Li algures que «o romancista vai sempre além da realidade!»
Este é o tipo de afirmação que não consigo entender! O que é que pode haver para lá da realidade? Ou aquém da realidade?
Pensava eu que a grande frustração do romancista seria a consciência da impossibilidade de captar a realidade. E como exemplo, lembro o Poeta que procurou «ser tudo de todas as maneiras» e, ao fazê-lo, estilhaçou as leis do género, porque a verdade lhe escapou irremediavelmente. Pensava ele que teria escrito um «drama» em gente ou sem gente. Na verdade, o Poeta deixou-nos um romance, um lugar (uma arca) onde cabem todas as coisas desde que Platão inventou os diálogos socráticos.
Se eu fosse romancista viveria desesperado pois a realidade é tão múltipla que não saberia como a capturar. Mesmo Penélope desfazia, todas as manhãs, o seu bordado não porque fugisse do casamento com um dos zelosos e sanguíneos pretendentes ( ou porque muito amasse o estouvado Ulisses), mas porque não sabia como entrelaçar as malhas que a prendiam à ambição e cobiça desmesurada dos que a cercavam.
Hoje é um desses dias em que não preciso de pensar no que está para além da realidade: Eu simplesmente sinto-me incapaz de a nomear.
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