4.5.13

Do rigor do exame do 4º ano...

Em 1965, fui à sede do concelho prestar provas do exame da 4ª classe. Provas escritas e orais. Ato solene perante júri desconhecido. Nunca soube o custo, mas lembro que o meu pai fora obrigado a emigrar e que a minha deslocação implicou pagar a carreira, sapatos novos, roupa nova... As provas tinham um peso de 100% e distinguiam o sucesso do insucesso escolar. Reprovar era uma vergonha para o candidato, para a família e para a comunidade.
Ser aprovado era o 1º passo da mobilidade social para muitos portugueses dessa época.
 
Dentro de dias, regressa o exame do 4º ano. Ato administrativo perante funcionários anónimos. De acordo com um secretário de estado da educação, o custo do exame nacional acrescenta 600.000 € ao custo das desprezíveis provas de aferição, não esclarecendo qual era o custo destas últimas. Para ele trata-se de uma insignificância. Acontece, no entanto, que muitos dos pais e dos irmãos dos jovens examinandos estão desempregados ou já partiram à procura de trabalho fora desta bendita terra.
Agora, o peso do exame é de 25% e, caso, o aluno não fique, de imediato, aprovado, os desprezíveis professores vão ser obrigados a recuperá-lo para novo exame, cujo o custo o senhor secretário de estado ignora. Reprovar será uma exceção e nada dirá sobre a qualidade das aprendizagens... e quanto à mobilidade social, o que pensar de um regime que promove a mediocridade na educação, desprezando os agentes que a deveriam promover?
O anunciado rigor dos estadistas do passado e do presente em pouco diverge: no passado, abria as portas do escol que haveria de guiar a nação nos seus messiânicos objetivos; no presente, nivela por baixo, abrindo as portas à escumalha que, inevitavelmente, conduzirá ao fim da nação.  

3.5.13

O Tejo assoreado




Desta vez, fiz o percurso a pé. Quis comprovar se, depois das cheias, o Tejo continuava transbordante. Afinal, está assoreado! Tal como no último Verão!

Triste indicador! A ponte cumpre a sua função, ao contrário da ministra Cristas que, ainda, não percebeu que o desperdício de água se paga caro… e, em maio, o Tejo vai morrendo aos poucos..

/MCG

2.5.13

Para me contrariar

Ciente de que a burrice me consome o tempo que me resta, insisto, todavia, em explicar que não há conteúdo sem continente, que não há compreensão sem expressão, que a imaginação verbal pode ajudar a diminuir a cerração...
De momento esta explicação, devidamente exemplificada - a bolsa, o baú, o copo, a ânfora, a mochila, o contentor, a jarra, a mala, o táxi, o avião,  o país, a urna,  a europa, a ásia... - interessa a muito pouca gente.
Talvez porque, para me contrariar, uma boa parte da humanidade também insista em explicar-me que não tem conteúdo, e assim, vai ocupando o tempo que lhe sobra a bater com a cabeça na parede em frente até que o coma advenha ou, em alternativa, a pisar a cabeça de todos os que se vão pondo a jeito. 

1.5.13

No 1º de Maio

(A cabeça já circunda os Restauradores enquanto que a cauda se arrasta 500 metros atrás; o tronco, esse, serpenteia ao longo da Avenida; os "língua" apelam à revolta no eco das lagartas das chaimites... É ainda a ideia de que o futuro pode ser mobilizado pelo passado!)
 
Eu não estou lá mas é como se estivesse! Bastou-me estar lá na alvorada para perceber que a repetição me incomoda, me atrasa e me surripia a matéria de que sou feito. Eles ainda têm alma! Eu nunca a tive, pelo menos, nunca tive uma alma encenada que, em certos dias, salta dos bastidores e ocupa o proscénio...
 
Por isso, hoje, trabalho todo o dia em múltiplas tarefas, ciente de que me estou a atrasar e de que a matéria de que sou feito se está a esgotar! Ciente de que todo este trabalho em nada diminui a dívida! Ciente de que tudo isto (e aquilo) é triste e reconhecendo, finalmente, que escrever só pode ser triste.
 
Por isso vou agora sair para apenas caminhar durante uma hora, não na Avenida, mas nas ruelas desta freguesia (e talvez da vizinha). Vou sozinho..., mas regresso (espero!) menos só!

