23.11.13

A pátria mesta

«Em virtude do Rei, da pátria mesta,
Da lealdade já por vós negada,
Vencerei não só estes adversários,
Mas quantos a meu Rei forem contrários!»
                 Os Lusíadas, Canto IV, estância 19

Este Nuno Álvares, que não tem dúvidas sobre qual deve ser o seu papel no combate aos inimigos externos e internos, em nada se assemelha a Nuno Crato que serve a todo o tempo interesses privados, sejam nacionais ou internacionais. Claro que Crato também serve o seu rei, vassalo da Troika!

Triste tempo, em que, não sendo mais possível nem aconselhável erguer a Excalibur, insistimos em jogos de poder, em  vez de desenhar uma estratégia de unidade que nos permita senão superar pelo menos imitar a Irlanda. 

'Sperança consumada,
S. Portugal em ser,
Ergue a luz da tua espada
Para a estrada se ver!
                 Mensagem, Nun'Álvares Pereira


22.11.13

PACC - modelo - componente comum. Um incidente crítico?

Fui ler a Prova modelo e fiquei esclarecido. 
O objetivo é afastar, numa 1ª fase, todos aqueles que ainda encaram a escola como um lugar de aprendizagem responsável e que pensam que podem construir o ensino, tendo como âncoras não só o conhecimento atualizado, as novas tecnologias e, sobretudo, o aluno e as suas circunstâncias...

Há muito que defendo que a orientação do ensino está entregue a burocratas de gabinete partidário ou, em último caso, a arrivistas que desprezam tudo o que não tem origem nos modelos pavlovianos mais retrógrados. Só assim se justifica que o "modelo" apresentado seja o mesmo que já é aplicado tanto ao 4º ano como ao 12º ano de escolaridade. A matriz é a mesma!

O que mais intranquiliza é não se saber qual é o organismo (o IAVE.I.P?) que decide quais são «os conhecimentos e capacidades considerados essenciais para a docência». Qual é o papel das universidades? Qual é o papel das unidades orgânicas que se dedicam às ciências da educação?
Quanto ao objeto da prova, a sua especificação é vaga, citando os tradicionais estereótipos. Nada é concreto! Quem espera uma orientação, o melhor é começar a procurar um explicador formatado numa academia maoísta, se ainda existe alguma...
Há ali, no entanto, uma locução reveladora da doutrina subjacente: «um pensamento crítico orientado». Alguém deveria ter informado o relator que "pensar" sem capacidade de discriminar e valorar é absurdo. Pensar pressupõe orientação e capacidade crítica. Sem elas, caímos na fantasia ou, pior, no despotismo. De nada serve acrescentar adjetivos ao pensamento...
Os itens de escolha múltipla apresentados só podem ser pasto de humoristas pouco inspirados!
E quanto ao item de resposta extensa, se quisessem abordar o tema da tolerância em contexto escolar, então teriam escolhido um «incidente crítico"...   

Omissões e enigmas

«Em 1959, data do início da correspondência, já Miguéis era tido como um autor consagrado, recebendo nesse ano o prestigioso prémio Camilo Castelo Branco pela publicação de Léah e Outras Histórias, para não falarmos no prémio da Casa da Imprensa atribuído a Páscoa Feliz, cuja 1ª edição remonta a 1932, ou Onde a Noite se Acaba (contos, 1946)...»José Albino Pereira (organização e notas), José Rodrigues Miguéis - correspondência 1959 - 1971 - José Saramago, Caminho, 2010

Entre 1959-1971, Saramago desempenhou funções de «diretor literário» na Editorial Estúdios Cor, Lda que publicou a maioria das obras de Miguéis em Portugal.
Saramago "obrigado" a ler as obras do seu exigente amigo Miguéis, desse longo convívio terá certamente recebido alguma influência.Veja-se,a propósito, A VIAGEM DO ELEFANTE (2008), em que o autor se interroga sobre «umas pequenas esculturas de madeira posta em fila» alusivas à viagem do elefante que em 1551 foi levado de Lisboa para Viena, e agradece a Gilda Lopes Encarnação, leitora de Português na Universidade de Salzburgo, o convite que lhe fizera... 
O que Saramago não refere é que o seu amigo Miguéis já nos tinha presenteado, no conto ENIGMA , que integra a obra ONDE A NOITE SE ACABA, com um elefante e respetivo cornaca.

