«Quilumbo, 26 de Outubro de 1966.
José, o criado preto, falava fluentemente alemão, e isso deixou-nos admirados. A coisa explicava-se porque desde criança - era órfão, suponho - ele foi criado nesta casa e numa convivência íntima com o patrão.
Viveram juntos o momento da revolta (1961). Durante a fase mais crítica, as mulheres e crianças foram enviadas para o litoral, os homens ficaram na fazenda. Os criados da casa, que estavam ao lado dos patrões, foram sujeitos a chantagens. O plano previa três fases e o assassinato de todos os brancos. Mas fracassou logo na primeira, que só por si já fez correr sangue a mais. Os detalhes, pensados do outro lado do Congo, eram demasiado sofisticados para os indígenas.
Como quem não quer a coisa, o Senhor Smidt perguntou ao José: 'E quem é que vos ia pagar se nós não estivessemos cá?' E ele caiu na armadilha: 'Foi isso mesmo que eu sempre lhes disse.'
(...) A propósito da pergunta de Smidt van Dunge: se um negro que foi fiel durante trinta anos de repente se torna inimigo, a explicação só pode estar na natureza da dominação. Ele será fiel enquanto for dominado. E começa a pensar na sua própria pele quando o senhor deixar de se sentir seguro no seu lugar. A moral cede à física; não é louvável, mas é humano, (...). (Tradução de João Barrento de excertos de Siebzig verweht I, 1980.)
A natureza da dominação continua a ser uma questão essencial no despoletar dos conflitos. No entanto, a informação tende a tratar tudo de forma uniforme e unilateral. Parece que a barca se inclina sempre para o lado do dinheiro...