21.10.21

António Lobo Antunes não conta, desconta...

 A quem desconheça a história do PCP e, em particular, a biografia do seu militante e dirigente, Júlio Fogaça (1907-1980) de pouco servirá navegar nas páginas do romance Dicionário da Linguagem das Flores, de António Lobo Antunes (Outubro 2020).
De facto, o romancista não conta, poderá dizer-se, talvez, que desconta a vida de Júlio Fogaça, toda feita de partículas deixadas cair em espaços, umas vezes falsamente burgueses, outras miseravelmente proletários, ora ribeirinhos ora de sequeiro…
Aos poucos, o leitor vai navegando nos círculos concentracionários, do mais amplo para o mais reduzido… E nesse aspeto, o Partido move-se no interior do Estado Novo em círculos fechados, desenhados de forma claustrofóbica, onde as relações heterossexuais são de fachada para confundir os olheiros do grande círculo e para sossegar os controleiros do Partido; apenas a homossexualidade negada vai ganhando peso na luta interna comunista, não tendo o escritor tido coragem de denunciar, de narrar o que, na verdade, aconteceu a Júlio Fogaça a partir de 1960. Ficou-se pelas flores, belíssimas, por vezes, mas que com o tempo vão murchando… E, por lado, não é fácil colhê-las num dicionário, onde ninguém espera encontrar  a alma...

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