19.9.13

Ao cuidado do ministro Crato

Na perspetiva dos jovens lisboetas, nascidos em 1996, o Parque Mayer nunca existiu!
Mesmo os mais atentos estão convencidos de que a referência - «O Mayer estava a morrer, deserto, parque de estacionamento» -, no conto O Sonho, de Fernando Campos,  não passa de fantasia literária, até porque n'OS MAIAS esse parque nunca é referido... (Paradoxalmente, o romance queirosiano ganha estatuto de referência documental, perdendo, ao mesmo tempo, valor literário.)
Para facilitar a inteligibilidade do conto, registo que a inauguração deste Parque se deu a 15 de Junho de 1922, sob a responsabilidade da Sociedade Avenida Parque, impulsionada por Luís Galhardo, e que o repasto, em que o Conde comunica que vai embarcar no Lusitânia Expresso com destino a Timor, decorre pouco antes da partida - dia 23 de Janeiro de 1992. Uma viagem interrompida pelas forças militares indonésias. Porquê?
O desconhecimento da referência, seja ela temporal, espacial ou factual, afeta seriamente a compreensão textual e inibe o prazer inerente, tornando a leitura enfadonha, e  a visão distorcida da chamada realidade.
De qualquer modo, há solução para o desconhecimento da referência. Basta solicitar um novo exame ao IAVE!
 

18.9.13

Maria Luís Albuquerque e os swaps

Desconfiado, fui consultar o Dicionário da Língua Portuguesa, à procura do verbete "swap", mas nada encontrei, o que se aceita, pois o termo é um estrangeirismo utilizado por gente preguiçosa. Gente frouxa.
O recurso a "swaps" suxa-nos a vontade e empurra-nos para a ociosidade. Se bem entendo a atual ministra das finanças, ela não se deixa suxar facilmente. Como técnica, ela só se pronunciou sobre o financiamento das empresas e dos empreendimentos e nunca se ocupou de empréstimos linguísticos ou outros. O que era preciso é que os milhões de euros entrassem nos cofres... De quem? Pouco importava? Era assunto que também não lhe ocupava o pensamento...
A ministra não sabe o que são "swaps" porque ela defende a língua portuguesa. Ainda se lhe tivessem falado de "trocas", ela, talvez, tivesse avaliado os prejuízos. Mas não! Maria Luís Albuquerque é uma purista que aprendeu, não se sabe com quem, que os empréstimos linguísticos não solicitam autorização para nos envenenar a língua e que nem sequer admitem "trocas", pois o seu objetivo é  embrutecer-nos. Por isso, ela jura que não pode ter mentido sobre um termo que nem sequer é digno de figurar no Dicionário da Língua Portuguesa. 
 

17.9.13

Em flagrante

(Lisboa, Rua Tomás Ribeiro, nº 105 B, entre as 17h30 e as 18h20.)
Outrora, atirava-se milho ou arroz aos pardais. Agora, dá-se restos de pão aos pombos... e vem um gato e chamas-lhes um figo! Abocanha um e corre com ele para debaixo de um automóvel estacionado sob o que antigamente era um plátano. (Banquete de luxo, em frente do nº 15 da Rua Filipe Folque.)
Na esquina com a Tomás Ribeiro, um mendigo idoso e uma jovem mendiga, acomodados, esperam os sobejos do Pingo Doce. Falta- lhes a afouteza do felino para quem a rua é território de caça, ao invés dos gatos de Pessoa...
Ainda na esplanada da Cafetaria Duriense, diante de uma virtuosa superbock, arenga um velho trabalhador: a educação já não é o que foi - os filhos desrespeitam os pais, basta passar pelas telenovelas, portuguesas ou brasileira, ou descer ao Parque...
(...) O novíssimo Plaza é já uma sombra de si próprio, tal como o IMAVIS ou City Cine - parece que acompanharam o vizinho Urbano! Até o Tomás Ribeiro mais não é do que uma placa toponímica que desemboca na Praça José Fontana, vindo da Suíça com o desejo de nos fazer sair do obscurantismo, e que se finou ainda antes que a sua Geração (de 70) se desse por vencida...
O único vencedor parece ser o gato que não brinca na rua, mas o mendigo, aqui mesmo ao meu lado... e que não paga nada à EMEL, conta as moedas, quando o proprietário do café se aproxima , e, antecipadamente, paga-lhe um café e um bagacinho - 1 euro e trinta e cinco cêntimos. Imóvel, no passeio, o mendigo espera até que surge o empregado com dois copinhos de plástico com o café e o bagaço... Sem pestanejar, o homem volta para o seu canto, ali mesmo, junto ao semáforo...
 
