11.4.15

Na avenida de Berna, nem poeta nem romancista

Nem poeta nem romancista!
Para poeta, falta-me a capacidade de deixar de falar de mim, mesmo que o discurso viva centrado no EU, vítima da alteridade velada por palavras diferidas ou, como diria o Poeta, fingidas...
Para romancista, falta-me a visão da totalidade. Por exemplo, hoje, posso registar alguns detalhes. Salgueiro Maia estampado em tons de abril nas paredes de uma faculdade de ciências humanas, onde os protagonistas arremedam ciência, procurando, a todo o custo, desembaraçar-se do fator humano em nome de padrões ortodoxos que se vão excluindo uns aos outros, sempre ao serviço do vil interesse, do compadrio e de causas inconfessáveis...
Do outro lado da avenida, um templo religioso do estado novo, supostamente ao serviço dos fiéis desprotegidos, porque dos restantes infiéis é melhor nada dizer, apesar de nele, hoje, se oficiarem bodas multirraciais, parecendo que, afinal, o tempo ultramarino e de martírio de muitos salgueiros maia bem poderia ter sido evitado...
Mais perto da praça de espanha, há muitos detalhes que poderia registar, mas a minha atenção não foi além do pormenor assinalado no jardim gulbenkian - um verdilhão, ave que se pode ver e ouvir a partir de março. Ao observar as cores da plumagem, fiquei com a ideia de que a estampagem do salgueiro maia seria mais primaveril se lhe trocassem as cores da bandeira pelas do verdilhão.
Quanto ao templo religioso, os vitrais de Almada Negreiros continuam a filtrar a luz mística, sempre ensombrada pelo braço cardinalício que raramente deixou de servir o compadre salazar. Já é azar! 
Se por ali tivesse circulado o Eça, ele não se teria esquecido do restaurante o Pato que tão belas iguarias confecionava para o pároco e seus coadjutores, sem falar das irmãs e das sobrinhas... 
Claro que se o Eça tivesse escrito um romance sobre a avenida de berna, a faculdade de ciências humanas, ali residente, viveria mais desafogada, à volta da choldra que nos vai governando e formatando... 

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