11.12.19

Piprô

Árvore. Talvez, eu não consiga atribuir-lhe qualquer relação com o sagrado, ou não queira envolver-me nessa hierofania, que permitiria colocá-la, lá longe, na Índia, como expressão da amizade entre irmãos de ambos os sexos.
Se me deixasse de hesitações, diria que esta árvore foi classificada como 'ficus religiosa' ou, noutra versão, como figueira do pagode, sem dança, apenas como celebração própria de um templo hindu.
Custa-me aceitar o sagrado, quando ele não é capaz de modificar sociedades, em que a defesa da honra autoriza a lapidação e deixa a violação impune.

10.12.19

Com ou sem marquês

Com ou sem marquês, bom seria que nesta quadra não persistíssemos no fervor das iluminações…
Pode parecer bonito, mas fica caro!
Quanto custam as iluminações de Lisboa? Será que a despesa não seria suficiente para retirar dos hospitais e das ruas todos aqueles que pelas mais diversas razões foram e vivem abandonados?


«José Lopes foi encontrado morto na tenda onde vivia, nos arrabaldes de Sintra, junto a uma estação de comboios. As causas não são conhecidas, nem sequer o dia ou a hora exatas da sua morte. Aos 61 anos, o ator vivia com as maiores dificuldades, e a notícia de que um amigo deu com ele um par de dias depois de se ter finado circulou nas redes sociais, com as mensagens de pesar misturando-se com a prece a um deus-remorso. »

9.12.19

São diferentes, valha-nos isso...

Um medronheiro na Portela!?

João Gama, da delegação da DRAPC da Sertã e responsável pelo núcleo da Pampilhosa da Serra salienta que “esta é uma cultura ainda pouco estudada, sendo uma planta difícil de apreender porque tem um ciclo muito diferente do habitual, com a floração a ocorrer ao mesmo tempo da frutificação, só perde algumas folhas na primavera e o fruto leva 11 meses a amadurecer é, assim, muito diferente das outras fruteiras, não há mais nenhuma igual”. 

Se tudo fosse igual, seria uma chatice!
E este também não é pardal! Ainda bem!

Não vem a propósito, mas surgiu-me agora um novo provérbio adequado à estupidez dos últimos tempos: 
A franga canta porque quer galo! O PAN assobia porque quer galho!

8.12.19

Talvez por ser domingo...


(…)

Zeus destruirá também essa raça de humanos de fala articulada,

quando acabarem nascendo já com as têmporas grisalhas.

Nem o pai será concorde com os filhos, nem os filhos com o pai,
nem hóspede com anfitrião, nem companheiro com companheiro;

nem um irmão será querido, tal como era antes.

Desprezarão os pais logo que envelheçam,

e vão repreendê-los proferindo duras palavras,

os cruéis, ignorando a vingança divina; e nem mesmo

 dariam aos velhos pais retorno pelo alimento que tiveram na infância.

O direito da força: um saqueará do outro a cidade.

Nenhum apreço haverá por quem é fiel aos juramentos, pelo justo.

ou pelo bom: antes o malfeitor e o homem - violência

honrarão. A sentença estará na força; reverência

 não existirá. O cobarde fará mal ao homem de maior valor

 com discursos tortuosos, e a seguir dirá “juro”.

 A inveja todos os humanos miseráveis

 acompanhará, voz dissonante, face odiosa, comprazendo-se no mal.

 Será então que, da terra de largos caminhos, partindo para o Olimpo,

 a bela tez a cobrir com véus brancos,

 irão ter com a tribo dos imortais, deixando os humanos,

Reverência e Indignação. E ficarão para trás dores amargas

para os humanos perecíveis: não haverá defesa contra o mal.

Hesíodo (meados do séc. VII a C.), excerto de Os Trabalhos e os Dias, O mito das cinco raças

Talvez por ser domingo, resolvi visitar Hesíodo porque, como diz a tradição, ele terá vencido Homero num concurso poético, pois preferia a paz e o trabalho à guerra e ao combate.


7.12.19

Com Nuno, guerreiro ou santo

Com Nuno, guerreiro ou santo, a cidade também vive às costas dele…
Consta que era excessivamente puritano e inimigo das mulheres e que, apesar de tudo, não se dava nada mal com os fidalgos castelhanos…
É difícil acreditar em tudo o que se diz, e isso já nada importa, o que vale é ouvir-lhe a história e deixar-se levar pelo brilho da cidade e ainda pelo espanto de ouvir um brejeiro adolescente espanhol ensaiar para um público familiar a primeira quadra de um soneto - aplaudida com entusiasmo…
Que pena não ter o ouvido do Fernão Lopes!

6.12.19

Nada falta nem a língua de pau!

Já não é o leão que ruge. Está em extinção, o rei da selva! À falta dela, nem o circo ou o zoo o podem salvar... Domesticá-lo também não faz sentido, a não ser em Alvalade.
Ligo a televisão e vai por aí uma tal confusão, com uns a entrar e outros sair, que já não sei para que servem as igrejas e os tribunais - tudo se passa no mundo virtual.
Nada falta nem a língua de pau!
Só uns tantos estão a mais - os idosos, os reformados, os doentes, os sem-abrigo, os desempregados, os precários, os enfermeiros, os professores, os polícias, os agricultores, os pescadores e até uma boa parte dos doutores… De qualquer modo, os sicários já começaram a afiar as facas.
E ainda se queixam do clima! Viva o Menino Jesus e o negócio do Natal! 

5.12.19

Zurzidela

«Na vida de hoje, o mundo só pertence aos estúpidos, aos insensíveis e aos agitados. O direito a viver e a triunfar conquista-se hoje quase pelos mesmos processos por que se conquista o internamento num manicómio: a incapacidade de pensar, a amoralidade, e a hiperexcitação.» Bernardo Soares, Livro do Desassossego

Já só há um manicómio, a Terra toda - o planeta dos estúpidos, onde 'os inteligentes são igualmente estúpidos' Fazer-se passar por inteligente deixou de ser necessário à falta de interlocutor… Só o silêncio poderá pôr cobro à vertigem destruidora…
No entanto, até o silêncio é estúpido porque é humano. Já pensei em medir o silêncio, mas sou incapaz porque não consigo libertar-me desta tendência para zurzir a torto e a direito...