6.7.17

O olhar

O olhar é uma via que leva tanto ao saber verdadeiro, a um nível informativo, como ao erro, tanto informativo como formulativo. Luís Filipe Barreto, Portugal Mensageiro do Mundo Renascentista, Pág.36, Quetzal editores

Apanhei o autocarro 783 com a ideia de aproveitar o tempo de viagem para avançar na leitura, mas rapidamente desisti. A necessidade de fixar o olhar dissuadiu-me, pois, com alguma frequência, surge uma neblina enfadonha. Limitei-me a olhar as ruas, as casas e os jardins que as ladeiam, apenas com o propósito de verificar se a memória correspondia ou se necessitava de a reformular... De facto, tudo se repetia até que a modorra tomou conta da situação...
Chegado ao Marquês de Pombal, reabri os olhos, pois a memória dizia-me que era necessário estar atento às passadeiras, à lentidão dos semáforos, sem esquecer as novas ciclovias... O olhar foi descodificando os avanços e recuos, ao mesmo tempo que se prendia nas famílias estrangeiras que, desorientadas, lá iam subindo e descendo a Avenida, pasmadas para o luxo das boutiques laterais...
Até que chegado ao nº 202, entrei e me sentei à espera, reiniciando finalmente a leitura que ensina que o olhar não é só fonte de saber, é também fonte de erro... o que me permite, agora, pensar naqueles jovens que fazem fé no olhar de Alberto Caeiro, como se ele fosse divino e que repetem, à exaustão, que ele é o poeta das sensações, e que acriticamente seguem o seu caminho, longe do pensamento...

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