(A memória principal data de 15.08.2012)
Para chegar à casa, M. tinha que
passar pela palmeira.
Daquela palmeira avistava-se
sobre o lado direito uma casa térrea. Donde é que aquela palmeira teria saído,
se não se vislumbrava nenhum palmar entre vinhas, olivais e figueirais? Saía de
casa e logo os olhos se fixavam naquela inesperada presença. Aquela fixação, ao
contrário do que seria de esperar, não fazia sonhar. Era uma presença muda que
ajudava a delimitar o caminho de pedra maltratada e que, quando as chuvas
desabavam, assistia à transformação da rua em rio de lama. Para além da pedra e
da lama, erguia-se, majestosa, a palmeira. Ainda, hoje, por lá continua…
Aquele pedaço de caminho que
separava a casa da palmeira foi durante dez anos a aldeia de M.
Para lá da palmeira, a rua estava
assombrada: havia cabras nocturnas que devoravam os parcos canteiros de flores,
havia cães que latiam sem parar e, sobretudo, havia a violência das palavras
grosseiras que fendiam os tímpanos de M. Essas palavras ainda hoje ecoam na
mente de M. Talvez se possa admitir que ainda o assombram.
De facto não são só as palavras
que ecoam… há também gritos. E em particular, tosses ininterruptas que
atravessam o tempo e se repetem…
(...)
Apesar da memória, nem tudo pode ser dito. E de que serviria?
(...)
Última hora: a palmeira já só vive na minha memória e, agora, sei que um pedaço de mim ficou pelo caminho...
(...)
Última hora: a palmeira já só vive na minha memória e, agora, sei que um pedaço de mim ficou pelo caminho...
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