18.6.15

Uma sala em dia de exame

Rachas habitadas por teias de aranhas nos quatro cantos; bolor nos tetos escurecidos e nas paredes a empalidecer; três janelas voltadas para o excêntrico edifício da Polícia Judiciária; estores avariados e cortinados desprendidos de calhas soltas; duas portas, uma de entrada e de saída ( o que dizer de uma porta?) - a primeira acede à galeria debruçada sobre o pátio sul ( dos plátanos por ora frondosos), a segunda sempre fechada...
Ao fundo, dois armários metálicos. Sobre um, sacos de provas de exames inúteis carregados de pó; sobre o outro, dois artefactos, um de metal e outro de madeira, esquecidos das mãos que os fabricaram, adormecem ali...
Ao lado da porta de entrada e de saída, outro armário, de madeira rústica, fechado a cadeado, como se lá dentro tivesse ficado esquecido algum tesouro de outro tempo, irmão, talvez, do retroprojetor abandonado à sua sorte...Convém referir, também, as duas janelas que, da galeria, permitem provocações anódinas e passageiras...
De menos velho, apenas um datashow suspenso de um braço avançado que se ilumina, a espaços, sobre a parede branca, em tempos coberta por um painel de cortiça, e uma secretária metálica, cedida por uma repartição pública em remodelação socrática. As gavetas da secretária continuam vazias. Sobre o tampo de fórmica, um computador HP, um ecrã HPL1710, duas colunas gémeas, um telecomando, parecem prometer uma outra dimensão. Em frente, 20 mesas, hoje ocupadas por 18 jovens, muito sérios, que vão resolvendo a prova de Física e Química A...
(...)
E eu que estou proibido de ler o que quer que seja, estudo-lhes os olhares, os movimentos na cadeira, a azáfama nas máquinas de calcular - fica-me a sensação de que o segredo dos armários, afinal, está escondido naquelas máquinas, onde me parece ser possível guardar enormes quantidades de dados que eu não sei ler... 

Incapaz de vigiar o que está a acontecer naquelas máquinas, todas autorizadas por quem sabe, regresso às rachas, ao bolor, às persianas, às tábuas de antigos pinheiros longilíneos, procuro-lhes as juntas de união, os nós... e espero que tudo acabe nesta sala ou que um inspetor entre por aquela porta que, até hoje, sempre vi fechada... 

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