«Aquela noite não foi porém tranquila. Ch. Brown sonhou, coisa inquietante, embora nem tudo fosse propriamente sinistro nos seus sonhos. Sentiu-se a dada altura deliciosamente balouçado, quase com suspeita volúpia, no fofo palanquim dum elefante em marcha. (...) De repente, a um grito do cornaca - mongol de olhinhos pequenos, irónicos e vivos, no qual reconhecia disfarçado, o antiquário Fishbein - o elefante estacava, punha o joelho em terra, e o professor pulava com ligeireza no chão macio, encantado com o passeio.»

Elefantes e cornacas fervilham nas Mil e Uma Noites, por isso o melhor é seguir-lhes o rasto...

De facto, o mais fácil é omitir e, em Portugal, esquece-se com facilidade a obra de José Rodrigues Miguéis! Na última semana, e sem pensar no assunto, dei conta de pelo menos três omissões... Em matéria de educação literária, não colhe esquecer Miguéis, um homem formado em pedagogia, mas que se viu impedido de a aplicar no seu país, tendo, contudo, votado a vida a escrever histórias de «exemplo e proveito»
Ultimamente, os sinais são todos anti-pedagógicos! Basta ler a proposta de Metas e de Programa da disciplina de Português para o ensino secundário, sem esquecer a Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades, que, por si só, destrói qualquer intuito pedagógico...
O elefante e o cornaca eram bem mais inteligentes!  

21.11.13

Em dia de protestos

I - Em dia de protestos, passada a euforia do apuramento para o mundial e da divinização do CR7, promovido a comandante boliviano, Mário Soares regressa à Aula Magna para defender a violência como solução.
No entanto, Soares deveria saber que a solução não passa pela violência, mas, sim, pela união das forças políticas, até porque a adesão à União europeia por ele conduzida é causa direta da atual situação, pois os dirigentes da época não souberam gerir a riqueza que, entretanto, inundou o país.
A apropriação dessa riqueza pela nova classe política e financeira não escandalizou os sucessivos governos que, preocupados com a conservação do poder, foram alargando as desigualdades, deixando-se corromper pelo ouro europeu que iam trocando pelo desmantelamento dos sectores produtivos.
Habituado ao endeusamento, Mário Soares cavalga a onda do descontentamento, imaginando que ainda vai a tempo de reescrever a História que lhe ditou a derrota perante o seu inimigo maior - Cavaco Silva - político medíocre e medroso, o que não abona nada a seu favor.

II - As polícias, provavelmente ao subirem as escadarias da Assembleia da República, não estariam conscientes de que, no mesmo momento, estavam ser "utilizadas" na Aula Magna por alguém que nem sempre as respeitou.

III - De Seguro, não se conhece o paradeiro. Vai, contudo, ter que se o mover. Se o não fizer, acabará na voragem...

20.11.13

Partitura inacabada

Há dias que não se sabe quando começam e muitos menos quando acabam! Dias preenchidos por uma sucessão de atos, uns domésticos outros públicos, que, de comum, têm a noção do dever, apesar da exaustão e da incompreensão...
Insiste-se num caminho de rigor e de seriedade, mas, como contrapartida, recebemos gestos de enfado e de abandalhamento. 
Apesar de ainda encontrarmos almas cândidas, tudo não passa de um jogo de silêncios e de palavras comprometidas...
As horas esgotam-se, a vista cada vez mais turva, a língua presa, tudo letras de uma partitura inacabada...

