A linguagem dos elementos, em Vergílio Ferreira, é, por vezes, aterradora. O VENTO bestializado, qual lobo da montanha, surge luminoso e furtivo, prestes a devorar o rebanho de Deus. Nem a montanha nem o rebanho de Deus são explicitados, mas os termos selecionados para caracterizar a fome do vento apontam na sua direção.
«O vento árido de fevereiro trazia sempre ao Seminário doenças e mau agoiro. Era um vento esguio e furtivo, de pêlo no ar, rebrilhante e facetado muitas vezes de um sol frio de vidro. Recordo muito bem as suas unhas de arame, a sua presença nítida, escanhoada em azul, pura no esquadriado das arestas. Branco e arguto das geadas, tinha uma astúcia fina, penetrando, por qualquer fresta, nos compridos corredores e salões.»
Por outro lado, a recusa das «palavras cunhadas» fá-lo personificar as DUAS LAMPARINAS. Elas ocupam o espaço habitual das «devotas» ou, no melhor dos casos, dos piedosos pastores do rebanho de Deus.
« Duas lamparinas, aos cantos da camarata, oravam recolhidas, de contas na mão, à anunciação da morte.»
«Um silêncio ofegante, pesado de suor, inchava ao comprido do salão, subindo pelas colunas até às nervuras do teto. Amedrontado, eu escutava ansiosamente todos os rumores da noite, o arfar da doença à minha volta, os passos nos corredores, os relinchos vítreos do vento...»
in Manhã Submersa, 1954
Na verdade, o equídeo mais não é do que o «corcel negro» que vinha buscar o Gaudêncio, a mando daquele Deus, que ele ousara desafiar ao questionar a sua existência, libertando António Lopes da incómoda questão, e deixando-o livre para se entregar à incessante busca do que em si se perdera ao entrar no seminário - a MULHER.
in Manhã Submersa, 1954
Na verdade, o equídeo mais não é do que o «corcel negro» que vinha buscar o Gaudêncio, a mando daquele Deus, que ele ousara desafiar ao questionar a sua existência, libertando António Lopes da incómoda questão, e deixando-o livre para se entregar à incessante busca do que em si se perdera ao entrar no seminário - a MULHER.
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