10.4.13

Filtros

Hoje, são filtros! Ontem, era a censura! Outrora, a consciência!

Na minha adolescência, o exame da consciência era diário e tinha hora marcada. Cedo, percebi que esse exercício me trazia prejuízo - sentimento de culpa. Mais tarde, entendi que esse era o objetivo: a responsabilidade era individual - o mal estava do meu lado, e por isso o inferno era o meu destino.
 
Ao sair da adolescência, Freud convenceu-me que a consciência não passava do parente pobre do meu psiquismo, pois ela mais não era que os olhos cegos do poderoso subconsciente. Lá se acoitavam os padrões de cultura - começava a compreender que a responsabilidade me era imposta, apesar da minha margem de revolta ser limitada. E Sartre passou a acolitar Freud com a famigerada ideia de que l'enfer ce sont les autres! De qualquer modo, o que mais me seduziu foi o ignoto deo freudiano - o inconsciente (o ID)! De súbito, mergulhei no fascínio de que a censura, imposta pelo consciente e pelo subconsciente, se diluísse numa escrita dadaísta / surrealista! Havia por ali uma líbido insaciável que subjugava tudo - o prazer deixara de suportar qualquer tipo de censura; a arte deixara de suportar qualquer tipo de censura; a ideologia, em nome do inconsciente coletivo, desprezava de tal forma a censura que ressuscitou a antiga CENSURA... e o genocídio dos outros!
 
Agora, começo a persuadir-me que o tempo mais não é que uma série de filtros! E relembro a velha mula a quem o cabresto reservava duas belas palas que lhe restringiam a visão lateral! A realidade está de tal maneira secionada que deixei de ter hora marcada para o velho exame de consciência e, ao passar na Avenida do Brasil, chego a pensar que os seguidores do ignoto deo freudiano enriqueceram a vender todo o tipo de filtros... 
E mais não acrescento, porque já estou a pensar que a pala (o filtro) não passa de uma máscara. E eu não sou assim tão antigo! Ou serei?   

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