15.6.06

O Corpo de Deus e a inteligência lógica

«... por agora vai a procissão em meio, sente-se o calor da manhã adiantada, oito de Junho de mil setecentos e dezanove, que é que vem agora aí, vêm as comunidades, mas as pessoas estão desatentas, passam frades e não se dá por eles, nem as irmandades foram todas assinaladas...» José Saramago, Memorial do Convento
Hoje, 15 de Junho de 2006, também na minha memória difusa passa a procissão do Corpo de Deus; outros, talvez mais atentos à intempérie, nela tenham participado, integrados nas poucas irmandades que sobraram da laicização racionalista. Nos passeios, movem-se outros postulantes impacientes, capazes de insultar a custódia patriarcal, enquanto as floristas se esforçarão por vender aquela flor que um dia um menino de coro ofertou a um cano de espingarda.
Hoje, 15 de Junho de 2006, esse menino de coro, já crescidote, indisponível para acolitar qualquer D. Policarpo, rumou a Sul, na esperança de que o Deus Sol o torne num dos jogadores de xadrez de Ricardo Reis: «Mas quando a guerra os jogos interrompa, / Esteja o rei sem xeque, / E o de marfim peão mais avançado / Pronto a comprar a torre
O que eu não entendo é que nesta república, em nome da liberdade de culto, se tenha banido o D. Policarpo do protocolo do Estado - ideia que, creio, jamais terá passado pelo cabeça do magnânimo Rei-Papa D. João V - e continuemos a aproveitar matreiramente os santos dias do calendiário eclesiástico católico!
Ainda consultei a crónica do Pacheco Pereira, na esperança de que ele questionasse o engenheiro Sócrates sobre a celebração do Corpus Christi num país que, na prática, rejeita as suas raízes, mas ele - P.P., hoje e nos próximos dias, teoriza sobre 'Blogues: a apoteose do presente"... o que me atira, prosternado, para o último parágrafo do Manifesto Técnico da Literatura Futurista (11 de Maio de 1912) de F.T. Marinetti: «Depois do reino animal, eis o início do reino mecânico. Com o conhecimento e a amizade da matéria, da qual os cientistas não poderão conhecer senão as reacções físico-químicas, nós preparemos a criação do homem mecânico de partes mutáveis. Nós o livramos da ideia da morte e, por conseguinte, da própria morte, suprema definição da inteligência lógica

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