8.3.20

Há sempre uma árvore

Quando a tensão sobe e a enxaqueca se instala, saio antes que a irritação assente arraiais…
Enquanto caminho, sossego. Há sempre uma árvore que desvia a minha atenção do desaforo comunicacional em que qualquer cidadão dá palpites sobre o que não sabe e, sobretudo, aproveita para ajustar as contas de uma casa em que todos ralham e ninguém tem razão.
A árvore que encontrei no meu desvio obriga-me a pensar na cor que não sei definir e na leveza do seu existir - apetece-me ser árvore.

7.3.20

Não matem a esperança!

Figos de Março
Gosto desta figueira. Não espera pela chegada da primavera e, para nos surpreender, esconde a flor… Indiferente às abelhas e às borboletas, parece apostada em dizer-nos que há outros caminhos, mesmo que, no final do ciclo, os frutos não satisfaçam a nossa expectativa.
No jardim Almeida Garrett, esta figueira contraria a lição do Poeta - das Flores sem Fruto.
Para mim, esta figueira frutifica para nos lembrar que não devemos matar a esperança, mesmo que os frutos não cheguem a cair de maduros…
(…)
A esperança, no entanto, não deve ser cega. Melhor seria que não esperássemos pelo calor para combater o COVID 19... 

5.3.20

Quem vê caras...

Lisboa, Rua Filipe Folque
Parece que há uma directiva que exige que certas fachadas sejam preservadas...
Um pouco por todo o lado, as obras vão decorrendo escondidas pelas fachadas...
Por mim, se a obra é nova e nobre, esta deveria assumir o rosto de quem a arquitectou...
Creio que esta decisão de manter a frontaria de certos edifícios, apesar de assegurar a ligação com o passado, esconde outros benefícios para quem investe, desenha e constrói... 
É possível que eu não tenha razão. No entanto, lá diz o povo "Quem vê caras não vê corações.»
Por estes dias de incerteza, dou comigo a observar os rostos e não consigo descortinar-lhes os segredos. Fechados, os rostos e os segredos.

4.3.20

A incerteza

À sorte e ao azar, há agora que acrescentar a incerteza…
Já não é tanto o Fado que preside à vida individual e coletiva…são mais as escolhas,  que fazemos e que nos habituámos a considerar seguras, que, num ápice, podem escancarar-nos a porta da dúvida e do medo.
Assim, passamos a suspeitar de tudo e de todos, avançamos sem saber se em cada esquina vamos encontrar um amigo ou o inimigo…
De qualquer modo, a incerteza sempre foi o caminho. 

1.3.20

Março, marçagão...

Entrámos em março, mês que, hoje, não confirma a tradição. Cumpre quanto ao inverno, mas esqueceu-se do verão...
O COVID-19 expande-se alheio às fronteiras, tal como os migrantes rompem o arame farpado, mesmo que novos muros os esperem, numa luta de morte...
O COVID-19 e as hordas de migrantes são a expressão de territórios de exploração intensiva de recursos... 
E nós? Nem o Medo nos faz repensar o caminho...
Março promete sol e vida, mas hoje não! 

29.2.20

Em ano bissexto

Nunca se sabe o que nos espera… o próprio espírito santo anda em dificuldades. O pai deixa-o marinar, mas baixinho, porque os desígnios divinos foram subvertidos pelo filho-homem...
A galeria dos rebeldes é extensa, de orfeu a sísifo sem esquecer prometeu… todos eles, no entanto, sofrem o divino castigo. Só não sei se o cumprem neste dia, em ano bissexto.
Eu cumpro-o, sem dúvida, embora devagarinho para não incomodar as aves que por aqui passam… até porque para o ano…

27.2.20

É um outro

Quem aqui escreve não sou eu, é um outro que, em certos dias, não sabe ao que anda. Vai andando, mas volta sempre atrás… parece que os grilhões são elásticos, mas só até um certo ponto…
O problema é que o eu já percebeu que o ponto não é assunto seu. É um outro quem o determina, mas não aquele que não sabe ao que anda… 
E esse outro é mais do que uma ideia, é o referente que vive em parte incerta, mas sempre para lá da linha invisível que poderia esclarecer esta desfiguração.
Em suma, sem encontrar o rosto, o eu vê-se desfigurado e é quanto lhe basta, por agora.