestre a Avis não passe de uma patranha ou de uma maranha. Afinal "maranha"pode significar "intriga", "enredo" e maranhão "grande mentira". O topónimo consagraria, deste modo, um lugar em que os seus habitantes seriam dados à arte de enredar no sentido denotativo e conotativo. E talvez algum dos habitantes de Avis, aventureiro ou forçado, tenha um dia aportado às terras de Vera Cruz e dando expressão à maledicência lusa tenha entendido por lá replicar as maranhas, permitindo que o Padre António Vieira escrevesse ao Rei D. João IV: «Tudo neste Estado - o Maranhão - tem destruído a demasiada cobiça dos que governam, e ainda depois de tão acabado não acabam de continuar os meios de mais o consumir - Palvras visionárias que, afinal, não anunciavam o V Império, mas o saque contínuo dessa emaranhada raça que persiste por esse mundo fora.

1 comentário:

  1. Este fim-de-semana, pelo que se lê, foi pródigo em quilómetros. Por certo, terei eu andado mais, e mais a correr - à falta de sossego de uma auto-caravana, que falta, e de duas infantes criaturas em permanente desassossego!
    Andei, pois, bastante, desviando-me de destinos pré-anunciados, assim ao deus-dará, sem preocupações toponímicas, sem cogitações literárias.
    Andei por Óbidos, pela enésima vez, subindo empedradas ruas, descendo labirínticos tempos, confluência de viagens antigas com hodiernos multibancos a esboçar sorrisos a quem passa. Ali, com saber e oportunidade, atrai-se dinheiro. Do chocolate à feira medieval já em preparação, a história vinga(-se).
    Dali fui a Peniche, passei pelo Forte, revisitei na memória as muitas celas metamorfoseadas por Manuel Tiago, e rumei ao Cabo, dito de Carvoeiro, onde parece constar um santuário da Srª dos Remédios, paredes-meias com um pólo da Universidade de Leiria, um Instituto qualquer vocacionado para as coisas do mar, e com um farol, lindo e renovado, e, depois, o largo do Cabo, quase deserto, com as Berlengas ao fundo, inspirando... Em vez do restaurante, que ali apodrece, esventradamente abandonado, duas caravanas matam a sede ao visitante, aos pescadores de cana que se afoitam pelos contornos fundos das rochas até ao mar, aos agentes da PSP que por ali passam e ali se cruzam.
    Isto tudo foi num dia, que no outro, voltei-me para o Alentejo. Rocei por Grândola (com a memória ainda fresca de Peniche e do seu forte) e deixei-me arrastar para o interior do Badoca Park, espécie de zoo com safari à mão. O dia estava óptimo. Havia calor, havia animais, havia poeira... o sabor da terra trazido assim de repente de uma infância distante, com histórias à mistura num safari de gente pequena com quénias em lista de espera.
    Ah, e ainda tentei Sines, mas com inversão de marcha na primeira rotunda à vista, que também ali as há, com saída assinalada para Lisboa, mesmo para quem desiste de entrar, como foi o caso, não fosse dar-se o caso de mandarem abaixo a ponte antes mesmo do regresso...
    Pronto, não houve Pe. António Vieira, nem quinto império visionado, mas houve terra desbravada...

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