30.5.21

O primeiro espelho


De tempos a tempos, regresso ao espelho do móvel do quarto fronteiro da primeira casa. Via-se da cama, sob o olhar do Sagrado Coração de Jesus - o espelho refletia um rapazola já crescido, que preferia não se fantasiar, por causa dos fantasmas noturnos que cavalgavam no sótão. Imagine-se o sótão!
De qualquer modo, aquele não era o primeiro espelho... antes, nas camaratas, havia uma série de espelhos mais ou menos particulares, mas só de meio corpo - o rosto distinguia-se, por uma ou outra careta, tímida..., bexigoso. Relembro, agora, que na 'camioneta da carreira', as janelas, em certos momentos, também  distorciam, ou era o estigmatismo que traía o olhar?
No entanto, o freudiano dos primeiros meses não consegue relembrar o espelho inicial, anterior à locomoção e mesmo â verbalização. Escondeu as imagens iniciais dum outro quarto, do fundo, voltado à Serra, inacessível, felizmente!
Sobram, assim, as toalhas de água dos ribeiros e dos poços, pejados de líquenes e, por vezes, de demónios atirados do alto da casa das cobras por algum apóstolo do Sagrado Coração de Jesus... Aí, sim, havia alguma surpresa e algum pavor... a invisibilidade não passava de uma quimera.

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