11.5.13

O Rei da Helíria

O texto dramático "Leandro, Rei da Helíria", de Alice Vieira, escrito em 1991 para o Teatro Experimental de Cascais, surge, neste fim de semana, transformado num novo texto cénico, em que o rei cede o lugar à rainha Leandra por ação do Grupo de Teatro da Escola Secundária de Camões, dirigido por Maria Clara.
A transformação terá causas diversas, talvez sobrepostas: a) entre 1991-2013, as mulheres lutam pelo poder em condições de igualdade com os homens; a educação dos filhos (e dos alunos) continua, em grande parte, em mãos femininas; c) as mulheres, em contexto escolar, manifestam mais apetência pelas artes da representação; o impacto da atual realidade revela os mecanismos narcisistas, trazendo à luz a crueldade da condição humana, mesmo quando nos esforçamos por ignorá-los.
Ao contrário da maioria das histórias tradicionais, O Rei da Helíria não assegura a continuidade do seu reino, e irá "morrer" num palco que, apenas serve, para expor os seus erros como educador. De nada serve culpar a desumanidade das filhas. Elas são a expressão da cegueira paterna/materna. Só a assunção da cegueira permite ver o quanto iludidos vamos vivendo.  
 
No palco, todos se movimentaram a contento, uns com maior desenvoltura, outros de forma mais inibida. Para além da consagrada Graça Gomes ( uma atriz cada vez mais versátil!), há que seguir com atenção os novos atores (Daniela Lopes, João Silva, Rita Júlio, Teresa Schiappa, João Figueira, Clara Mendes, Marta Fernandes). A cenografia de Mário Rita cativa pelo seu simbolismo e pela modo como regula os espaços. Adereços, figurinos, som, luzes harmonizam e dão força às palavras...
 
(Se não me pronuncio sobre outros atores que participam na construção desta peça é porque só hoje assisti ao espetáculo. Resta-me dar os parabéns a todos, sem esquecer a presença e as corteses palavras de Alice Vieira.

10.5.13

Nesta fúria de convergência...

Pessoalmente, nada tenho contra a convergência desde que o rumo não seja o da mediocridade e / ou o do pé descalço!
 
No caso da convergência das reformas, a desonestidade quer tornar igual o que é desigual, por exemplo, nos descontos para a CGA e para a CNP /SS. Os funcionários do estado descontam o que lhes é imposto, à exceção de todos os que beneficiaram de privilégios resultantes de compadrio e caciquismo políticos.
Sobre os PRIVILÉGIOS cai uma cortina de fumo que asfixia tudo à sua volta. Os mais altos dignatários do estado recebem não o vencimento compatível com a função exercida, mas pensões de reforma, tornando-se indignos dignatários...
Por outro lado, é sabido que na CNP muitas pensões são baixas porque se optou por ocultar as verdadeiras remunerações: há, ainda hoje, uma lista enorme de benefícios e gratificações  que não são tidas em conta para estabelecer os descontos...
Basta olhar à volta e ver quantos não pagam transporte, quantos utilizam carros das empresas e do estado, quantos utilizam cartões de crédito de que não prestam contas!
Nesta fúria de convergência, quem é que identifica os titulares de pensões e de vencimentos que nunca trabalharam ou que não o chegaram a fazer durante mais de 10 anos?
Nesta fúria de convergência, quem é que identifica os falsos doentes que conseguiram reformar-se com pensões muito superiores às daqueles que trabalharam mais de 36, 40, 45 anos?
 
Sejamos sérios! É tempo de ajudar os políticos, da direita à esquerda, a rever os comportamentos! A realidade é bem mais complexa do que a que nos é espelhada diariamente pelo governo e seus apaniguados. Mas a realidade também é muito menos simples do que aquela que nos é prometida pela várias forças de oposição.
 
 
 

9.5.13

Na ausência do referente

Ainda comemos o pão, mas ignoramos o caminho: a semente, a planta, a espiga, o grão, o moleiro, a mó, a farinha, o farelo...
Vem isto a propósito do dia da espiga e respetivo simbolismo. No cesto, não vi a espiga nem a videira, apesar do malmequer, da papoila, da oliveira e do alecrim... Na realidade, faltava o essencial: o pão e o vinho, mas o cesto e o ramo estavam à venda.
 
Não obstante, o que mais me preocupa é a ignorância do caminho, é perceber que o ensino vai matando a referência, esmiolando o pão, incapaz de alargar a alma e de ir além do Bojador, pois não compreende que dobrar não é vergar, mas contornar, de modo a que o cabo submarino não nos faça encalhar...
 
