9.7.13

Efeitos da canícula

Dizem os peritos que a canícula baixa a produtividade em 9%. Num país onde não há trabalho e, tradicionalmente, a vontade de trabalhar é reduzida, este calor abrasivo é mais um impedimento ao cumprimento do memorando assinado com a troika.
Curiosamente, o FMI veio dizer que o dia em que sair da troika será de grande felicidade. Será que a culpa também é da canícula e consequente baixa de produtividade?
No que me diz respeito, não me falta trabalho. Falta-me, sim, a remuneração correspondente!
O meu patrão entende que simultaneamente posso ser avaliador interno, avaliador externo, coordenador de departamento, membro do conselho pedagógico, membro da SAD, professor na sala de aula, em casa, virtual, organizador de visitas de estudo, classificador de provas, formando, relator ... e gastar horas e horas em reuniões, em deslocações, em balanços, a construir ferramentas múltiplas...   
O meu patrão entende que devo estar sempre disponível... e que, mesmo assim, essa minha disponibilidade não preenche as 40 horas semanais... Por vezes, o meu patrão ainda me olha de viés porque não digo que sim a todos os devaneios que lhe passam pela cabeça: cada escola um projeto educativo, cada escola um plano anual de atividades, cada escola um regulamento interno, cada escola um contrato de autonomia, cada ano um plano, cada turma um plano... E há ainda heterónimos do patrão que inventam novos projetos que sobrepõem aos anteriores a que devo dar o meu contributo, isto é o meu tempo...
Ora, no dia que passa, ao serviço do patrão, já fui à escola Marquesa de Alorna, à escola secundária de Camões e à escola Padre António Vieira. Sempre em transporte público sem ar condicionado, deixado à sorte na paragem sob um calor abrasador...
E ao olhar para trás, embora não veja o patrão, veja um número interminável de tarefas a que terei que dar seguimento célere, porque o patrão se está nas tintas para a canícula e para o empregado.
E depois, assim como quem não quer a coisa, o patrão, que ignora olimpicamente as condições de trabalho, ainda tem o topete de me considerar um privilegiado e deixar que a opinião pública me acuse de viver num regime de exceção.
Se o patrão tem ao seu serviço trabalhadores que não trabalham há mais de vinte anos, trabalhadores foragidos, trabalhadores madraços, então, despeça-os, e, não me obrigue, a distribuir-lhes serviço, conhecendo de antemão o prejuízo, e, sobretudo, forçando "horários-zero", antecâmera da famigerada mobilidade de pessoas que, se não trabalham 40 horas, é porque o patrão prefere olhar para o lado. 

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