20.10.12

Elas andam aí, as formigas...


Elas andam aí, as formigas! As folhas de oliveira não lhes escapam, por muito distante que a árvore pareça…
Consta que carregam  agências de comunicação, jornais,  rádios e que, mais cedo ou mais tarde, a televisão não lhes escapará. E nós, as cigarras, estamos, em grande algazarra, a cair no desemprego.
Nada dista nos deveria espantar, pois as formigas têm um rumo e conhecem bem o chão que calcam.
/MCG

18.10.12

40.000 sob ameaça...

São 40.000 os funcionários públicos que ficaram a saber pela comunicação social que vão pedir a aposentação até 2014. Ou será 2015?
A maioria desconfia que mais vale fazer o pedido até 31 de Dezembro deste ano, pois ninguém explica corretamente qual será o valor do vencimento a partir de 1 de Janeiro de 2013. Mas, também, ninguém garante que as pensões não venham a sofrer cortes que tornem a vida insustentável.
Uma decisão desta natureza deve ser bem fundamentada. Mas em quê?
 
Falta uma estratégia nacional que (re) defina as funções essenciais do Estado e que o liberte de um extraordinário volume de despesas sumptuárias ou que visam servir clientelas de toda a espécie.
Por exemplo, não há qualquer motivo para que o orçamento alimente canais de televisão e de rádio, subsidie fundações, isente de IMI milhares de instituições religiosas, edifícios governmentais, autárquicos, sindicais, todo o tipo de associações... Se há uma receita a obter através da taxação do património, então nenhum edifício deve ser excluído!
O poder central e autárquico não pode continuar a ser proprietário de centenas de milhar de edifícios que só trazem prejuízo. Há custos que nunca são calculados! Há rendas vitalícias que continuam a ser pagas mesmo que os serviços tenham sido desativados.
Voltando às fundações, estas só devem ter esse estatuto se dispuserem de capitais próprios que lhes assegurem o funcionamento e o cumprimento de objetivos em benefício da comunidade. Caso contrário, devem ser liminarmente encerradas.
 
Como não há estratégia nem de redução de despesa nem de investimento, assistimos, sem esperança, à degradação  física, moral e psíquica dos jovens adultos e de todos aqueles que, mais velhos, trabalharam toda uma vida, cumprindo as suas obrigações, para, agora, serem deixados à deriva... 
 
Creio, no entanto, que com tanto desempregado sem futuro e tanto reformado deprimido, o melhor seria criar equipas mistas que passassem a pente fino o país de modo a identificar o que há a INCENTIVAR, PRESERVAR e DEMOLIR.

Dia XX

I - Por uma questão de rigor, continuo a explicar que a disciplina de língua materna não é apenas constituída por «matéria» que se decompõe em fatias, se mastiga e deita fora. Tudo é objeto, pois o falante expõe-se nela, isto é, todo o tipo de conhecimento se constrói e se fixa na língua...
A questão do conhecimento gramatical, quanto o teste se aproxima, torna-se dramática, embora não se saiba que uma gramática é um conjunto de regras, e, consequentemente, que as gramáticas são inúmeras! Tal como se ignora que a língua tem uma história, mais importante do que as próprias regras, porque frequentemente ignora ou despreza as regras, como forma de sobrevivência...
... e porque vivemos em crise, a chuva se tornou tema, ainda antes que o autorretrato de Bocage assentasse arraiais para nos dizer que, para além dos traços físicos e dos psícológicos, existe a ação que pode resultar do modo como o Eu interroga os grandes TEMAS:  a guerra (furor) e a paz (a ternura); a pureza e o pecado (a bebida); a distância (o platonismo e o angelismo) e a proximidade (a o erotismo); a religião -  era chegada a hora de confinar o clero ao templo!
Pelo caminho, fomos estando atentos aos modos de composição da caricatura física: o todo (magro, altura, figura) e as partes ( os olhos azuis, ao centro do carão moreno, esmagados pelo nariz...), sem esquecer que a magreza escondeu o ventre, deixando a descoberto a desmedida dos pés...
(O retrato como arte de insubordinação!) Afinal, não foi a insubordinação que o levou à cadeia!?
Quanto à chuva, fica por contar, ou melhor, fica a cargo de algum aluno intrometer-se no discurso e narrar o que aconteceu na sala de aula porque hoje, finalmente, choveu! Dentro e fora...
 
II - O tempo literário, às quintas, é opcional e visa recuperar o tempo perdido. Para o sermão da Sexagésima, só apareceu uma ouvinte que correspondeu, tendo ficado a perceber como se constrói um texto alegórico e simultaneamente se desanca nos pregadores que não saíam do paço (casa, nação) ou que saíam para rapidamente voltar ao aconchego da corte («porque sair para tornar melhor é não sair.» - Exiit seminare!         

