12.8.19

De regresso

Ontem, nem sequer cheguei a entrar na 'Montanha', lembro agora, o que me deixa pesaroso, como se a ficção fosse mais interessante do que as filas para atestar o depósito de gasolina. Eu, que raramente o faço, lá me sujeitei ao ritual deste último domingo, em vez de entrar num qualquer templo religioso como mandaria a boa educação…
De regresso à 'Montanha' e a casa, avancei, entretanto, até à página 610, por entre debates fervorosos de Naphta e de Settembrini sobre a natureza das ações do homem ao longo dos séculos - obscurantista e iluminada - sem que Hans Castorp se disponibilize a favorecer um dos seus mentores… posto que tal lhe inviabilizaria, por exemplo, a experiência alucinatória vivida durante um nevão.
De significativo, no VI capítulo, o retorno e a morte plangente tenente Joachim, sem que o patético deixe de nos convidar à gargalhada nos momentos mais solenes:
«A senhora Stohr chorou com entusiasmo perante a transformação que o corpo de Joachim exibia:
- Um herói! Um herói!- gritava sem parar, ao mesmo tempo que pedia insistentemente que tocassem a «Erótica» de Beethovem na hora do enterro.»

10.8.19

Se não tivesse entrado nesta Montanha

Por aqui, o vento sopra forte. Na Montanha, há imensas páginas em que não há referência ao estado do tempo - e já vou na página 520. Talvez a ventania tenha um efeito benéfico no avanço da leitura! 
Assisto a um debate intensíssimo sobre a religião e a racionalidade humanista, protagonizado, respetivamente pelo jesuíta Napta e o já apresentado italiano Settembrini, atirando o protagonista Hans Castorp para o lugar do aprendiz dos mistérios da vida e da morte, do espírito e do corpo… da eternidade e do tempo… 
Da leitura fica-me a convicção de que, afinal, a disciplina a que fui submetido durante a adolescência foi ministrada por jesuítas, mesmo que não estivessem conscientes da essência do seu ministério… Não era só o edifício que fora construído de acordo com a regra de Santo Inácio… também as camaratas obedeciam ao princípio da organização em "divisões" militares - lembro-me que pertencia à camarata de São Condestável… e depois havia as refeições em silêncio cortado pela leitura de excertos bíblicos, sem esquecer as deslocações em fila para todos os atos diários… 
No entanto, publicamente, não me lembro de ter ouvido uma única palavra sobre esta 'diabólica' doutrina…
Se não tivesse entrado nesta Montanha, talvez não tivesse chegado a esta conclusão.

9.8.19

A temperatura

Nem sei por que motivo um Pardal interferiu na leitura da Montanha. Lá não se ouvem as aves do Céu nem da Terra, pelo menos até à página 414... e por aqui, há uns tantos pardais, comilões, mas inofensivos…
Por lá, as matérias perigosas são de natureza fisiológica e cada um carrega as suas, e quando o trenó entra em ação é mau sinal - é mais um corpo que é levado de forma sigilosa e definitiva.
Por aqui, o tempo mudou, desrespeitando o verão ou, talvez, a mudança seja apenas para baixar a temperatura, coisa que lá em cima se afigura difícil, infelizmente…

8.8.19

Anda um Pardal à solta

Um olhar despreconceituado, isso existe?
Sobre a matéria, talvez, mas sobre o tempo?
A epígrafe é frágil, porém não tem incomodado, mas essa é outra questão.

Em muitas situações, o tempo nem sequer é nosso. Não temos o mínimo de liberdade para o gerir, quanto mais avaliá-lo de forma isenta.
As horas são determinadas pelo capricho - forma excessiva, porque previsível - de outrem que acha natural dispor…
E as horas podem ser a vida, mesmo que o outro não seja sempre o mesmo.
Por estes dias, anda um Pardal à solta a impor a sua vontade a milhões de almas, a dar-lhes cabo da vida...

7.8.19

Aselha, talvez

«Chegavam mesmo a considerar essa dependência dos livros uma inépcia própria de aselhas. Bastava perfeitamente ter, quando muito, um livro no colo ou sobre a mesa de apoio para sentirem as suas necessidades supridas. » Thomas Mann, A Montanha Mágica, pág. 309, edição D. Quixote

Não desisto de subir a montanha para lhe captar a magia, no entanto não posso deixar de me confrontar com a minha inépcia, apesar de uma vida dedicada à leitura. 
Hoje, por exemplo, comprei 1/2 dúzia de ovos por 2,99 €. Há dois ou três dias, levantei 100€ numa ATM, percebendo agora que paguei + 7 € pelo levantamento…
Entretanto, na Montanha, encontrei uma referência ao Terramoto de 1755, no debate entre a Natureza e o Homem. A única até ao momento - é um pouco como se a Ibéria não existisse, quanto mais Portugal.
Finalmente, à medida que avanço, vou-me interrogando sobre quantos leitores terão chegado ao cume desta obra… o editor diz que esta é 8ª edição, sem referir o número de exemplares…
E ainda me falta descobrir a natureza dos ovos...

6.8.19

O tempo de leitura

Hans Castorp também faltava o fôlego, sobretudo quando decidia desrespeitar a disciplina do Sanatório Internacional Berghoff - afinal, ele não passava de um visitante que, entretanto, apanhara uma constipação, dizia ele, interessado em analisar as múltiplas expressões do 'tempo'.
Este 'também' pressupõe que o leitor o seja de facto, e não apenas alguém que está de passagem. 
Já lá vão sete semanas naquela montanha suíça, e eu só avancei 258 páginas. Hans Castorp acabou por baixar à cama para conter o sopro pulmonar e, principalmente, o rubor que lhe assaltava o rosto, já que não conseguia descer dos 37,7º, ficando à mercê do enigmático Behrens...
A vida na montanha decorre para uns como antecâmara da morte e, para outros, quase como estância turística. De notável, os diálogos entre Hans Castorp e o italiano Settembrini…
(…)
Por aqui, junto ao mar, o tempo de leitura parece ser o de quem lentamente sobe a montanha… Há horas em que o vento incomoda, mas nunca neva...e a salada algarvia surpreende.

4.8.19

Hans Castorp

Vou titular este post com o nome do protagonista - Hans Castorp para que percebam que não fui eu que subi à montanha. Agora, encontra-se na sala de jantar, pela terceira vez no mesmo dia. Muito se come naquele sanatório!
Eu encontro-me muito mais a sul, num país do Sul, a apanhar sol forçado, pois detesto areia e calor. Nos intervalos, sigo Hans Castorp, apesar de, hoje, na praia da Torralta, ter sentido inveja de Thomas Mann - ele não teria perdido a oportunidade de relatar o cavaco daqueles dois «amigos» que, de pé, e ao sol, falaram de tudo durante mais de duas horas… A mim, falta-me o fôlego…