Os sinais e as provas da violência acumulam-se a cada dia que passa. A comunicação social e as redes sociais ampliam-na e parasitam-na, e nós que fazemos? Passado o estremecimento, analisamos a violência como um instituto autónomo assente num grupo de assassinos e terroristas possuídos por uma mente doentia e destruidora. Isolamos a violência, e recusamos ver as causas por mais evidentes que elas sejam...
Ora os indivíduos, que, a cada passo, sacrificam os mais fragilizados, são seres ressentidos porque, afinal, apesar de todas as promessas de igualdade e de liberdade, se veem condenados a viver num mundo que os atira para a miséria ou que os marginaliza pelas mais variadas razões...
Em Portugal, o ressentimento cresce e a violência só pode aumentar. Não há qualquer panaceia para este problema. Por mais que se pense que uma melhor educação pode minorar a questão, a sabedoria popular diz precisamente o contrário: Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão.
E de nada serve fazer promessas, traçar futuros de esperança, se não formos capazes de lidar com o desfasamento entre o virtual e o real.
A este propósito, hoje vou citar a nota de rodapé nº 39 da obra de James Wood, A Mecânica da Ficção:
«A análise do ressentimento feita por Dostoiévski tem uma enorme relevância para os nossos problemas actuais. O terrorismo é, claramente, o triunfo do ressentimento (por vezes justificado); os homens na clandestinidade e os revolucionários russos de Dostoiévski são essencialmente terroristas. Sonham vingar-se de sociedades que lhes parecem demasiado brandas para merecer clemência. Tal como o narrador de Notas do Submundo «admira» o oficial de cavalaria que odeia, talvez haja um certo tipo de fundamentalista islâmico que odeia e «admira» o Ocidente secular, e odeia-o precisamente por o admirar ( odeia-o segundo o sistema psicológico de Dostoiévski, porque no passado foi beneficiado por ele - com as vantagens da medicina, ou a tecnologia necessária para pilotar aviões contra edifícios, por exemplo).»
De facto, o ressentimento não é apenas uma característica do fundamentalista islâmico, é uma característica de qualquer tipo de fundamentalismo, público ou doméstico. Sempre que o homem ama, ou mesmo possui, e se vê despojado do objeto de desejo, abre-se o pórtico do ressentimento para a avenida da violência... O ciúme, a raiva, o grito são os sinais.
Mas quem quer saber? É mais fácil acusar e condenar.