15.10.15

Na Pasmaceira

«O Pasmado estava ali porque ali deviam cruzar os comboios. Tudo o mais, entrementes, conspirava contra a sua existência. A aridez, o turbilhonar constante das brisas, o isolamento, uma como tenebridade paisagística especial, e também, justo é dizê-lo, a crença de que o sítio era corte de fantasmas e campo não sei de que espíritos de velhos guerreiros de outros tempos (que ali se teriam defrontado e mutuamente vencido) fazia do arredor paragem indesejável - onde só por obrigação se passava, ou ia, ou ficava.» A. Rego Cabral, Tundavala, A Oeste de Cassinga, pág. 270, Sociedade de Expansão Cultural, Lisboa.

Este é um romance do tempo em que os engenheiros ousavam enfrentar o anátema que os condenava à redação de monografias e relatórios. A literatura era, em Portugal, uma coutada reservada aos juristas, médicos e diletantes.
Um romance de um engenheiro que defendia que a técnica era a alavanca do mundo e, em particular, do mundo português em Angola. Sem a engenharia, o desenvolvimento do território ficaria nas mãos de decisores letrados, mas ociosos... 
A pasmaceira era o estado de alma dominante. 
Infelizmente, entre os políticos, poucos eram os engenheiros verdadeiramente empreendedores. E quando surgia algum, a cáfila, que geria as finanças públicas e impunha a filosofia do espírito, acabava por ostracizá-los...
Na pasmaceira até a guerra era preferível à engenharia, ao desenvolvimento, à atividade produtiva.

Neste romance, o Pasmado é apenas uma estação de caminho de ferro, isolada num território hostil, mas fundamental para o escoamento do minério. Na Pasmaceira atual, a cáfila que gere a res publica encerra e desmantela tudo, em nome do eurismo - uma filosofia cujo espírito está cunhado no euro.
Neste romance, os heróis são os engenheiros, os técnicos, os trabalhadores.. 

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