Visita de estudo com suporte na leitura de OS MAIAS de Eça de Queirós
Sintra
Toponímia: Cyntia (celta); Xentra
(árabe); Sintria ou Suntria (Idade Média); Chão de Oliva ; Mons Lunae
Sintra cristã. Desde 1147, data em que foi abandonada pelos mouros, na sequência da tomada de Lisboa por D. Afonso Henriques que, por sua vez, a entregou a Gualdim Pais, grão-mestre dos Templários que instalaram as primeiras Casas da Ordem, no lugar onde, hoje, se encontram o Café Paris e o Hotel Central.
SETEAIS
Quando, em 1147, D. Afonso
Henriques e os cruzados estrangeiros conquistaram Lisboa, Sintra rendeu-se sem
resistência.
Os
mouros da região fizeram um acordo com os cristãos: deixavam os seus bens e o
castelo nas mãos dos cristãos, se estes os deixassem viver nas redondezas,
dedicando-se à agricultura. E assim aconteceu.
Durante
a conquista do castelo, D. Mendo de Paiva, um cavaleiro cristão, encontrou-se
com uma linda moura, que fugia por uma pequena porta secreta com a sua velha
ama.
Ao
dar com os olhos no cristão, a moura suspirou por se sentir descoberta.
A velha ama logo a avisou que não suspirasse e pediu ao cavaleiro que as
deixasse em paz. Mas o cavaleiro respondeu que a bela moura seria sua
prisioneira. Nessa altura, ela deu o segundo «ai».
A
ama teve de contar a D. Mendo que havia uma
maldição sobre a bela moura: ela morreria no dia em que desse sete «ais».
O cavaleiro não acreditou e a moura continuou a suspirar.
Mandou-as
esperar ali um pouco e preparava a fuga quando apareceu um grupo de mouros que
ouvira a conversa. Os mouros, pensando-se atraiçoados, mataram a velha ama e a
bela moura deu o sétimo «ai» nesse momento, morrendo também.
Quando
D. Mendo voltou com uma escolta, viu que afinal era verdade e que a maldição se
tinha cumprido.
D. Mendo jurou vingança, matando todos os mouros que encontrava no seu caminho. E, em memória da moura assim tão dramaticamente desaparecida, chamou àquele recanto de Sintra «Seteais».
Chão de meninos
Aquele
sítio, localizado na antiquíssima freguesia de Santa Maria e S. Miguel, junto a
S. Pedro de Penaferrim, tem o seu curioso nome ligado a uma lenda que refere o
facto de as forças mouras terem solicitado ao nosso rei «Conquistador» asilo
para os seus inocentes filhos, que nada tinham com a guerra.
O
bravo e leal Afonso Henriques ordenou aos seus que arranjassem um lugar seguro
para refúgio desses inocentes.
Foi
assim que mãos lusitanas e cristãs trataram dos filhos do inimigo, dando-lhes
comida, agasalho e segurança.
Àquele local foi dado o nome de Chão de Meninos, que ainda hoje conserva aquela piedosa denominação.
Na fachada do Palácio da Pena, há um elemento
decorativo relacionado com lendas da região de Sintra.
É
um Tritão, um homem marinho, com o corpo coberto de escamas e uma cabeça
enorme. Tem a boca aberta, como se gritasse.
No séc. XVI, certos escritores, como Damião de Góis, ainda garantiam que nas praias junto da Serra de Sintra apareciam sereias e tritões.
PERCURSO PEDESTRE
Junto à antiga Câmara Municipal,
do início do séc. XX, em estilo neomanuelino, no local onde havia uma ermida
manuelina dedicada a São Sebastião…
Volta do Duche,
com particular atenção ao fontanário em estilo mourisco. Capricho
neoárabe de 1922, para aqui trazido em 1982. O nome desta estrada tem origem no
facto de ali ter existido, entre 1848 e 1908, um estabelecimento de banhos
públicos.
Atravessar o Parque da Liberdade (das
Merendas) até ao Palácio Valenças. (Biblioteca municipal)
No meio do
Parque – observação da natureza; breves noções de ROMANTISMO, REVIVALISMO,
ECLECTISMO, PITORESCO
Noções
A influência do Romantismo começou a
fazer-se sentir em meados do séc. XVIII com o culto do Pitoresco
nos jardins Ingleses e com o início do Revivalismo Gótico.
