26.6.14

Este esforço de memória...

"... faço agora este esforço de memória e este esforço de escrita, porque de outro modo sei que acabaria por esquecer-me de tudo.» Javier Marías, Todas as Almas, 1988

a) Encostado a uma parede, espero pelo serviço e, mesmo que queira alhear-me da barafunda, sou obrigado a encaixar um conjunto de protestos já habituais. Parece-me que o que está em causa é o desrespeito pela hora sagrada do almoço. Fico a pensar na duração e na extensão da hora: imagino, entretanto, uma lauta mesa desdobrável em divã para poder gozar a merecida sesta... Por mim, bebo um café e como uma empada!
b) Atento aos esgares dos examinandos, tomo conhecimento da preocupação da colega que não sabe se o seu automóvel foi rebocado, roubado ou, simplesmente, se esqueceu do lugar onde o estacionou. Horas de angústia da vigilante e dos alunos, embora por razões distintas. Para não exteriorizar as dores que sinto, bebo pequenos goles de água e espreito o pátio à espera que uma qualquer ave anime os plátanos. Relativizando, a minha dor não é nada que se compare ao sofrimento dos meus parceiros de infortúnio - alguns, em 210 minutos, não chegam a preencher três páginas... Durante este tempo, ainda tive oportunidade de ouvir o trinado de um rouxinol e testemunhar duas situações de sobressalto que prefiro não relatar e que assim irei esquecer. 
c) Ao princípio da tarde, vivo duas situações inesperadas. A primeira, perturba-me porque só agora tomo conhecimento de que o Caruma  terá afetado a autenticidade crítica de uma colega, vendo-se ela a braços com uma contestação que revela o estado mental do país em que vivemos (passado e presente). A segunda situação, de certo modo articulada com a primeira, deixa-me a pensar na dupla face da moeda ou, se quisermos, na imagem de que a mão direita ignora o que é feito pelo esquerda... Para não esquecer deveria ser mais explícito ou até mais frontal, bem sei...
d) Ao fim da tarde, Cristiano Ronaldo é eliminado do mundial do Brasil. Situação previsível: o Brasil, país independente há quase 200 anos, não iria querer assistir ao regresso de Cabral... 
/MCG 


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