6.11.09

ESCHERICHIA

Acabo de tomar conhecimento que o Exploratório Ciência Viva, no Parque Verde do Mondego, Coimbra, promove, hoje, um encontro cujo tema é «Poesia & Ciência»…
Tenho pena de não poder estar presente, eu que procuro uma explicação para tanto alheamento da poesia e, também, do texto dramático. Poucos são os alunos que procuram ler os nossos poetas… continuam a vê-los como ‘loucos’… Preferem a ficção estrangeira, preferem traduções manhosas… Não revelam apego (paixão) pela língua, não vêem que o seu futuro está inscrito nesse magma matricial…
Para atalhar qualquer surto de ‘escherichia’ mais ou menos viajada, deixo aqui uma engenhosa e divertida incursão de Vitorino Nemésio por esse espaço privilegiado em que a ciência se dilui em verso:
                       
Mandei fazer o electrocardiograma
À minha «Beatriz de mão gelada»:
Mas fui eu, fui eu só que fui à cama,
Eu, claro! não Beatriz, nem Dante, eu nada!
«Mas única Beatriz consoladora»
Então não era a Morte reservada
A quem tem coração pela vida fora
E por ele sobe em hélice animada?
Em gráfico de sismo a sina veio
Nessa foto cardíaca: – « Receio
Que morra, Daisy!» Não: Que morra, Dolly!»
Pois eu não sou o Fernando Pessoa
Ou Antero, nem em Inglês seu nome soa,
Que minha Musa é Escherichia Coli.
                         
Escherichia ou Beatriz, que importa o nome
Se ambos me soam igualmente belos?
A prometida morte nos consome
Como flor prometida nos carpelos.
Assim tu, Escherichia, és meu tormento
E nocturno tremor, Beatriz funérea!
Quem nasceu para casto fingimento
Afinal pode amar uma bactéria.
                      
Pego em Escherichia  ao colo,
Musa micrónica, etérea,
Mas não já de éter sulfúrico
Senão feminil bactéria.
Por ela todo estremeço
Em suor e ácido úrico!
                                                                  in Limite de Idade   

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