30.4.13

A sociedade de informação

A sociedade de informação, que se revela incapaz de investigar a extensão e a constituição da dívida pública, como se esta fosse segredo de estado, não tem qualquer pejo em desvirtuar «os limites externos à liberdade de informação».
No dia a dia, em nome da democracia, a sociedade de informação despreza a vida privada e familiar, os dados pessoais informatizados, a confidencialidade da situação tributária dos contribuintes, o segredo de justiça. E fá-lo com a conivência ou, mesmo, instigada pelo Estado.
Na verdade, a comunicação social sente-se autorizada a, por todos os meios, inquirir o cidadão, expondo-o na praça pública, linchando-o sem apelo nem agravo.
Por outro lado, esta prática alastrou ao mundo empresarial. Qualquer empresa dispõe, hoje, de uma base de dados e de um call center prontos a manipular o cidadão-consumidor.
E curiosamente, a sociedade de informação, apesar dos seus múltiplos tentáculos, não avança um passo no sentido de esclarecer o contribuinte sobre a dívida pública. Sobre a sua história, sobre a história dos empréstimos pedidos pelo estado português e pela banca portuguesa ao longo do século XX e nestes últimos trezes anos.
Valeria a pena saber se, na verdade, o empréstimo a 99 anos para amortizar a dívida acumulada em 1902, na sequência da bancarrota de  1892-93, foi saldado em 2001. Ou se antes, quando e como?
Por enquanto parece ser mais simples reduzir tudo a uma mesquinha luta político-partidária... e mais tarde não me venham dizer que eu não avisei! (A.C.S. - o homem que melhor conhece os segredos do estado português, depois do inamovível Dr. Oliveira Salazar!)
 
 

29.4.13

O Gebo e a Sombra (revisitado)

«Primeiro a nossa casa hipotecada e vendida naquele ano em que estive desempregado, 1893 - data negra. Depois a desgraça do filho...» Raul Brandão, O Gebo e a Sombra, Primeiro Ato.
 
A minha interpretação de 27.04.2010 ignorou uma data que, hoje, considero fulcral: 1893. (Esta data é negra porque corresponde à bancarrota parcial de 1892-93. Neste último ano, a dívida pública atingiu 124,3% do PIB. E só em 1902, foi possível renegociar e contrair novo empréstimo amortizável a 99 anos - 1902-2001.)
 
Deste modo, a situação de miséria vivida pela maioria da população acentuou-se enquanto uma minoria, onzeneira, enriquecia a cada dia que passava - enriquecia com a miséria dos outros. Esta circunstância é, assim, fundamental para compreender "o teatro de ideias" de Raul Brandão.
De um lado, vemos o Gebo, honrado e cumpridor do dever, mas pobre e desprezado; do outro lado, o filho, o João ladrão, mas revoltado, para quem é preferível «antes morrer do que viver sepultado». A viver na rua (ou na prisão) durante 8 anos (1893-1901), João vai descobrindo que « há criminosos que têm alma e homens honrados que a não têm.» E acaba por ser ele que enuncia uma ideia, mais do que nunca, adequada aos anos que vivemos: UNS SÃO UNS TRAPOS, OUTROS REVOLTAM-SE.
No essencial, a família representa os "trapos" e João, "o revoltado". Mais do que um delinquente, João desestabiliza as consciências, a começar pela do pai, que resolve, depois de roubado e desonrado pelo filho, aliar-se-lhe, respondendo à pergunta de Sofia: «Neste mundo atroz, neste mundo onde não há a esperar piedade nem justiça, só os desgraçados é que têm de cumprir o seu dever?»
Em conclusão, nesta peça, o autor aplica o seu conceito de teatro: este «deveria debater um grande problema social ou psicológico, e interessar o público com "peças sintéticas" que fossem "populares e humanas".»
 
PS. Qualquer semelhança com a atualidade...!
 

28.4.13

Escrever sobre...

Podia tentar escrever sobre o congresso do PS, mas não entendo nada do que lá se passa! Parece que o José Seguro se imagina o novo homem providencial, capaz de solucionar o que o próprio partido construiu e destruiu, sem nunca  assumir a responsabilidade da falência em que o país se encontra. O PS continua a viver no oásis!
Podia escrever sobre um Governo que passa os dias em conselho extraordinário, mas não entendo o que lá se passa! Parece que o Portas insiste em contrariar o Gaspar, incapaz de impor aos restantes ministros um programa que combata o despesismo do Estado...
Podia escrever sobre os portugueses que, supostamente, viveram acima das suas possibilidades, mas, a cada dia que passa, todos os indicadores apontam para erros graves de um conjunto de decisores que, na maioria, continuam em lugares de relevo, em vez de estarem presos.
Chegado aqui, não apetece escrever, pois os únicos que acabarão por cair são todos aqueles que insistiram (e insistem) em eleger quem os não representa e se aproveita para delapidar o país e, simultaneamente, encher os bolsos...
 
Em alternativa, posso escrever sobre o vento frio de abril, sobre as flores de abril, sobre as colmeias de abril, sobre os formigueiros de abril, sobre os velhos de abril, sobre os jovens de abril... sobre a miséria de abril!