17.10.12

Dia XIX

I - Quando a História e a ideologia são a seiva da intriga... «Foi para a Índia em 17 de Março de 1807.» Simão António Botelho partiu no início da Primavera de 1807, quando no Outono do mesmo ano, Napoleão ordenava a invasão do país e a corte se mudava (fugia) para o Brasil.
O primeiro capítulo de Amor de Perdição  faz nos recuar a 1779, para definitivamente nos traçar o retrato de uma época que se situa entre 1767 e 1807.
Cá dentro, D. Maria I governa entre 1777 e 1816. Lá fora,  a Revolução Francesa, entre 5 de Maio de 1789 e 9 de novembro de 1799. Os ecos da Revolução chegavam inevitavelmente a Portugal e, em particular, à academia de Coimbra.  E é em Coimbra que Camilo coloca, em 1801, os irmãos Botelho:
« Manuel (...) frequenta o segundo ano jurídico. Simão (...) estuda humanidades.»
Por esse tempo, Simão Botelho « defendia que Portugal devia regenerar-se num baptismo de sangue, para que a hidra dos tiranos não erguesse mais uma das mil cabeças sob a clávula do Hércules popular.»
Considerando a inserção na História, o leitor deverá procurar os sinais que ajudam à construção do retrato de um narrador conservador e reacionário. A 21/01/1793, Luís XVI foi executado pela guilhotina:
«Os apóstolos da revolução francesa não tinham podido fazer reboar o trovão dos seus clamores neste canto do mundo; mas os livros dos enciclopedistas, as fontes onde a geração bebera a peçonha que saiu do sangue de noventa e três, não eram de todo ignorados. As doutrinas da regeneração social pela guilhotina tinham alguns tímidos sectários em Portugal, e esses de ver é que deviam pertencer à geração nova


 

16.10.12

Dia XVIII

I -
a) Bocage deixou de fazer parte da cultura juvenil. A turma ignora o homem, a obra e, sobretudo, ignora a lenda. Apenas uma voz aventou a hipótese de se tratar de alguém um pouco «marginal». Este dado permite lançar-nos no universo dos botequins do século XVIII (cafés) como espaços de socialização. Corte / Salon vs botequim. Bocage, de fácil trato, anima as novas tertúlias, criando amigos e inimigos. (Ver história do café Nicola, no Rossio, Lisboa.)
b) Clarificação do léxico utilizado, designadamente de termos como conceito (definição) e noção. Nesta disciplina, mais do que os conceitos interessam-nos as noções.
c) Leitura do soneto "Magro, de olhos azuis, carão moreno" - ver Dia XVII.
 
II - No que à Literatura concerne, a passagem do primeiro para o segundo romantismo permite viajar entre Garrett e Camilo, reforçando a percepção das personagens principais, em que a idealização acaba derrotada pelo realismo. Beatriz vs Paula Vicente / Teresa vs Mariana. As segundas são de carne e osso e sofrem na pele os efeitos da condição de subalternidade...embora não se deixem submeter.
Em termos de PIL, foi estabelecido um itinerário de leitura que inclui Júlio Dinis e Carlos de Oliveira.
A biografia de Camilo é toda ela um belo argumento cinematográfico em que o herói romântico se transforma em trágico.

15.10.12

Gaspar vive no círculo virtuoso

Gaspar, doutrinado na Universidade Católica do cardeal Policarpo, vive no círculo virtuoso. Ainda não se vê a auréola, mas por este andar lá chegará. É um homem suficientemente paciente, que não se importa de repetir a receita, apenas com uma ligeira alteração de tom.
No círculo virtuoso de Gaspar só a credibilidade acrescida no seu Deus conta, mesmo que isso signifique a eliminação do contribuinte.
Não se entende, todavia, como é que o virtuoso Gaspar poderá sobreviver sem o contribuinte.
 

Dia XVII

I - a) A leitura e a aquisição de conhecimento. A obra organiza-se em torno de temas que, depois de identificados, devem ser arrumados em categorias que possam ajudar a responder a perguntas prévias ou despertadas pelo ato de ler.
     b) Noção de auto-referência aplicada ao texto biográfico e autobiográfico. O sujeito expõe-se, torna-se objeto textual. E esse ato pode ser revolucionário se questionar a ordem estabelecida ou apenas narcísico.
     c) Bocage no soneto " magro, de olhos azuis, carão moreno" rompe com o retrato do «antigo regime», hagiogáfico do rei, do nobre, do papa, do santo... para se colocar no olho do texto, reivindicando o privilégio de ser visto não como ídolo mas como cidadão disforme, contraditório, humano, capaz de criar, subvertendo os modelos e impondo uma diferente visão do mundo... Para atingir tal desiderato, Bocage não teme recorrer à ironia e à caricatura... e ao fazê-lo mistura magistralmente o registo lexical e sintático alatinado com o registo familiar e corrente, ocupando, deste modo, esse espaço novo que anunciava Herculano e Garrett...
 
II - Ato III de Um Auto de Gil Vicente. Agora no galeão de Santa Catarina, o que se passa entre pai e filha, entre rei e infanta / duquesa continua escondido, mas resolve o problema do rei. Ao contrário de Afonso IV (tragédia Castro, de António Ferreira), o rei D. Manuel I não necessita de mandar executar Bernardim: bastam-lhe a obediência da filha e a distância cavada pela viagem entre Lisboa e a Sabóia! O palco acaba ocupado não pelo dilema, mas pela controvérsia causada por Garcia de Resende que teima em desvalorizar o papel de D. Manuel se comparado com D. João II. Este planificou e aquele colheu os frutos que aplicou na construção de monumentos que acolhessem os seus restos e eternizassem a sua glória. O povo fica esquecido e mais pobre. Dele não se fala mais, embora não saia do pensamento do autor...   
(Em rodapé, ficou a bailar uma dúvida sobre o grau de absolutismo de D.João II.)