19.11.13

A PACC e a situação

Apesar das horas agitadas que passei esta esta tarde, agora que o silêncio impera, recordo a colega que me abordou durante a manhã, perguntando-me, de chofre, o que eu pensava sobre a situação. Abri os olhos, surpreendido, pensando que estava de regresso ao Estado Novo.
Na verdade, a colega queria que lhe dissesse o que pensava sobre a nova PACC - Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades. De súbito, compreendi que aquela senhora com cerca de 40 anos se via obrigada a prestar uma prova sobre matérias indefinidas e de resposta unívoca. Conheço-a há anos, tendo como função acompanhar alunos com dificuldades específicas de aprendizagem... Durante todo esse tempo entregaram ao seu cuidado alunos com todo o tipo de problemas, mantendo-a como contratada, condenando-a à precariedade e, sobretudo, pondo em questão todo o trabalho desenvolvido ao longo dos anos.
Quando a colega me interpelou, encontrava-me a analisar a legislação que, entre outros efeitos, altera o Estatuto da Carreira Docente, abrindo a porta à arbitrariedade. De futuro, é possível sujeitar todos os docentes a este tipo de prova, facilitando o despedimento, fundamentado numa avaliação episódica de conhecimentos e de capacidades... 
E duas questões se me colocavam: 
- Qual foi a autoridade científica e pedagógica que certificou o IAE.IP?
- Como é que se explica a ordem dos termos na sigla PACC? Primeiro, Conhecimentos e depois Capacidades?
 Finalmente, o que é feito da autonomia científica e pedagógica das Universidades que formam milhares e milhares de docentes? Como é que se explica o silêncio dos conselhos científicos?

18.11.13

Salpicado pelo mafarrico

Não sei se indique primeiro o lugar se a hora nem sei se isso importa. O facto é que às 7h30 já estava sentado na mesa do canto do Nortex. Ou será Nortada? Com a idade, vou deixando de ter certezas, para gáudio dos meus alunos, esses, sim, sempre seguros, pois na memória deles há sempre um professor - verdade, uma espécie de crato dos tempos modernos.
Lembro que, por hábito, me sento mais perto da porta de saída. Ou será de entrada? Mas hoje a mesa estava ocupada, o que não me incomoda, ao contrário de um ilustre antecessor que tinha sofá reservado no velho Liceu Camões. Esta ideia de reservar lugar já lhe era habitual, pois em Évora, também tinha uma mesa do canto para si, à semelhança dos latifundiários que assentavam arraiais no Arcada...
(Esta última referência cai aqui porque, na última terça feira, o existencial fantasma sentou-se não numa cadeira ou num sofá mas num canapé em pleno Coliseu lisboeta. Curiosamente, nessa noite assisti, divertido, a um jogo de cadeiras e carteiras que me deu que pensar.. saídas das salas, vi-as nas galerias, nos pátios... cheguei a pensar que o Ionesco teria assaltado o Camões, não o que não tinha onde cair morto, mas o outro, em E, por enquanto aberto... as vogais portuguesas são, como a mãe, traiçoeiras! Boa pergunta! Quem será a mãe destas caprichosas vogais?)
De regresso ao lugar de partida e respeitando a ordem dos acontecimentos, ainda sem o inspirador Correio da Manhã, dei comigo ( com quem havia de ser?) a olhar televisivamente para "treze toneladas de agricultura biológica" colocadas em pontos de venda, semanalmente, e pensei que a agricultura está cada vez mais pesada. Diz a cristas que a agricultura tem cada vez mais peso na produção nacional! Talvez por isso apeteceu-me sair dali e ir comprar uma dúzia de galinhas poedeiras e dedicar-me à produção de ovos biológicos...
Claro que ainda não é desta, pois comecei a pensar no escoamento dos ovos, se haveria ovos sintéticos; comecei a pensar nas velhas lagartas biológicas  da minha infância que me davam cabo da horta. 
Sim, porque, antes do horto e da vinha do senhor, os meus dias eram passados a mondar e a regar a horta... Dias salpicados pelo mafarrico!