O Romantismo é o primado do
individualismo, da emoção pessoal sobre a ideia clara, e a busca da felicidade
na paixão. A expressão livre da sensibilidade, da religiosidade e da
melancolia. Preponderância da imaginação sobre a razão e a acção; fuga para o sonho,
para o misterioso, o exótico, o pitoresco ou o passado.
O sonho poético, a paixão fatal, a
contemplação da natureza e o génio incompreendido, são temáticas Românticas.
Revivalismo:
Arte que busca a sua inspiração nos estilos do passado. Expressões: o Neo-gótico, o Neo-manuelino, o Neo-barroco,
Neo-árabe, o Mudéjar
El arte mudéjar es un estilo para cristianos pero que incorpora influencias,
elementos o materiales de estilo hispano-musulmán, tratándose de un fenómeno
autóctono y exclusivamente hispánico.
Em Sintra, o Romantismo afirma-se com
a construção do Palácio da Pena, (ecléctico e neo-manuelino) por iniciativa do
rei-consorte D. Fernando, sob desenho do barão de Eschwege em 1839/49/85. Com o
Palácio de Monserrate por James Knowles em 1863/65 (neogótico e orientalista),
etc…
O Palácio Valenças (Biblioteca). À entrada nascente da Vila Velha, nas faldas
da serra, destaca-se o Palácio Valenças, obra do arquitecto Giuseppe Cinatti,
enquadrando-se no espírito romântico dominante nos finais do século passado.
O Paço
Real medievo tem origem provável num primitivo paço dos walis mouros (governadores do Al- Aldaluz). Traça actual proveniente de duas
etapas de obras: a primeira, no reinado de D. João I (séc. XV); a segunda, no
reinado de D. Manuel I (séc. XVI).
Observação do único Paço
Real medievo que subsiste em Portugal / leitura do trecho de Os Maias em que, pelo olhar de Cruges,
Eça apresenta o Paço Real:
«este maciço e silencioso palácio, sem
florões e sem torres, patriarcalmente assentado entre o casario da vila, com as
suas belas janelas manuelinas que lhe fazem um nobre semblante real, o vale aos
pés, frondoso e fresco, e no alto as duas chaminés colossais, disformes,
resumindo tudo, como se essa residência fosse toda ela uma cozinha talhada às
proporções de uma gula de rei que cada dia come todo um Reino…»
Largo em frente do Paço Real –
manuelino-mudéjar
Hotel
Nunes. Naquela época, o acesso era feito pela estreita rua de Meca. No
NUNES encontram o Eusebiozinho com duas raparigas espanholas: Lola, amiga de
Cruges; a senhorita Concha; Palma Cavalão – grande cena, a da Concha com o
Eusebiozinho!
«Virem
a Sintra, para questões e amuos, isso não! Naquelas pândegas queria-se
harmonia, chalaça e gozar. Coices, não. Então, ficava-se em Lisboa que era mais
barato.» (Palma Cavalão)
Carlos e Cruges saem do Nunes, e iniciam o passeio a Seteais às duas horas.
«Na praça, por defronte das lojas vazias e silenciosas, cães vadios dormiam ao
sol: através das grades da cadeia,
os presos pediam esmola…»
O Hotel Vítor: casino... Onde o João da Ega
se hospedava…
A Praça: A Torre do
Relógio, a Casa da Câmara e os já desaparecidos ou transformados
pelourinho e cadeia ergueram-se no Largo da
Igreja (S. Martinho).
A fonte da Pipa, onde a água brota
ironicamente de uma pequena pipa de vinho, que vem do séc. XIV.
(Rua
Fonte da Pipa, 11-13)
O Hotel Lawrence, em actividade desde cerca de 1780:
o lugar onde o “casal” Castro Gomes estava hospedado, acompanhado de Dâmaso
Salcede…
«os
seus olhos não se despegavam daquela fachada banal, onde só uma janela estava aberta com um par de
botinas de duraque secando ao ar.» (Carlos ainda pensou ouvir
um vago som de flauta)
Entretanto, Cruges admirava o vale.
- «Sintra não são pedras velhas, nem coisas góticas… Sintra é isto, uma
pouca de água, um bocado de musgo… Isto é um paraíso!» (Cruges)
Lord Byron (1788 – 1824) visita Sintra em 1811
«E logo
atrás, quase no pó que as rodas tinham erguido, apareceu, caminhando
pensativamente, de mãos atrás das costas, um homem alto todo de preto, com um
grande chapéu panamá sobre os olhos. Foi Cruges que reconheceu os longos
bigodes românticos…»: (Alencar viera
a Sintra para curar os seus ataques de
garganta! E alojara-se na velha Lawrence.)
