6.9.13

Jane B. par Agnès V.

Há dias ficou-me na retina um plano em que uma jornalista, dando conta do avanço de um incêndio, se colocou na extremidade oposta de uma rua, deixando-nos sob a ameaça de que o fogo iria avançar para dentro da aldeia, destruindo-a, enquanto que a equipa que filmava a tragédia iria certamente recuando, como se a aldeia não necessitasse de ser defendida e as imagens fossem mais importantes do que as vidas e as coisas...
Ontem, fui à Cinemateca ver  o filme Jane B. par Agnès V. /1988, e nele tudo se passa de modo bem diferente: a cumplicidade entre a realizadora (Agnès Varda) e a atriz (Jane Birkin) é tão forte que a câmara não só não recua, criando distância, como, na verdade, envolve o corpo de tão perto que gera a ilusão de o querer possuir - a ideia é a de que Varda possui cinematograficamente Birkin, tendo, para o efeito, saído do papel de realizadora para o de personagem, embora estática, e, de que, por seu turno, a volúvel e insatisfeita Birkin, apesar de se sentir amedrontada pelo «olho» da câmara, se deixa efetivamente possuir...
O cinema, neste caso, devora os corpos para os preservar, imobilizar, retratar, mitificar. Pelo contrário, a televisão ameaça-nos, ao mesmo tempo que deixa os corpos entregues a si próprios. 

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