(...) À espera, ficou o artigo de Eduardo Prado Coelho, Comunicação e Democracia. Que ele me perdoe!
 
     

16.9.13

No arranque do ano escolar

I - A notícia vai alastrando. Afinal, há atraso no arranque do ano escolar. O ministro da educação e os seus apóstolos explicam que é assim todos os anos...
Na verdade, há cursos e disciplinas que continuam por autorizar, apesar da procura. Há professores do quadro que não sabem se a distribuição de serviço, que lhes atribuía esses cursos e essas disciplinas, continua válida.
Há escolas que não iniciam a atividade letiva por falta de professores, apesar dos vários concursos já efetuados e dos milhares de desempregados...
Tempos houve que os ministros da educação se esforçavam por otimizar o início do ano letivo. 
 
II - As imagens da degradação do edifício do "Liceu Camões", difundidas pela RTP, surpreenderam muito boa gente. No entanto, não consta que o ministro da educação tenha mexido uma palha. Incomodar-se para quê?
Por este andar, o feitiço ainda vai voltar-se contra o feiticeiro! Em certos casos, as imagens, ao ampliarem a realidade, subvertem-na...

15.9.13

A entoação de Crato

Do atual ministro da educação já só dou atenção à entoação.
Quando a pergunta é desagradável, Crato não se irrita e responde sempre, conseguindo modelar de tal modo a resposta que dela só sobra o tom com sabor a melaço... O que se segue passa a ser um monólogo enfadonho, assente na total ausência de rigor... Da estafada realidade presente, nada conhece! Da futura, seraficamente, sabe que o sistema educativo vai perder 40.000 alunos.
Por outro lado, o discurso risonho de Crato acaba inevitavelmente com a ameaça de novo exame. Apesar, de por vezes, o imaginar possuído pelo rigor dos talibãs, creio que este fascínio pelos exames lhe foi incutido pela Troika. Ou será ele o mentor?
Afinal, a Troika chega amanhã para proceder à 8ª e à 9ª avaliação!
Diga-se, de passagem, que não entendo muito bem como é que um mesmo aluno pode ser submetido num curtíssimo espaço de tempo a duas avaliações. 
Provavelmente, trata-se de uma avaliação por módulos, em que o avaliador se limita a verificar a consistência das cavilhas, quando as há... 
 

14.9.13

Dona Dolores, aos 91 anos

Dona Dolores fez hoje 91 anos! O coração e a cabeça continuam a coadjuvar-se no combate à porosidade óssea...
Esta longevidade não a inibe de se mover num espaço fechado como se ele fosse uma miniatura do mundo: no seu território, nada escapa ao seu olhar felino e, sobretudo, a um amontoamento de memórias que lhe trazem de volta o passado sob a forma de presente...
Ouvindo-a, rapidamente sentimos que, a qualquer momento, da multiplicidade de molduras pode libertar-se um espetro que retoma o lugar original... para ali ficar, sem se queixar, à espera de louvor ou de censura...
E esse louvor ou censura são condicionados pela resposta a uma simples questão: - aos 91 anos, ainda estou jovem, não estou?
 

13.9.13

Por ventos e marés!

A globalização é, hoje, o maior inimigo do estado-nação. No caso português, desde que as várias fronteiras se extinguiram que a soberania se foi esfumando. Ora, a perda de soberania carateriza-se pela morte da identidade - um traço distintivo da pós-modernidade.
A expansão portuguesa tinha dado um poderoso contributo para a afirmação da modernidade. Percebe-se agora que o nosso ciclo se fechou com o fim da expansão, atirando-nos para a situação de estado-minoritário que nem a adesão à união europeia conseguiu disfarçar. Entrámos assim na pós-modernidade, ficando à mercê de modelos globais cujo  objetivo primeiro é desmantelar o que resta do estado-nação.
Infelizmente, há cada vez mais gente conivente com este "ajustamento estrutural" que, no que respeita à educação, começa na formatação de professores e alunos e acaba na descaraterização da escola pública, tornando-a alforge de descamisados.
O dia de hoje foi penoso porque, em vários momentos, percebi que a formatação vai, alegremente, cavando a sepultura da nação portuguesa. Por ventos e marés, singramos na esperança de que os bem-aventurados chegarão a bom porto...