2 máquinas, uma de roupa e outra de louça, esperam pacientemente que eu as desperte; uma cafeteira vazia anseia que eu lhe devolva a glória, pois, entre os aromas do fundo da tarde, pressente o café que dilata as artérias e reabre as avenidas da vida, mesmo se caótica. Tiro os óculos e deixo de ver a nitidez do ecrã, volto a colocá-los e passam imagens de actores foxlife de que desconheço as personagens; ao lado, a gata olha voluptuosamente o aquário, a espaços concentra-se no écrã, como se as personagens lhe fossem familiares; por detrás das teclas, sopra, apressada, a 3ª página de uma acta que prometi, revista, para hoje ou, talvez, para amanhã...
E sei, também, que amanhã irei regressar ao J.H.Saraiva, no Forte de S. Julião da Barra, a exaltar o patriotismo do general Gomes Freire de Andrade, cuja personagem não consigo descortinar no palco do L.Sttau Monteiro... e do olhar de J.H.Saraiva retiro a lacuna, que o impede de evidenciar a fortuna literária do grão-mestre que deu corpo ao "fantasma" de Felizmente Há Luar! Como se a referência cegasse e pudesse esconder um documentário sobre outro general-sem-medo!
Este último pensamento não o devo dar a conhecer aos meus jovens alunos, pois, também, eu estou no palco para lhes servir doces iguarias e, não, banquetes indigestos.
E hoje foi um dia de doces iguarias: "Uma imagem que vale mais que uma imagem". Um Auditório, cheio de telemóveis que, por entre vozes e imagens, trocavam sms..., desperta intermitentemente para a força e para o excesso da mensagem icónica, surpreso e logo cansado... Na retina, talvez tenha ficado um pé do mosto duriense ou o oportunismo da benettom que, conhecedora dos baixos instintos, vai vendendo a sua mercância sob o favor da nova ética que revela e esconde o que bem lhe convem. Entretanto, quem nada quer esconder e tudo anseia revelar (A. R.L / B.T. /M.F.) apresentou, na Biblioteca, IN-PANDORA, e, de forma sóbria, deu uma lição da arte de bem aprender e melhor ensinar a descoberta da sexualidade, da concepção, da evolução do embrião...
E um dia assim não podia terminar sem que mais uma vez o Dr. Valente Rosa falasse do modo como Vergílio Ferreira defende, na sua obra literária e ensaística, o primado da existência. Da palestra ficou-me, no entanto, alguma preocupação: o medo da tecnologia capaz de nos desviar do fundamental; a preocupação obsessiva com o olhar alheio e a necessidade de o corrigir ou, mesmo, de o destruir; a arte como atributo do superhomem - omissão (in)justificada -; deus como interlocutor desprezível; a sobranceria da 3ª via (ali mesmo, entre o Estado Novo e o PC); a colagem do neo-realismo ao PC. Apesar deste meu sobressalto, não posso deixar de me congratular com o trabalho das Professoras Madalena Contente, Isabel Martinez e Teresa Almeida que, se bem compreendi, estão dispostas em IR ATÉ AO FIM.