Curioso, consultei http://www.dicionarioinformal.com.br, onde é possível encontrar o dicionário de língua portuguesa mais atrevido que conheço e, para espanto meu, fazer-se de mula surge por definir. Deixo essa tarefa ao António Souto, verdadeiro apreciador do vernáculo luso, embora me pareça que, nos tempos que correm, extintos os almocreves, as mulas andam desaparecidas. Os próprios burros são hoje mais protegidos e não creio que alguém esteja disposto a fazer-se de burro..
De Lisboa à Ria Formosa, não encontrei sombra de mula, apenas meia dúzia de cavalos (seriam machos?) pastavam pachorrentamente num improvisado prado… Eu próprio, em tempos de meninice, fui actor de uma triste história em que um cavalo se fez passar por mula. No caso, uma velha mula que não se aguentava nas patas foi por mim vendida a um magarefe por 50 escudos.
Uma mula que tinha por mim verdadeira estima, que nunca me deixou ficar mal, ao contrário de umas burras azougadas que me infernizavam as jornadas. E eu traí-a… e isso aborrece-me mais do que saber se tenho muitos ou poucos amigos…
Claro está que o António Souto não tem qualquer responsabilidade nesta súbita confissão. E não vou desejar “um bom ano” porque não quero perder os amigos…
Ora aí está como nem sempre os bons dicionários nos aconchegam a curiosidade... A verdade é que não fui a nenhum, vali-me somente da memória e tenho a certeza de que assim se dizia ou, em alternativa, "armar-se em mula". Também os espanhóis utilizam a expressão "hacerse la mula" ou a equivalente "hacerse el remolón". Mas prometo que hei-de consultar quanto houver de idiotismos para me certificar deste registo.
ResponderEliminarE como ela se aplica na perfeição (porque tem um sentido bastante vasto) a isto de vender conscientemente cavalo por mula (isto é, cavalo por lebre)...
E quanto a votos, o recado tinha destinatários certos - aqueles que por natureza fingem lembrar-se de alguém quando e apenas alguém se não esquece deles, no natal como no carnaval como na páscoa como no dia de aniversário como no dia da morte...
Dos demais, de quantos sabemos não sofrerem de amnésia, não fazem falta os votos porque os sabemos sempre próximos. Amén.
Na FNAC do Centro Comercial Allegro, abri, ao/por acaso um dicionário intitulado Novos Dicionários de Expressões Idiomáticas, de António Nogueira Santos (Edições João Sá da Costa).
ResponderEliminarNa entrada nº 7167, lê-se: "fazer-se mula" (pop.): proceder com manha, dissimulação, escondendo as suas intenções, fingindo não perceber o que se diz, evitando responsabilidades ou trabalho.
Na entrada nº 7169, lê-se ainda: "ser muito/uma grande mula" (pop.): diz-se de pessoa muito manhosa, dissimulada.
Pronto, não sou o único a registar tal expressão, ainda que com preposição "fazer-se de mula" (variação/variante?), a que poderia ainda acrescentar "armar-se em mula".
Eram (ou são ainda) expressões que, como escrevi, há muito se diziam na minha terra, em Angeja (e terras envolventes). Populares, com certeza, quiçá regionalismos. A verdade é que também encontrei na net expressão igual registada por alentejano.
Idiotismos é coisa que não falta a uma língua!