Por mais que eu explique que a frase e o enunciado são coisa distinta, que a primeira pode ser autopsiada, classificada, desmembrada, sem incomodar o locutor, e que este será fortemente afectado se submetido a tais tratos, há sempre quem faça orelha mouca...
Vem isto a propósito de uma noticiada e citada «frase enigmática» proferida, em 1998, no Congresso do CDS, por Maria José Nogueira Pinto tendo António Lobo Xavier como interlocutor: «O senhor sabe que eu sei que o senhor sabe que eu sei» (...) As reticências escondem a forçada cumplicidade dos interlocutores que só um enunciado pode obrigar.
O referente desta nova cumplicidade era Paulo Portas ou a natureza da ação do amigo de António Lobo Xavier.
De lá para cá, o segredo ficou esquecido, mas a frase reaparece, sobretudo, no discurso político, com uma carga enunciativa de desafio, de ameaça.
- E afinal se não venho revelar o segredo de Paulo Portas, com que objetivo é que desenterro o enunciado?
- Simplesmente, porque ao ler OS ANÕES, de Harold Pinter, descobri a fonte onde, provavelmente, Maria José Nogueira Pinto bebera:
- Quem é o Pete?
- Um amigo meu.
- Um membro do teu clã?
- Membro? Ele é o feiticeiro.
- E tu quem és?
- O carrasco. Mas vai haver nova eleição no Outono.
- A sério?
- E então - disse Mark - quem sabe? Podemos ficar todos à procura de novo emprego.
- Ouve lá - disse Sonia - queres dançar ou quê? Senão vou arranjar alguém que queira.
Eu sei que tu sabes que sabes que eu sei.
edição D. Quixote, pág.171-172.
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