12.2.14

E para isso se matam todo o ano!

Todos a trabalhar toda a vida, ou na roça ou na cana, ou no engenho ou no tabacal; e este trabalho de toda a vida, quem o leva? Não o levam os coches, nem as liteiras, nem os cavalos, nem os escudeiros, nem os pajens, nem os lacaios, nem as tapeçarias, nem as pinturas, nem as baixelas, nem as jóias. Pois em que se vai e despende toda a vida? No triste farrapo com que saem à rua. E para isso se matam todo o ano! Padre António Vieira, Sermão de Santo António aos Peixes

No dia em que tomei conhecimento de um novo decreto-lei, o nº 22/2014, de 11 de fevereiro, que visa enquadrar e regulamentar a "formação contínua de professores" tive necessidade de explicar aos meus alunos que o Padre António Vieira utilizou o sermão para defender os moradores do Maranhão do apetite voraz dos "homens do mar", um insaciável apetite branco europeu. De forma lúcida, António Vieira denunciou a ação das ordens militares, fossem elas de malta, de avis, de cristo ou de santiago. Sem qualquer tibieza, Vieira denunciou a cultura de morte que caracterizou o espírito de cruzada e de posterior conquista do novo mundo. 
A permanente preocupação com as condições de vida do homem tornam Vieira um verdadeiro precursor de todos aqueles que se empenham na defesa dos direitos humanos.
Se me refiro ao decreto-lei 22/2014 de 11 de fevereiro e a Vieira é porque no ato governativo, subscrito por Nuno Crato e Passos Coelho, nada encontro que  possa ajudar os professores a educar os seus jovens alunos. Não é com burocracia, catecismo, manual de instruções, formadores de formadores ad hoc, sessões de três e seis horas, que se aprende, que se aprofunda o que há de essencial na cultura humana...
Se os governantes tivessem aprendido a ler o Padre António Vieira não haveria tanta ignorância, tanta cegueira, tanta vaidade, tanta cobiça... tanto homem «no triste farrapo com que saem à rua».
  

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