9.3.21

O advérbio

 


As flores, naturalmente... os graffiti, artificialmente.

O advérbio pouco acrescenta e nada modifica. É desnecessário, mas resiste, alapado permanece. Se transformado, encalha na hipálage e ficamos às voltas, a saltar de lugar... à procura da sensação, do instantâneo, do movimento…

Com o tempo, o advérbio vai esmorecendo. Cristaliza, sobretudo se o autor perder a graça ou, pior, se a graça faltar ao leitor…

Naturalmente, as flores... os graffiti, desgraçadamente.

(No dia em que o presidente voltou a tomar posse, cerimoniosamente.)

7.3.21

O garfo

 

Este garfo não tem história, pelo menos que eu conheça. Já tem uns bons anos, não se sabe quantos. 

Não posso dizer que tenha assentado praça no quartel de Abrantes, mas tal bem poderia ter acontecido, pois tempos houve em que os praças tinham de se fazer acompanhar do talher, já que as mãos, ferramenta habitual, tinham sido proibidas de fazer chegar o rancho à boca...

Este garfo é resistente, mas pode incomodar, já que há quem considere que pode deixar cair a comida por entre os dentes.

Claro que o queixoso não faz a associação  entre o garfo e a forquilha, que a mim me desperta memórias de antanho. 

Nos campos, a forquilha levantava o feno e o mato, enquanto o Diabo espreitava a oportunidade... Sim, porque o Diabo continua à espreita…

O garfo é ferramenta antiga. Dom Manuel I já a utilizaria a espaços... era privilégio das Cortes! 

Este texto é certamente absurdo. De facto, escrevo-o para não reagir à tese da mente civilizadora, mas racista,  do Mefistófeles queirosiano. 

Pobre e inútil ironia!

5.3.21

Contra a desinformação

Zhang Zhan
  O combate silencioso                                                   

Parece que ninguém quer saber… Uns porque já deixaram de pensar; outros porque preferem os negócios e bajular os poderosos.

3.3.21

Se está preocupado...

 

Se está preocupado, continue a leitura ou, caso o não esteja, fique por aqui, não se aborreça: 

A PREOCUPAÇÃO:

Quando eu tomo posso de alguém, de nada lhe vale o mundo inteiro; cobrem-no trevas eternas, o sol não se levanta nem tem ocaso para ele; os seus sentidos, por perfeitos que sejam, estão cobertos de véus e de trevas. De todos os tesouros, nada sabe possuir; felicidade e desgraça tornam-se caprichos. Morre de fome no seio da abundância. Sejam delícias ou tormentos, deixa tudo para amanhã. Nada espera do futuro e deixa de ter presente. Goethe, Fausto 

28.2.21

Uma gota de sangue!

 


Do que observo e da informação que vou colhendo, parece que o confinamento já teve melhores dias. Nas ruas e nos jardins, a circulação é contínua, em modo familiar - a pé ou de bicicleta, com ou sem perro. Não vivêssemos no seculo XXI, e pensaria que tudo o que está a acontecer seria ação de Mefistófeles…

Uma gota de sangue, em troca de um remoçamento, de uma conversa de circunstância, de um chega para cá, com ou sem selfie.

Uma gota de sangue, e o cansaço desaparece no paredão, mesmo que não muito longe se acumulem os caixões…

25.2.21

Apontamento de fevereiro

 

Insatisfeito com as notícias que vou recebendo, regresso ao FAUSTO.
Foi em 2013 que me iniciei na leitura de Goethe, embora em tempos já tivesse lido As Mágoas do Jovem Werther.
Esta abordagem surge-me como primeira, apesar deste blogue, se consultado, assegurar o contrário. Se nem eu próprio me lembro do que fui escrevendo!
De qualquer modo, já não me interessa decifrar o significado global da obra… apenas começo a dar atenção a certas reflexões que as personagens vão expondo. Por exemplo:

O Senhor: - Nada mais tens a dizer-nos? Nunca virás senão para te queixar? E, na tua opinião, nada há de bom sobre a terra?

Mefistófeles: Nada, Senhor: tudo corre perfeitamente mal, como sempre; os homens fazem-me pena nos seus dias de miséria, a tal ponto que sinto remorsos de atormentar a pobre espécie humana.

23.2.21

O círculo maldito

 




A Associação de estudantes da Escola Secundária de Camões organizou um debate sobre a escravatura e o racismo no Zoom. A certa altura o ecrã foi invadido por suásticas, ameaças racistas, saudações nazis e imagens violentas.




Pouco interessa a ponte e quem a atravessa. 

O olhar fixa-se num círculo bem delimitado, alheio ao curso do dia...

Talvez a noite desperte para um círculo maior, embora indistinto.

A nódoa, sim, devia perturbar o olhar.