Carlos e Cruges encontram o romântico poeta
Tomás de Alencar que irá fazer ao maestro
as honras de Seteais. Alencar recita
Quantos
luares eu lá vi?
Que
doces manhãs d’Abril?
E
os ais que soltei ali
Não
foram sete mas mil!
Cruges
sente-se desiludido, ao contemplar o palacete de Seteais. Porquê? (argumento
histórico-artístico)
«Mas aquilo que ele ali via era um desapontamento.» (Cruges)
«
E só se ouvia, às vezes, monótona e dormente,
a voz de um cuco nos castanheiros.»
« Toda aquela vivenda (…) parecia estar-se deixando morrer
voluntariamente naquela verde solidão – amuada com a vida, desde que dali
tinham desaparecido as últimas graças do tricorne e do espadim, e os
derradeiros vestidos de anquinhas tinham roçado essas relvas…»
O ARCO
Alencar detesta o Eusebiozinho das meretrizes, alheio
à «religião daqueles árvores e o amor
daquelas sombras…» E, sobretudo, odeia o Palma – um traste - «aquela
vil bolinha de matéria pútrida!... Aquele chouricinho de pus!»
Cruges (…) encostado ao parapeito, olhava a grande
planície de lavoura…
Entretanto, vai explorar o outro terraço ao lado. E
encontrou «um montão de penedos, polidos
pelo uso»… os penedos de Seteais. / o PENEDO DA SAUDADE.
E Alencar começa a declamar o poema 6 de Agosto:
Vieste! Cingi-te ao peito,
Em redor que noite escura!
Não tinha rendas o leito,
Não tinha lavores na barra…
Que era só a rocha dura…
Muito ao longe uma guitarra
Gemia vagos harpejos…
(Vê tu que não me esqueceu)…
E a rocha dura aqueceu
Ao calor dos nossos beijos!
E é quando o Alencar solicita a Cruges
que repare naquela tela sublime:
«No vão do arco,
como dentro de uma pesada moldura de pedra, brilhava, à luz rica da tarde, um
quadro maravilhoso, de uma composição quase fantástica, como a ilustração de
uma bela lenda de cavalaria e de amor. Era no primeiro plano o terreiro,
deserto e verdejando, todo salpicão de botões amarelos; ao fundo, o renque
cerrado de antigas árvores, com hera nos troncos, fazendo ao longo da grade uma
muralha de folhagem reluzente; e emergindo abruptamente dessa copada linha de
bosque assoalhado, subia no pleno resplendor do dia, destacando vigorosamente
num relevo nítido sobre o fundo do céu azul-claro, o cume airoso da serra, todo
cor de violeta-escura, coroado pelo Castelo da Pena, romântico e solitário no
alto, com o seu parque sombrio aos pés, a torre esbelta perdida no ar, e as
cúpulas brilhando ao sol como se fossem feitas de ouro…»
Cruges achou aquele quadro digno de Gustavo Doré
(1832-1883)
O bacalhau do Alencar: «a poesia e a cozinha são irmãs!» (ceia na Lawrence)
Regressam às nove horas da noite, com o Alencar, mas
sem as queijadas.
Palácio de Seteais.
Deve-se ao cônsul holandês, Daniel Gildemeester, rico negociante de diamantes
do Brasil, a construção do corpo do lado nascente, em 1787) e bem assim o
majestoso arco triunfal (1802), que evoca uma visita de D. João VI, ainda
príncipe regente, e de D Carlota Joaquina. Trata-se de um edifício
neo-clássico,
O jardim neo-clássico; os motivos românticos:
o Penedo da Saudade e a visão romântica da Serra coroada pelo Palácio
da Pena
Sob
o ARCO, cada aluno regista a observação que faz ao olhar para a Serra e para o
Palácio da Pena.
De regresso à Lawrence. O bacalhau à Alencar.
Ver Bulhão Pato. O
seu estatuto de derradeiro representante de um Romantismo sentimental
ultrapassado, a que as facetas de caçador e de gastrónomo (é seu o livro de
receitas O cozinheiro dos cozinheiros, de 1870) conferiam
contornos de certa forma castiços, teria, ao que parece, servido de inspiração
a Eça de Queirós na composição da figura do poeta Tomás de Alencar, em Os
Maias (1888).
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