Mais do que o significado, interessa conhecer o referente ( a realidade) e não a referência ou o referencial, tudo significantes utilizados por quem há muito fugiu aos trilhos e vive em circuito fechado, longe dos homens, dos campos e dos rios...

 

 

8.5.13

Encenações

I - Nos últimos dias, Passos e Portas experimentaram um tipo de encenação que visa iludir o cidadão português e o credor estrangeiro. O efeito é duplo: desorientação do povo e desconfiança do credor. A política torna-se, assim, num espaço de intrujice.
 
II - Depois do revés da última 2ª feira, Jorge Jesus antecipa, no tapete vermelho que lhe é servido pelos «media», uma vitória no terreno do adversário, evitando a todo custo proferir a dolorosa elocução: - «Pai! Afasta de mim esse cálice!»
 
III - Hoje, o Clube Ler para Viver e o Museu da Escola Secundária de Camões apresentaram na Biblioteca Central uma encenação feliz. A Biologia, a Literatura, a Música e a Expressão Visual aliaram-se e criaram um espaço dinâmico, onde os jovens leitores representaram 4 personagens femininas à procura de uma identidade que, no entanto, soçobra num universo predominantemente masculino.
Nas palavras encenadas sentiu-se, bastas vezes, a vingança das heroínas oitocentistas, a alegria dos jovens intérpretes e a angústia da encenadora.
 
(Os clássicos do Camões já estão alinhados para subir ao palco! Hoje, por detrás das grades das altas estantes, enxerguei os faunos de Aquilino...)
 
 

7.5.13

A gaivota e a sereia

Era uma vez um menino que nunca saíra da Aldeia do Bispo, a sete quilómetros de Penamacor. Conhecedor deste triste isolamento, o ministro Crato não descansou enquanto não acabou com a discriminação que condenava a pobre criança à boçalidade da parvónia.
Às oito horas em ponto, um autocarro recolheu o menino ensonado, levando-o à sede do agrupamento escolar "Ribeiro Sanches" - distinto enciclopedista do século XVIII...
E qual Ribeiro Sanches, em 90 palavras, o menino dissertou sobre as proezas de uma gaivota que, do rio Pônsul,  raptou uma sereia, levando-a em visita ao Palácio das Laranjeiras do ministro Crato.
 
A esta hora, o menino da Aldeia do Bispo, atormentado, não consegue adormecer: nunca ninguém lhe falara da sereia do rio Pônsul e sobretudo, de gaivotas. E ele bem queria estar à altura do desafio! Ainda se a sereia tivesse sido raptada por uma pega rabuda!
 
 

6.5.13

Um dia sombrio

Acordei ainda o sol não despontara, e logo me veio à cabeça que o dia iria ser longo e sombrio.
Paulo Portas assombrara-me o sono, pois na véspera dera a entender que combinara com Passos Coelho uma estratégia para aterrorizar a população, surgindo, depois, como o redentor da franja grisalha... Esta parelha, sem vergonha, brinca com o povo como o D. João V saramaguiano se divertia a armar semanalmente a miniatura da basílica de S. Pedro.
 
Funcionário público zeloso lá apanhei o 783 para o Saldanha e, de imediato, percebi que a luz solar brincava comigo ao desconsiderar a minha degenerescência macular da idade (DMI): as letras e os rostos insistiam em surgir distorcidos, e os neurónios, cansados de tantas desconexões, arrastavam-me para um refúgio que deveria situar-se longe da luz e do ruído...
 
Mas o que me esperava era bem diferente! Corrigir e classificar dezenas de testes e, sobretudo, viajar até ao Bairro azul para cumprir a missão de avaliador externo.
 
Claro que a parelha desenvergonhada me perseguiu todo o dia, o silêncio deu lugar a gritos frenéticos; só o sol acabou por me fazer o favor de, aos poucos, se esconder, talvez, envergonhado do que ia iluminando cá em baixo.

5.5.13

O retorno à miséria

Fica a sugestão de saída, mas a realidade é bem distinta. Ao invés de antanho, escasseiam os meios. Nenhuma Ordem de Cristo dispõe da verba necessária para que este povo se mude para novo continente, nova ilha afortunada.
Na água boiam os anseios de um povo prestes a submergir às mãos de corsários e de piratas. Os anseios de um povo esmagado pela propaganda de um diretório prestamista sem rosto.
(Ontem, a propósito do significado do exame da 4ª classe referi que a aprovação significava a abertura do caminho que permitia a mobilidade social; hoje, acrescento que um diploma de estudos superiores abre o caminho de retorno à miséria… tudo isto, num tempo, em que o ministro da educação não passa de um ajudante do ministro das finanças ao serviço do diretório prestamista sem rosto.)
/MCG