7.6.11

A materialidade…


Manuel Baldemor, 1947, Paete Laguna, Filipinas, cinzela o papel com o sentido de quem quer revelar lugares perdidos na voragem de sociedades que preferem a especulação financeira e a ociosidade ao trabalho.
A solução passa cada vez mais pela redescoberta da matéria, em todas as suas extensões, isto é, pela valorização do homo faber.
De nada serve o comentário daqueles cuja palavra perdeu a referência.
A litotes, talvez!

6.6.11

É difícil mudar!

Hoje estive, entre as 11h15 e as 12h45, no Hospital de Santa Marta, em Lisboa, para ser submetido a um exame médico, cujo resultado será enviado ao meu médico assistente num prazo de três semanas.

Entretanto, enquanto por lá permaneci, tive tempo de perceber que tarefas que exigem extrema atenção são executadas no meio de conversas gratuitas e pautadas por continuadas sms, ou interrompidas para atender conhecidos e amigos que beneficiam de celeridade insuspeita e de tratamento privilegiado…

Nem vale a pena lastimar o tempo que passei já preparado à espera que o radiologista aparecesse, quando, ainda na sala de espera, vi doentes da medicina interna abandonados à porta dos gabinetes até que  surgia um auxiliar a perguntar-lhes se já tinham feito os exames… De comum, nenhum daqueles doentes se encontrava em condições de dizer o nome ou de confirmar se sim se não…

Concluído o exame, ninguém me disse onde deveria dirigir-me para fazer o pagamento, como se essa diligência nem existisse… Lá descobri a tesouraria, apesar de não haver nenhuma placa a assinalar o local. 

Fiquei, deste modo, esclarecido sobre as dívidas dos utentes, sobre a baixa produtividade nas unidades de saúde, sobre o desleixo em certos actos médicos, sobre o modo como os doentes mais indefesos são tratados, e sobre o modo como o amiguismo e o corporativismo beneficiam de privilégios que não deveriam existir num estado de direito…

5.6.11

A decisão…

A última intervenção televisiva de José Sócrates, pela imodéstia testemunhada, parece querer confirmar que a decisão dos portugueses foi acertada.

(Esperemos, no entanto, que não seja necessário pegar em armas para colocar sensatez na cabeça dos governantes.)

Os próximos três meses serão fundamentais para atalhar a caminhada para o abismo.

Vamos lá ver se, a partir de amanhã, a nova ordem sabe cortar em tudo o que é desperdício e imoralidade, como, por exemplo, o actual modelo de avaliação de professores ou a parque escolar.

3.6.11

A alternativa?



Agora que a campanha eleitoral está a chegar ao fim, procuro uma alternativa e só antevejo soluções defuntas! Não sei se os candidatos a deputados deram a devida atenção às velhas tecnologias, mas o país rural e urbano expõe-as, de norte a sul.

De qualquer modo falar de candidatos a deputados é um excesso de linguagem, pois, apesar das novas tecnologias, parece que eles enfiaram o gorro do «físico prodigioso» e terão partido para uma qualquer longínqua praia paradisíaca. Ninguém lhes conseguiu pôr em vista em cima! Esperemos que o devasso satã não os tenha sodomizado!

Quanto à alternativa, bem sabemos que não podemos voltar atrás, nem virar à esquerda ou à direita, ou mesmo sonhar o futuro, pois se o fizermos perderemos o presente, tombando definitivamente no abismo…

Esta lição, no entanto, só serve a quem pense que o Sol nasce todos os dias. Infelizmente, continua haver quem ainda não tenha entendido que o Sol é um fingidor!

2.6.11

Tristes e hilários!

Todos os dias o Sol finge que nasce e, ao despertar, para nos enganar, fá-lo sempre de modo diferente. E nós, sempre do mesmo modo, fingimos que a pequenez não nos afecta, que a prosápia não nos coage, que a astúcia não nos inibe…

Resignados, ouvimos convicções inatacáveis, ideias secretas…

sorrimos

dos aplausos bajuladores, das histerias beatas…

e dos que têm ideias só para os outros concretizarem…

e dos que propõem interpretações fantasiosas…

e dos justiceiros prontos a empunhar a espada!

(Fingimos e a alma morre! A sorte é que o Sol não finge o seu curso…)

31.5.11

Da tristeza…

Tal como Psamenita, rei do Egito, olho, não para Cambise, rei da Pérsia, porque essa “estória” há muito saiu da memória, mas para as lágrimas silenciadas das vítimas da maré de soberba e de pesporrência que não cessa de crescer, e interrogo-me se os olhos secos não são, afinal, a expressão de uma tristeza anoitecida…

Porque, na realidade,  ainda há por aí muita tristeza luminosa – olhos  que sorriem de pudor; suspiros desesperadamente castos, vozes cadentes e assassinas, mãos fugidias e rapaces, azuis e castanhos inefáveis…

E eu começo a acreditar que o humor negro só existe  nos olhos secos daqueles que, à contenda e à intriga, preferem o silêncio do caminho e a solidariedade das vítimas…

A esta hora, os candeeiros tingem de amarelo os ramos exóticos que sobre mim balançam, e os pássaros contam a estória dos reis da Pérsia e do Egito. Por mim, tudo bem! Vou ficar a ouvi-los porque eles merecem… 

27.5.11

A máquina do mundo!

O Grupo de Teatro da Escola Secundária de Camões continua a surpreender. A 3º produção da companhia oferece-nos uma bela adaptação (a 14ª? ) da obra dramática Além as estrelas são a nossa casa, de Abel Neves, (ed. Edições Cotovia, Lisboa, 2000). Em palco, registei a presença de 22 intervenientes na construção do espectáculo… Admiro-lhes a memória, por vezes a dicção, e, sobretudo, a versatilidade de alguns destes novíssimos actores, sejam eles alunos ou professores. Ali, no palco, a diferença esbate-se por inteiro, a não ser quando programa de superação de estereótipos. Por isso lhes ofereço uma borboleta de Pitões das Júnias, símbolo das metamorfoses que têm gerado novas estrelas na nossa casa, nestes dois últimos anos.

Nota: Abel Neves, Montalegre, 1956. O adolescente Abel Neves que começou a escrever aos 14 anos foi estudar para o Liceu Camões. Desde sempre apaixonado pelos livros, tinha lido A Aparição, de Vergílio Ferreira e comprara nesse ano o romance Nítido Nulo. O autor era então professor no liceu, mas Abel não era seu aluno. Um dia, munido de toda a coragem que conseguiu reunir e com o livro na mão, entrou na sala de aulas onde estava o escritor.
Queria pedir-lhe um autógrafo. "Nunca mais me esqueci do que me disse, olhando alternadamente para mim e para o livro: Quem é que te mandou cá, rapaz?". "Ninguém". Gostava muito do autor e só queria uma dedicatória. Fiquei algo desiludido quando este apenas assinou o seu nome.
http://aeiou.visao.pt/abel-neves-o-dramaturgo-poeta=f557043